
Essa foto de Cristina Kirchner na sacada do apartamento do bairro de Constitución está na capa do jornal Página 12. Mas é de arquivo, não é uma imagem feita depois da decisão da Justiça, na terça, de que ela pode cumprir uma pena de seis anos de prisão em casa.
A sacada, no segundo andar, é parte do imbróglio sobre a prisão domiciliar. Os advogados de Cristina não sabem direito o que ela pode ou não pode fazer, além de usar tornozeleira e só sair para ir ao médico.
Está claro, por exemplo, que a ex-presidente não pode receber ninguém sem pedir licença à Justiça, sempre apresentando lista prévia de nomes dos visitantes.
Mas a sacada, onde ela costuma aparecer para acenar para as pessoas na rua, é um dos pontos não esclarecidos. Cristina pode aparecer ali? Lula, que irá visitá-la em julho, poderá acenar da sacada para o povo, ao lado dela?

Os juízes temem que o lugar se transforme num ponto de aglomeração, o que já começa a acontecer, antes mesmo da grande manifestação de ontem nas ruas de Buenos Aires.
Cristina foi condenada por três juízes juramentadamente ligados à direita e à extrema direita. Um juiz e um promotor do caso foram denunciados, com provas de fotos, por jogarem futebol com o ex-presidente Mauricio Macri e parceiros do macrismo.
Cristina foi condenada porque teria favorecido Lázaro Báez, um empreiteiro de obras superfaturadas, durante seu governo, entre 2007 e 2015. Os jornais Página 12 e El Destape publicaram reportagens mostrando que não encontraram provas contra ela.
Assim como não acharam provas contra Lula no caso do tríplex.Mas Lula foi condenado e cumpriu 580 dias de prisão. Era o líder das pesquisas às vésperas da eleição de outubro 2018. Foi preso em abril.
Cristina era pré-candidata a deputada provincial por Buenos Aires nas eleições de 7 de setembro. O lavajatismo verde-amarelo foi copiado pelos juízes argentinos, e ainda há mais 11 processos contra Cristina. É um pacote, como fizeram com Lula.
No Brasil, Lula teve o conforto da vigília ao lado da cela da Polícia Federal em Curitiba. Na Argentina, tudo na política é superlativo e algo maior pode acontecer, como já aconteceu na caminhada de quarta-feira, com mais de 300 mil participantes.
Cristina tem 72 anos. Pretendia se eleger deputada para obter lastro político, com o peso do voto, para resistir ao sistema de Justiça tomado pelo macrismo e, agora, por gente que se conecta a Javier Milei.
O jornal La Nación cumpriu sua missão como porta-voz dessas facções e comorou a prisão de Cristina. Agora, publica na capa da edição dessa quinta-feira a seguinte manchete:
“Relação complicada. A visita de Lula a Cristina cria tensão e coloca o governo em alerta”.
O deputado Paulo Pimenta, que esteve ontem em Buenos Aires e acompanhou a caminhada até a Praça de Maio, já anunciou: Lula estará em Buenos Aires, dias 2 e 3 julho, para a reunião da cúpula do Mercosul, e irá visitar Cristina.
É um problema para o neofascista e fabricante de criptomoedas Javier Milei, para o Ministério Público, para a Suprema Corte macrista e para a extrema direita argentina.
(O título deste texto é apenas uma ideia, a mais básica, a mais elementar, a partir da possibilidade de Lula aparecer na sacada com Cristina. Mas é quase certo que o Judiciário não irá deixar e que o próprio Lula deve estar pensando desde já se deve ser tão atrevido. A dúvida sobre o acesso à sacada será esclarecida logo. Se Cristina não pode aparecer, Lula poderia?)