A sangue frio: atentado, eleições e TV. Por Gilberto Maringoni

Atualizado em 7 de setembro de 2018 às 8:57
Atentando deu a Bolsonaro o que ele não tinha: tempo de TV

Jair Bolsonaro foi o assunto único no primeiro bloco do Jornal Nacional desta quinta (6), com quase 15 minutos de duração. A exposição adentrou parte do segundo, com várias chamadas ao vivo no decorrer do noticiário que, excepcionalmente se prolongou por uma hora e oito minutos. O atentado ao presidenciável é fato jornalístico de repercussões mundiais. Pelo que se informa, ele está fora de perigo.

Era inevitável que o principal informativo da TV brasileira desse ao candidato tudo o que ele não tem: tempo de exposição. Mas Bolsonaro pode ter ganho algo muito mais importante, um lugar oposto ao que vinha ocupando no palco da disputa. E isso é decisivo.

Se havia sinais de exaustão na persona pública encarnada pelo ex-militar, a facada em Juiz de Fora pode ter alterado a fase final de campanha. Pode sair de cena o agressor incondicional e maior incentivador de uma campanha pautada por xingamentos, calúnias, exaltação da ditadura e da eliminação física de adversários. E entra o agredido por esse mesmo ambiente.

Vamos combinar, é uma metamorfose surpreendente pela radicalidade e celeridade da pirueta.

O capitão reformado pode aparecer – ironicamente – em lugar semelhante ao de Lula, o de vítima. Não faltou a grave locução de William Bonner a ressaltar que o atentado foi contra o “líder na corrida presidencial”. Constrói-se um anti-Lula com sinal trocado, que pode ampliar sua escala de intenções de votos aparentemente limitada a um teto ao redor de 20% do eleitorado.

Até a criançada sabe que esse não é o primeiro ato de violência na mais atípica campanha eleitoral em décadas. A jornada teve início com o assassinato de Marielle Franco, os tiros nos ônibus da caravana do verdadeiro líder nas sondagens, seguida por sua prisão e um conluio entre judiciário e mídia, que busca normalizar a anormalidade de vivermos sob um golpe.

Embora o atentado seja repulsivo, Bolsonaro agora tem sua campanha bombada a quatro semanas da votação. O posto no segundo turno está consolidado. O que o JN parece indicar é que ele se fortalece diante do indicativo de derrota em todos os cenários da última volta, exibida na pesquisa Ibope.

Ou seja, há uma tática em progresso, na qual a Globo parece ter assento: fazer com que todo o campo conservador conflua para o candidato da extrema-direita. Meirelles já se desidratou. A bola da vez, com possíveis defecções nas chapas regionais, é o tucano Geraldo Alckmin.

A esquerda tem – corretamente – condenado com veemência o atentado. Daqui até 3 de outubro é quase impossível que Boulos, Ciro ou Haddad abram mão de suas candidaturas em favor de uma chapa única. Mas a realização de pelo menos um evento conjunto seria de bom tom, para se mostrar à sociedade a existência de lados nessa batalha.

A partir daqui, a campanha eleitoral entra em um tempo político acelerado e muito mais tenso, em meio a uma crise econômica que não dá sinais de refluir.

P.S. O neandertahl que atende pelo prosaico nome de “General Mourão”, vice de Bolsonaro já urrou: “Agora é Guerra”. Será que a mudança de papéis ainda não está acertada?