A soberania brasileira à prova: como reagir à escalada de sanções dos EUA. Por Jean Paul Prates

Chairman do CERNE — Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia. Ex-Senador da República e ex-Presidente da Petrobras

Atualizado em 26 de julho de 2025 às 16:08
Lula e Geraldo Alckmin segurando a bandeira do Brasil. Foto: reprodução

Por Jean Paul Prates

Com a sinalização de que os Estados Unidos pretendem impor um conjunto de sanções unilaterais contra autoridades brasileiras — desde restrições financeiras até a expulsão de nossa embaixadora em Washington — o Brasil precisa responder com serenidade, assertividade e clareza estratégica.

Se confirmadas, essas ações representarão não apenas um ponto baixo na relação bilateral, mas uma violação frontal aos princípios de respeito mútuo e não intervenção que regem o direito internacional.

Nenhuma potência tem legitimidade para tentar impor desfechos políticos ou institucionais a um país soberano por meio de sanções ou coerção diplomática.

A reação brasileira deve ser executada de forma firme, mas responsável, gradual e proporcional:

📍 Reações do Brasil — Curto Prazo (dias a semanas)

  1. Resposta diplomática imediata:
  2. Convocar o embaixador brasileiro em Washington para consultas.
  3. Emitir nota oficial de protesto contra a violação do princípio da não intervenção em assuntos internos, evocando o direito internacional e as convenções de Viena.
  4. Buscar apoio internacional, iniciando articulação com países do G20, BRICS e CELAC, denunciando o ato como agressão diplomática unilateral e inoportuna.

2. Medidas de reciprocidade graduada

  1. Se houver expulsão de diplomatas brasileiros: expulsar funcionários diplomáticos norte-americanos em reciprocidade direta e proporcional.
  2. Suspender ou revisar cooperações bilaterais específicas (ex.: acordos de intercâmbio tecnológico militar, cooperação ambiental em áreas sensíveis).
Donald Trump, presidente dos EUA. Foto: Buda Mendes/Getty Images

📍 Reações de Médio Prazo (meses)

  1. Recalibragem da política externa Redirecionar a política externa brasileira para reforçar alianças estratégicas alternativas:
  • Intensificar relações com a União Europeia, China, países árabes e africanos.
  • Reativar de forma proativa mecanismos como UNASUL e CELAC.
  • Avançar parcerias estratégicas no âmbito dos BRICS+.

2. Blindagem econômica

  • Avaliar exposição do Brasil a sanções secundárias e ao sistema financeiro dos EUA (via dólar, bancos, fornecedores), especialmente no comércio exterior e investimentos diretos.
  • Iniciar transações bilaterais com parceiros estratégicos em moedas locais, reduzindo dependência do dólar (seguir modelo China-Rússia, Índia-Emirados).
  • Buscar suporte de organismos multilaterais (OMC, FMI, G77) para denunciar efeitos extraterritoriais de sanções.

📍 Reações de Longo Prazo (anos)

  1. Reposicionamento geopolítico
  • Caso a deterioração seja irreversível, consolidar o Brasil como potência autônoma do Sul Global.
  • Fortalecer presença em fóruns internacionais como ONU, OCDE (sem se submeter a pressões de alinhamento automático), OMC, e fortalecer o Mercosul.

2. Modernização da capacidade diplomática e de defesa

  • Investir na autonomia diplomática e militar, com reforço do Itamaraty e da Base Industrial de Defesa nacional.
  • Estimular o debate público e parlamentar sobre política externa soberana e plural, para que não seja refém de polarizações internas ou alianças assimétricas.

🟡 Essas sanções — se vierem — não são contra um governo ou partido, mas contra o princípio fundamental da soberania nacional. Precisamos de união institucional para reagir com firmeza e maturidade.

  1. Evitar escalada retórica: manter firmeza, mas sem confronto gratuito.
  2. Reforçar protagonismo internacional autônomo, sem cair em nova bipolaridade (China vs EUA).
  3. Conduzir consulta ampla com Congresso e sociedade civil sobre as consequências e diretrizes da política externa do Brasil.
  4. Lançar uma diplomacia de reconstrução e mediação com apoio de países aliados e neutros (Noruega, França, África do Sul, México).
  5. Proteger ativos estratégicos brasileiros no exterior de eventuais bloqueios.

A diplomacia brasileira já demonstrou, no passado, que é capaz de agir com grandeza. Que seja assim novamente — não para confrontar, mas para liderar pelo exemplo.

Publicado originalmente aqui