
Ernesto Paglia conversou com Valmir Moratelli, da VEJA Gente, sobre seu novo momento profissional. Depois de mais de quarenta anos na TV Globo, o jornalista atravessa uma fase de reinvenção e dedica boa parte do tempo à produção do documentário Caça-Tempestades na Amazônia.
Na entrevista, Paglia comentou como viveu a saída da emissora e contou que o processo foi acompanhado por um impacto emocional relevante. Ele também falou da mudança no mercado, citando a crescente pressão que a TV aberta enfrenta diante das plataformas digitais.
Ao explicar por que não pretende voltar ao telejornalismo tradicional, Paglia destacou que encontrou no universo dos documentários um espaço mais livre para criação e investigação. Segundo ele, essa é hoje a área onde faz mais sentido concentrar energia e projetos.
Paglia ainda abordou a vida pessoal. Falou do casamento com Sandra Annenberg e mencionou o desejo de seguir produzindo documentários ambientais nos próximos anos. A seguir, trechos da entrevista.
Veja Gente – O que significou deixar a Globo depois de tanto tempo?
Ernesto Paglia – Foi como sair da casa dos pais. Você sente saudade de algumas coisas, como a proteção, do salário, da festa de fim de ano, mas chega uma hora em que é preciso ir. Hoje posso escolher os projetos com que quero me envolver. É claro que ainda me chamam de “o cara da Globo”, e tudo bem. Faz parte da minha história. Mas espero que um dia me reconheçam como “o cara que caçou tempestades na Amazônia”. Essa será a virada.
Veja Gente – Como lidou emocionalmente com essa demissão?
Ernesto Paglia – Sem ressentimento algum. Entendo que a empresa vive outro momento. Funcionários mais antigos têm salários mais altos, novas linguagens chegam, e a empresa precisa se ajustar para sobreviver. Mas saí de lá com as portas abertas. Tanto que, recentemente, fui convidado a participar da gravação da mensagem de fim de ano, acompanhando a Sandra. Entrei como visitante, de crachá temporário. Curioso, mas bonito.
Veja Gente – Depois de mais de 40 anos na TV aberta, como enxerga esse meio hoje, diante do avanço do streaming e das plataformas digitais?
Ernesto Paglia – A televisão aberta está sob xeque, não é xeque-mate, mas o jogo mudou completamente. O grande concorrente hoje não é mais a Band, o SBT ou a Record. É o YouTube, é o Google. As Smart TVs colocaram tudo na mesma tela: TV aberta, a cabo e streaming. A escala de operação é outra, os recursos são outros, e competir nesse cenário é muito difícil.
Veja Gente – E se te chamassem de volta para a TV aberta?
Ernesto Paglia – Para o telejornalismo, acho difícil. Voltaria apenas se houvesse espaço para documentários. Hoje o meu grande privilégio é escolher o que faço, e isso não cabe na estrutura de uma grande emissora, que tem suas prioridades e necessidades. Fora dela, posso ousar na linguagem, escolher os temas e as pessoas com quem quero trabalhar.
Veja Gente – Como enxerga o jornalismo atual e essa nova geração conectada?
Ernesto Paglia – É uma geração privilegiada pelo acesso à informação, mas que enfrenta um perigo real: a superficialidade. Vejo colegas no ar dizendo “o assessor do ministro me mandou”, “o advogado do réu acaba de enviar uma mensagem”. É interessante em termos de acesso, mas… em que momento essa informação foi checada? O risco é virar marionete das fontes. O desafio é usar a tecnologia com consciência. Não podemos virar a “tia do WhatsApp”, que repassa tudo sem checar.

Veja Gente – Você e a Sandra estão juntos há mais de 30 anos. Como segue essa parceria?
Ernesto Paglia – Excelente, cada vez melhor. Hoje, que trabalhamos separados, temos até mais assunto. (risos) Ela está animada com os novos desafios do Globo Repórter, que voltou a ter apresentadores fazendo reportagens. Acho ótimo. Estamos num momento em que trocamos muito, nos inspiramos e nos apoiamos mutuamente.
Veja Gente – E há algo que ainda quer realizar na carreira?
Ernesto Paglia – O meu sonho é virar o David Attenborough brasileiro. Ele é um monumento ao documentário ambiental, e eu adoraria seguir esse caminho: viver contando boas histórias sobre meio ambiente, clima e também outros temas. Agora mesmo estou trabalhando com carros antigos, que têm muita história e tecnologia envolvidas. Espero que o público continue gostando do que faço e que eu possa seguir explorando essa variedade de assuntos que o documentário permite.