A”blindagem” da Lava Jato e o punitivismo do Supremo Tribunal Federal. Por Afrânio Silva Jardim

Atualizado em 26 de setembro de 2019 às 10:05
Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão de junho deste ano. ANTONIO CRUZ AGÊNCIA BRASIL

Publicado originalmente na fanpage do autor no Facebook

POR AFRÂNIO SILVA JARDIM, professor associado de Direito Processual Penal. Mestre e Livre-Docente em Direito Processual Penal pela Uerj. Procurador de Justiça (aposentado) do Ministério Público do E.R.J.

A “BLINDAGEM” DA LAVA JATO E O PUNITIVISMO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

RESUMO DO MEU ENTENDIMENTO SOBRE AS NULIDADES NO PROCESSO PENAL.

O Supremo Tribunal Federal começou ontem o julgamento. Deve terminá-lo hoje. Duas questões têm de ser enfrentadas neste julgamento, que pode beneficiar alguns réus nos processos da “Lava Jato”. São elas:

1) Há nulidade processual pelo fato de o réu delatado ter apresentado as suas alegações finais no mesmo prazo do réu delator?

2) Para o reconhecimento de tal nulidade se faz necessário que o réu delatado demonstre prejuízo, em decorrência de não ter se manifestado nos autos por último?

Examinei estas questões em breve estudo que publiquei em minha coluna do Site Empório do Direito, conforme link abaixo.

Tendo em vista o teor do voto do min. Fachin do S.T.F., hoje prolatado no Plenário, (mais uma vez o ministro espertalhão retirou o processo da 2a.Turma, onde sabia que iria perder!!!), bem como alguns pronunciamentos doutrinários sobre o tema, apresento um resumo do meu entendimento sobre esta questão processual:

1) Mesmo que não prevista a nulidade na lei processual, ela deve ser declarada sempre que o procedimento ou ato do processo estiver em conflito com algum princípio ou regra constitucional;

2) Se há testilha com a Constituição Federal, não há como negar que tal nulidade é absoluta. Violar um direito fundamental não pode acarretar apenas uma nulidade relativa.

3) Tratando-se de nulidade processual absoluta, ela é insanável e está fora do poder dispositivo das partes. Deve ser reconhecida de ofício pelo Poder Judiciário, em qualquer fase do processo.

4) Cuidando-se de nulidade absoluta, descabe indagar ou presumir prejuízo para as partes, numa perspectiva privatista do processo penal.
O Estado-Juiz também é sujeito da relação processual e tem interesse na concretização de um processo justo, obediente ao que se convencionou chamar de “devido processo legal”.

5) Assim, havendo uma nulidade absoluta no processo penal, o prejuízo é real e concreto para a correta atividade jurisdicional do Estado, vale dizer, para o Estado Democrático do Direito. Nele, não é valioso punir a qualquer preço.

6) As regras expressas no Código de Processo Penal que podem levar à sanatória são pertinentes apenas para as nulidades relativas. Nestas, sim, é preciso que a parte alegue na fase processual própria e demonstre o prejuízo sofrido em razão do ato inválido.

7) O princípio da “instrumentalidade das formas” não se refere às nulidades absolutas. Quando está em jogo o interesse público, quando está em jogo um direito fundamental, a forma processual é essencial e o seu desrespeito é a própria negativa do Estado de Direito.

8) Enfim, repetindo: Diante de uma nulidade processual absoluta, haverá sempre prejuízo para a atividade jurisdicional.do Estado.
A nulidade absoluta deve ser declarada até mesmo contra a vontade de todas as partes processuais. O que prevalece é o interesse público. O processo não é “coisa das partes”, como se dizia na antiguidade.