Nós, adolescentes cinquentões

Atualizado em 7 de julho de 2012 às 14:28
Brian Wilson e banda ontem, numa foto amadora tirada por mim mesmo

Passei duas horas com o sorriso que eu tenho para a caçula Camila. Aquele sorriso tolo, franco, total de embevecimento.

Eu e toda a platéia do Royal Festival Hall, a esplêndida casa de espetáculos de Southbank Centre, em Londres. O motivo é que à frente de nós, meio trôpego em sua camisa azul listada, barrigudo e impecavelmente penteado como sempre, estava Brian Wilson, o gênio do Beach Boys. Ele e uma soberba banda de 14 músicos.

Foi uma volta coletiva no tempo para a audiência, composta na maior parte de pessoas que, como eu, cresceram nos anos 60 e 70 ouvindo Beach Boys. Minhas primeiras lembranças do BB me trazem à mente uma vitrola azul precária de pernas finas e cambaias na qual ouvíamos, meus irmãos e eu, um compacto duplo com I Get Around e Don’t Worry Babe, dois clássicos da primeira fase do conjunto.

As pessoas ficam assim, de pé, na maior parte do show

Brian Wilson entrou no palco com uma pontualidade notável. Às 19h30 precisamente, conforme estava programado. O espetáculo não tinha pirotecnia como as de Lady Gaga: se valia essencialmente da música, enfeitada por luzes. Brian Wilson passa a maior parte do tempo sentado à frente de um teclado. Apenas no final levanta e pega o baixo que o consagrou. A idade cobra seu preço.

Mas a música é mais que suficiente para encantar a platéia e transformar-nos em cinquentões ou sessentões em plena adolescência. Quando os sucessos do BB são executados, todos se levantam como num dominó invertido, e requebram como se tivessem de novo 15 anos. Imagino hoje a quantidade de costas doloridas em Londres.

Tomara que Brian leve este show ao Brasil.

São duas partes. Primeiro ele canta Gershwin: Summertime, Porgy and Bess, Rapsody in Blue, esse tipo de coisa. Brian acaba de lançar um disco com canções de Gershwin. É uma beleza.

Mas na segunda parte, quando Brian Wilson canta Brian Wilson, parece que estamos todos no céu. God Only Knows, Wouldn’t it be Nice, California Girls, Barbara Ann etc.

Comparei este com o outro grande concerto que vi este ano, o de Clapton.

Há uma diferença essencial. Clapton não tem o poder de transportar as pessoas para sua juventude. Não fez, nos anos 60, muita coisa marcante. Brian Wilson sim. Me lembrou, nisso, Paul McCartney. Pet Sounds entra numa lista curta dos maiores discos da história do rock.

Todos nós, velhos adolescentes, conseguíamos o milagre de não ficar ridículos dançando como nos bailinhos do passado, antes que a vida tratasse de incinerar nossos sonhos, e o que parecíamos estar dizendo, mais que tudo, era um enorme, um colossal, um definitivo obrigado a Brian Wilson.