Advogado desaparece depois de acusar pastor Everaldo, do PSC, de corrupção. Por Daniel Trevisan

Atualizado em 4 de junho de 2020 às 20:07
Juliano Gomes desapareceu no dia 21 de maio, depois de denunciar presidente do PSC

O desaparecimento do advogado e empresário Juliano Gomes em Minas Gerais agita os bastidores da política e joga luz sobre os negócios do presidente nacional do PSC, o pastor Everaldo Dias  Pereira.

No dia 12 de março, Juliano Gomes e o antecessor do presidente do PSC, Vitor Jorge Abdala Nósseis, enviaram carta a Jair Bolsonaro com graves denúncias contra o pastor Everaldo.

Na correspondência, acusam o atual presidente de ser sócio oculto em empresas e de ter um patrimônio incompatível com sua renda declarada, como apartamento no Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro,  casa de luxo em Angra dos Reis, lancha de 32 pés, fazenda em Goiás e centenas de cabeças de gado.

A carta foi encaminhada pelo Palácio do Planalto ao então ministro da Justiça, Sergio Moro, que no dia 19 de abril a despachou para a PF, e o caso passou a ser investigado.

No dia 21 de maio, Juliano, o autor da denúncia, desapareceu, depois de ser alvo de uma perseguição de carro na estrada que leva até Sete Lagoas, a 70 quilômetros de Belo Horizonte.

Um dos ocupantes do carro que perseguiu o de Juliano foi preso esta semana, e teria dito que o advogado foi assassinado e seu corpo, ocultado.

O jornal Correio da Manhã, do Rio de Janeiro (título tradicional que voltou a circular pela internet), publicou a carta que o advogado encaminhou a Bolsonaro, e procurou o pastor Everaldo. A assessoria de imprensa do PSC nacional informou:

“O Pastor Everaldo esclarece que não é réu em nenhuma ação judicial e processará criminalmente quem o acusa de qualquer irregularidade sem provas.”

Segundo o jornal, o presidente nacional do PSC informou, ainda, que “os fatos apresentados pelo senhor Vítor Nósseis já foram objeto de outras denúncias, todas com decisões judiciais contrárias a Nósseis, destacando, inclusive, sua má fé processual.”

Nósseis e seu fiel escudeiro, Juliano, já tinham acionado o pastor Everaldo na Justiça, com o objetivo de afastá-lo da presidência do PSC por supostas irregularidades.

O advogado do pastor Everaldo foi Wilson Witzel, que em 2018 reativou sua OAB após deixar a magistratura para concorrer ao governo do Rio de Janeiro.

O desaparecimento de Juliano pode não ter relação com a disputa politica no PSC — não há, a rigor, nenhum evidência nesse sentido –, mas a possibilidade de que tenha sido vítima de um crime de violência urbana perde força quando se constata que não houve perda patrimonial nem comunicação de sequestro.

Pastor Everaldo e o Nósseis, que o denunciou por corrupção em carta que foi parar a PF

Abaixo, a carta enviada pelo advogado Juliano Gomes e pelo ex-presidente do PSC a Jair Bolsonaro, que o Correio da Manhã publicou:

1 – DOS FATOS

A operação “Lava Jato” é a maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro que o Brasil já teve.

Dentre as várias linhas de investigação, revelaram-se os crimes cometidos pelos agentes políticos, conforme apurado nos inquéritos criminais.

A operação “Lava Jato” investiga a respeito de uma organização criminosa formada por políticos, funcionários públicos, executivos de empreiteiras e doleiros.

O denunciado acima identificado juntou-se à outras pessoas, fazendo uso da sigla partidária – PSC, Partido Social Cristão, dolosa e conscientemente, de forma organizada, com fortes indícios de prática, continuada, de cometimento de crime contra o sistema financeiro nacional.

Em um primeiro momento os investigadores descobriram que um grupo de empreiteiras distribuíam entre si contratos da Petrobras, mediante o pagamento de propina e desvio de dinheiro público, que eram repassados a partidos políticos.

Os fatos noticiados na presente demonstram a conexão intrínseca e instrumental com os fatos investigados na operação “Lava Jato”, conforme comprovam os documentos, anexos.

Imperioso informar que na data de 22/09/2016 foi protocolizada denúncia perante o Ministério Público Federal do Estado do Paraná, noticiando tais fatos e requerendo as providências cabíveis ao caso, conforme cópia da petição incial com o protocolo, anexa – Doc. 1.

O Sr. Everaldo Dias Pereira concorreu às eleições do ano de 2014, ao cargo de Presidente da República, pelo Partido Social Cristão – PSC, além de ocupar o cargo, àquela época, de Vice-Presidente Nacional do citado Partido.

Cumpre esclarecer que o denunciante é fundador e ocupou o cargo de Presidente Nacional do PSC por 30 (trinta) anos, sendo que, em decorrência de uma fraudulenta convenção realizada na data de 17 de julho de 2015 foi destituído do cargo de Presidente Nacional, passando a ocupar o cargo de Presidente de Honra.

A título de informação, a convenção fraudulenta está sendo questionada por meio de ação própria, autuada sob o nº 2015.01.1.111705-0, em trâmite perante a 25ª Vara Cível de Brasília-DF.

Em decorrência das denúncias apresentadas pelo denunciante, passou a sofrer várias investidas pelo denunciado, dentre elas listamos: a) tentativa de expulsão do denunciante do Partido Social Cristão; b) extinção da Fundação Instituto Pedro Aleixo; c) fortes indícios de interferência nas decisões proferidas nos procedimentos administrativos em trâmite perante o Ministério Público Fundacional do Estado de Minas Gerais.

Conforme divulgado pela mídia, durante o período eleitoral, o Sr. Everaldo Dias Pereira, recebeu vultosas quantias em dinheiro, na casa dos milhões, das empresas investigadas e condenadas na “Operação Lava Jato”, com indícios de prática de crime de lavagem de capitais e organização criminosa.

A origem do dinheiro, por sua vez, só veio a tona quando elucidada a grande rede de corrupção envolvendo empresas de construção, sobretudo os atos ilícitos praticados pelos representantes das empresas investigadas e muitos já condenados, diante da comprovação do cometimento de vários crimes.

As investigações indicam o grande volume de valores movimentados pela organização criminosa, formada por empreiteiros, políticos, doleiros, funcionários públicos, em diversos estados, incluindo São Paulo, rio de Janeiro, Pernambuco, Paraná e outros Estados.

A investigação elucidou diversas práticas delitivas envolvendo vários agentes e núcleos criminosos que se relacionavam entre si, de forma que a prova dos delitos de um conduz à prova de crimes perpetrados pelos outros, e vice-versa, em evidente conexão instrutória.

2 – “MODUS OPERANDI” DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – PARTIDO POLÍTICO

As investigações comprovam a existência de esquema criminoso engendrado por empresas cartelizadas, agentes públicos e partidos políticos, com o cometimento de diversos crimes contra a ordem econômica, administração pública e lavagem de dinheiro em detrimento da Petróleo Brasileiro S.A – PETROBRAS.

Os fatos confirmados em delações premiadas, agentes públicos do alto escalão da PETROBRAS, num esquema previamente ajustado com membros de partidos políticos, solicitaram, receberam e aceitaram, por meio de procedimentos licitatórios fraudulentos, a contratação de empresas cartelizadas.

Por sua vez, os dirigentes dessas empresas ofereciam, prometiam e efetivamente pagavam “propina” aos agentes públicos, com o repasse de vantagem indevida aos funcionários corrompidos da PETROBRAS e aos membros de partidos políticos com participação no investigado esquema criminoso.

Ao que tudo indica, o denunciado, Sr. Everaldo Dias Pereira, hoje Presidente Nacional do PSC e, àquela época candidato na eleição de 2014, aceitou e recebeu vultosas quantias em dinheiro oriundo do esquema criminoso, tendo sido citado em algumas delações.

Verifica-se que esses repasses eram periódicos e aconteciam à medida que o esquema criminoso se desenvolvia, confiante na impunidade, protegido por parlamentares e membros do Executivo, mentores de todo esquema criminoso.

3 – DA NECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL

O Presidente Nacional do PSC, Sr. Everaldo Dias Pereira, ao que tudo indica, está envolvido em atos de corrupção e desvio de finalidade na manipulação de verba e atribuições partidárias, o que se faz necessário a abertura de procedimentos investigatórios e apuração de responsabilidades.

Há indícios de que o Sr. Everaldo Dias Pereira, negocista por natureza, tem feito uso de dinheiro público, nas suas negociações/tramoias, para benefício próprio, ao ponto de enriquecer-se secretamente e de maneira ilícita.

No ano de 2014, em declaração enviada à Justiça Eleitoral, o Sr. Everaldo Dias Pereira declarou seus bens no modesto valor de 121 mil reais, irrisório quando comparado com os seus gatos, lugares frequentados, viagens realizadas, residência e casa de férias de alto luxo.

Evidente a fraude articulada pelo Sr. Everaldo Dias Pereira ocultando seu real patrimônio e prestando declaração falsa à Justiça Eleitoral que não retrata a realidade, praticando crime eleitoral e contra a ordem financeira, ao sonegar bens de sua propriedade.

Necessário se faz uma investigação pelos órgãos competentes no que diz respeito ao patrimônio existente em nome do Sr. Everaldo Dias Pereira, bem sua evolução patrimonial.

Novos indícios há de que o Sr. Everaldo Pereira é proprietário de fato:

•Empresa Dinâmica Segurança Patrimonial – sócio oculto – com sede na Rua Pesqueira, nº 103, Bonsucesso, Rio de Janeiro/RJ, CEP: 21.041-150;

• Proprietário de fato do apartamento localizado na Estrada Benvindo de Novaes, nº 181/302, bairro Recreio dos Bandeirantes, Rio de Janeiro/RJ, apartamento de alto luxo;

• Casa de luxo em Angra dos Reis – localizada na praia da longa, Ilha Grande, Angra dos Reis, Rio de Janeiro/RJ, conforme certidão de ocupação nº 1202/02;

• Lancha 32 pés;

• Fazenda no Estado de Goiás;

• Centenas de cabeças de gado.

Ainda, há indícios de que os bens de maiores valores estão vinculados a uma pessoa jurídica, que deverá ser objeto de investigação do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ministro Sérgio Fernando Moro; da Polícia Federal; Receita Federal do Brasil; Procuradoria Geral Eleitoral e Supremo Tribunal Federal, em função de suas ligações estreitas e comerciais com o ex-Deputado Eduardo Cunha, já condenado.

Evidências não faltam, conforme matéria publicada (cópia, anexa), de acordo com o relatório da Polícia Federal, mensagens de celular entre o deputado cassado Eduardo Cunha e o ex-ministro Geddel Vieira Lima discutiram repasse de fundos para o Partido Social Cristão, conforme havia sido pedido pelo Presidente do Partido, Pastor Everaldo.

A Polícia Federal afirma que as mensagens haviam sido trocadas e foram encontradas em um telefone apreendido de Eduardo Cunha em dezembro de 2015 pela “Operação Catilinárias”.

Nas mensagens trocadas, tanto Eduardo Cunha quanto Geddel afirmaram estar sendo “perturbados” pelo PSC, por pedidos de recursos financeiros. Ainda, Geddel havia enviado uma mensagem para Cunha afirmando que “Caso Dinâmica de Everaldo resolvido”.

Peritos da Polícia Federal afirmaram, àquela época, que esse “caso” refere-se à empresa Dinâmica Segurança Patrimonial, cujo sócio-administrador é Edson da Silva Torres, sócio do Sr. Everaldo Pereira.

Ainda, de acordo com a informação constante na petição enviada pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, em abril de 2017, revela que os colaboradores teriam narrado ocorrência de repasses de vantagem indevida, a pretexto de doação á campanha eleitoral, em favor de Everaldo Dias Pereira, candidato à Presidente da República no ano de 2014. De acordo com os delatores, os pagamentos foram na ordem de 6 milhões de reais.

Vossa Excelência tem reforçado o compromisso com a causa, visando combater a corrupção no Brasil. O momento é delicadíssimo, a beira de grandes avanços ou de enormes retrocessos, tal como aconteceu na operação Mãos Limpas, na Itália, quando os poderosos foram atingidos e começou a surgir um movimento de mudar leis para frear aquela operação.

A “Lava Jato” revelou um quadro de corrupção sistêmica no Brasil, nunca antes visto, mostrando que a corrupção passou a fazer parte do próprio sistema. Mas, Vossa Excelência tem a oportunidade de moralizar o país.

3.1 – PROVIDÊNCIAS – EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS

Requer a expedição de ofícios para que sejam tomadas as providências legais cabíveis, com a remessa de cópia da presente denúncia, aos órgãos: a) Ministério da Justiça e Segurança Pública, por se tratar de um órgão do Poder Executivo Federal; b) Departamento de Polícia Federal (DPF), por se tratar da principal instituição policial do Brasil, para apuração de infrações penais contra a ordem política e social, bem como repressão ao desvio de recursos públicos e crimes políticos; c) Controladoria-Geral da União (CGU), por se tratar de órgão do Governo Federal 8/9 responsável por prestar assistência ao Poder Executivo em todos os assuntos relacionados à defesa do patrimônio público e à promoção da transparência da gestão pública, além de prevenção e combate à corrupção; d) Ministério Público Federal (MPF), por se tratar de instituição essencial para a função jurisdicional do Estado brasileiro, agindo na defesa da ordem jurídica, do regime democrático de direito e na defesa de direitos sociais, e e) Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), por se tratar de órgão com a principal missão de coibir o crime de lavagem de dinheiro, disciplinando, aplicando penas administrativas, recebendo, examinando e identificando ocorrências suspeitas de atividades ilícitas relacionadas à lavagem de dinheiro.

4 – LESA-PÁTRIA

Há indícios de que o Sr. Everaldo Pereira realizou e participou de aliança política, traiçoeira, que causou prejuízos ao Brasil, prejudicando sua democracia, soberania e liberdade de seu povo, bem como efetuando desvios fraudulentos dos cofres públicos, impondo com isso um regime autoritário fundamentado na esquerda radical, aparelhando o Estado e subjugando o povo, enganando, comprando e fraudando eleições para permanecer no poder.

Diante disso, o Sr. Everaldo Pereira, também deverá ser denunciado pela prática de crime lesa-pátria.

5 – PEDIDOS

Pelo exposto e por tudo que foi narrado, com fortes indicios de práticas de condutas delituosas pelo Denunciado, requer seja a presente denúncia recebida e, ao final, julgada procedente, com a aplicação das penas cabíveis ao caso. Caso entenda, data venia, pede a remessa do presente ao Excelentíssimo Senhor Ministro da Justiça para que tome as providências cabíveis, nos termos da Lei.

Requer, a expedição de ofícios com cópia da presente denúncia, para: Departamento de Polícia Federal (DPF); Controladoria-Geral da União (CGU); Ministério Público Federal (MPF).

Nesses termos e com os links abaixo relacionados, pede deferimento.

Belo Horizonte-MG P/ Brasília-DF, 12 de março de 2020
Vitor Jorge Abdala Nósseis – OAB/MG 18.827
Juliano César Gomes – OAB/MG 118.456