Aécio Neves teve três crises de overdose quando era governador, afirma jornalista em livro

Atualizado em 14 de maio de 2018 às 15:51
Aécio Neves. Foto: Lula Marques/PT

Capítulo Ligações Perigosas, do livro “Diálogo com ratos – censura e perseguição no jornalismo digital”

Na medida em que ia subindo o número de views do Novojornal, aumentavam as preocupações de Andrea Neves. Já não era apenas o Mensalão Tucano Mineiro, a Lista de Furnas e a Gang dos Castos ou o temor do depoimento do advogado Joaquim Engler. Principalmente a partir do instante em que foram noticiadas crises de overdose de Aécio Neves, no Palácio das Mangabeiras, residência oficial dos governadores de Minas Gerais. O público ficou sabendo que ele teve de ser transportado de helicóptero para o hospital Mater Dei, também em Belo Horizonte. Além do mais, a irmã do governador sabia da existência de provas concretas sujeitas à apreciação judicial da exceção da verdade em caso de abertura de processo criminal.

Como o Novojornal poderia obter tais documentos tão sigilosos? Qualquer agente policial ou um jornalista investigativo, ainda inexperiente, pode afirmar, mas irá supor ser alguém ligado à PM-2, órgão encarregado da segurança pessoal dos governadores mineiros. No meu caso, não ficarei em suposições. Digo ter sido mesmo informação obtida mediante compromisso firmado que, por razões ligadas à segurança da família de quem informou, nem após ele falecer, eu direi. É visando casos assim que, em países verdadeiramente democráticos, a Constituição garante o sigilo das fontes dos jornalistas. “Garganta Profunda” era o codinome de Marck Felt, ex-diretor-assistente do FBI, o homem que revelou a Bob Woodward e Carl Bernstein, do Washington Post, os dados que os possibilitaram produzir a série de matérias que culminaram com a renúncia do ex-presidente norte-americano Richard Nixon quando do episódio envolvendo o escândalo Watergate. Em momento algum, eles disseram ou foram forçados a dizer quem era a fonte, tendo o próprio Felt, quase ao final da vida, feito a revelação de ser ele o Deep Throat.

Tais overdoses, em número de três, foram publicadas a primeira vez em 2013, gerando pânico entre os formuladores da Teoria da Falsidade (como o autor chama a operação para fazer os eleitores desacreditarem de fatos divulgados que contrariavam interesses dos governantes à época).

Intensificaram-se também os contatos sigilosos entre Marco Aurélio Carone* e Andrea Neves, como se fora, na história moderna, outra Agripina e cuidar de Nero. Diante do agravamento da crise, o Novojornal enviou um e-mail a Aécio, que não foi respondido, abordando tal questão.

O site enviou também outro documento, de igual teor, à direção do Hospital Mater Dei, que respondeu somente poder divulgar assuntos relativos às perguntas formuladas mediante ordem judicial ou com expressa autorização do paciente. Não disse sim, evitou a colocação do não, mas o teor da resposta, para quem sabe ler e entende que um pingo é letra, desfaz muitas dúvidas. Em suma: assuntos de tal natureza só podem ser divulgados com expressa autorização do paciente ou ordem judicial. Então? Houve um paciente. Quem era ele? A indagação feita pelo site deixa sinais claros.

Documentos citados na matéria: e-mail encaminhado ao Hospital Mater Dei em 9 de janeiro de 2013. Reenvio do e-mail ao Hospital Mater Dei em 17 de janeiro de 2013. E-mail encaminhado ao ex-governador e atual senador Aécio neves em 9 de janeiro de 2013. E-mail encaminhado ao procurador André Estevão Ubaldino Pereira em 18 de novembro de 2013.

É necessário destacar que tais overdoses ocorreram dentro do Palácio das Mangabeiras, residência oficial do governador de Minas, guarnecido pela Polícia Militar, 24 horas por dia. Corporação militar que cumpriu sua obrigação, entregando, através de seu serviço reservado, um detalhado relato do ocorrido à Coordenadoria Antidrogas, inclusive sobre a transferência de Aécio Neves em helicóptero operado pela Polícia Militar para o Hospital Mater Dei, em Belo Horizonte.

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Geraldo Elísio

Geraldo Elísio, um dos repórteres mais experientes de Minas Gerais, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo — categoria regional –, em 1977, por reportagens que denunciaram um caso de tortura nas dependências da PM. Foi secretário-adjunto de Cultura (governo Newton Cardoso, PMDB). É escritor e poeta. Em 2014, teve casa revirada por policiais civil, em cumprimento a um mandado de busca e apreensão. Levaram um netbook, onde fazia seus textos, além de pen-drives, nunca devolvidos. Era editor do Novojornal.

Marco Aurélio Carone, citado no capítulo, é publicitário e jornalista, dono do Novojornal. Filho de um ex-prefeito de Belo Horizonte e de uma deputada, foi candidato a governador de Minas em 2002, na mesma eleição em que Aécio se elegeu. Não era propriamente um concorrente do governador, porque, por um acordo entre partidos, apoiava o candidato tucano, atacando concorrentes dele e também fazendo sua defesa.

Marco Aurélio Carone foi preso em 2014, num processo em que, ao final, acabou absolvido. Passou nove meses na cadeia –justamente no período de pré-campanha e campanha de Aécio –, a maior parte em solitária, onde desenvolveu o hábito de dialogar com um rato,  a que deu o nome de Danilo, daí o título do livro: “Diálogo com ratos”.

Muito do que se sabe hoje de Aécio foi noticiado pelo site, mas os arquivos ainda se encontram apreendidos pela Justiça.

Livro: “Diálogo com ratos – censura e perseguição no jornalismo digital”, editora Letramento.