“Sem receita, não terei condições de manter o projeto”, diz fundador do Flow ao DCM

"Fomos informados que a avaliação do caso está nas mãos de uma equipe que nós não temos acesso", diz o fundador do Flow sobre o Youtube

Atualizado em 3 de abril de 2022 às 12:38
Igor Coelho, o Igor 3K
Igor Coelho, o Igor 3K. Foto: Reprodução/Youtube

Em fevereiro de 2022, o youtuber e podcaster Monark, Bruno Aiub, defendeu a legalidade de um Partido Nazista. Fundador do Flow Podcast ao lado de Igor Coelho, o Igor 3K, Monark foi desligado da empresa em 24 horas, mas a fala repercutiu negativamente para o podcast, que perdeu patrocinadores e foi repudiado por entidades judaicas.

Igor tem 36 anos. Criou o canal 3K, uma brincadeira com a palavra “caralho”, em 27 de agosto de 2014. Jogador de Street Fighter, além de outros jogos de luta, Igor 3K viralizou em vídeos de GTA V (com mods, as modificações dos games), Super Mario Maker (em estágios considerados ‘quase impossíveis’) e Mortal Kombat.

Chegou em quase um milhão de inscritos em mais de 200 milhões de visualizações. No Flow, Igor 3K e Monark chegaram em quase meio bilhão de visualizações e quase quatro milhões de inscritos. Entrevistaram recentemente o vereador youtuber Gabriel Monteiro, acusado de estupro, o morador de rua Givaldo Alves (famoso pelo caso de sexo com uma missionária no DF) e até Eduardo Bolsonaro.

Givaldo Alves no Flow Podcast
Givaldo Alves no Flow Podcast. Foto: Reprodução/Youtube

Mas figuras de esquerda também foram entrevistadas pelo Flow, como Fernando Haddad, Guilherme Boulos e Marcelo Freixo. Após a fala de Monark, Boulos pediu para retirar seu programa do ar.

Para a Coluna da Mônica Bergamo na Folha de S.Paulo, Monark afirmou que irá para a plataforma Rumble, conhecida nos Estados Unidos por disseminar conteúdos de extrema direita, como o próprio Steve Bannon. Rumble está investindo no Brasil e a conversa de Monark com a plataforma foi intermediada pelo jornalista Glenn Greenwald, ex-Intercept.

Ele fará um novo podcast chamado Monark Talks. Ao DCM, Igor 3K afirmou que o Flow não migrará para o Rumble e que mantém suas atividades no Youtube. No entanto, o youtuber reclamou da atitude pouco transparente das chamadas Big Techs no caso de sua empresa – mesmo após a demissão de Monark.

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Igor 3K, fundador do Flow, fala ao DCM

Igor Coelho na época do canal 3K
Igor Coelho na época do canal 3K. Foto: Reprodução/Youtube

Diário do Centro do Mundo: Em episódio recente do Flow, você disse que o Youtube desmonetizou o canal de vocês e outros sete, incluindo os canais de cortes. Qual a situação da empresa hoje?

Igor 3K: Numa reunião que aconteceu no dia 31 de março, fomos informados que a avaliação do caso está nas mãos de uma equipe e nós não temos acesso. Eles afirmam que é um departamento interno e isolado dos criadores de conteúdo. Quando a fala do Monark ocorreu, primeiro eles mandaram email falando que a gente estava desmonetizado.

Nesse e-mail, falaram que teríamos 24 horas para responder e nos defender. Esse email foi enviado cerca de uma hora da manhã. No mesmo dia, às 10 horas da manhã, o G1 já sabia que a gente estava desmonetizado.

Ou seja, nós não tivemos as 24 horas que eles prometeram para a gente se defender. Essas punições duraram os 30 dias. Quando os dias venceram, pedimos para eles remonetizarem, um direito nosso. Nove dias depois, ninguém nos deu retorno, ninguém fala com a gente ou dá alguma justificativa.

O email falando das desmonetizações foi em 18 de fevereiro. Depois nunca mais falaram com a gente. Pedimos a remonetização dia 21 de março, quando se completaram os 30 dias de punição. Mas ninguém respondeu. Então a desmonetização de sete canais da empresa, como Flow, Cortes do Flow e Flow Sport Club, permanece.

DCM: Logo após o desligamento do Monark, você afirmou que cortou 90% do seu salário para manter a empresa funcionando. A situação segue igual?

Igor 3K: Sim, segue igual. Direta e indiretamente, o Flow gera mais de 150 empregos. A gente não teve nenhum desligamento por causa dessa crise. Para manter todo mundo, os principais gestores sacrificaram grande parte do salário. Eu posso falar que o meu salário reduziu em 90%.

Outros gestores toparam fazer esse sacrifício porque acreditam muito na empresa. Essa situação, temporária, continuará enquanto formos ajustando a questão da monetização e enquanto captamos novos patrocinadores. Mas há preocupação porque, sem receita, não terei condições reais de manter projetos que, inclusive, têm importância social.

Fazemos doações de cestas básicas, ajuda financeira a ONGs e programas baseados em diversidade política e social, princípio que acreditamos fortemente. É o caso Avesso, o Noir e o Canal Amplifica [Avesso e Noir abordam temas da população negra e periférica, enquanto o Amplifica é um projeto do guitarrista Rafael Bittencourt, do Angra, de música].

DCM: Vocês não são os ‘pais do podcast’, formato que já existia com Nerdcast em 2006, mas popularizaram a forma que Joe Rogan fazia nos EUA. Vocês sentiram falta de apoio dos colegas nessa crise?

Igor 3K: Não somos realmente os pais do podcast no Brasil, mas transformamos o Brasil no país que mais consumiu podcast no mundo nos dois últimos anos. Todo respeito a quem veio antes, sempre. Não senti falta de apoio porque o propósito do Flow é essencialmente diferente dos outros.

E jamais os colocarei em posição de comprar nossa briga. É, no entanto, triste ter de ver pessoas que se beneficiaram do cenário que inegavelmente criamos divertindo-se com a situação.

DCM: Com essa crise do caso Monark, vocês sofreram muito pela sabotagem do Youtube?

Igor 3K: O que você chama de sabotagem as plataformas chamam de seguir diretrizes. De qualquer forma, sim, estamos sendo asfixiados, no alcance e na receita – de forma absolutamente injusta e desproporcional, considerando todas as ações que a empresa tomou.

Enxergo essas Big Techs muito distantes do seu principal ativo, os criadores. Se o Flow nunca conseguiu ter um contato direto com as plataformas e só conseguimos nos comunicar quando tornamos o problema público com um tom mais ríspido, imagina criadores menores por aí que precisam entrar em contato com eles por algum problema.

DCM: Você criticou as pessoas que pediram publicamente para tirar episódios do Flow do ar. Qual foi o pedido que mais te decepcionou? E o quanto esses vídeos tirados do ar afetaram o Flow no Youtube?

Igor 3K: Não me sinto à vontade para citar nomes, mas com certeza uns surpreenderam mais que outros. Acho curioso, no mínimo, pedir essas remoções, que foram integralmente respeitadas, porque os episódios não representavam nenhuma ameaça à imagem de nenhum deles.

Nada aconteceu de negativo nesses episódios. A sensação que fica é que a sinalização de virtude, a necessidade de palmas virtuais e, por fim, aproveitar-se da nossa queda, assim como se aproveitaram na ascensão, é necessário.

Alguns já me pediram desculpas no privado, mas ainda não o fizeram publicamente. Portanto tem pouca importância pra mim. Na hora de bater o fizeram publicamente.

Monark e Igor 3K, fundadores do Flow
Monark e Igor 3K, fundadores do Flow. Foto: Reprodução/YouTube

DCM: Acompanhei o crescimento do Flow na Twitch, quando vocês utilizaram a verba que acumularam do Facebook Gaming. Twitch era parceira do Flow desde o começo. A plataforma rompeu de forma pior que o Youtube?

Igor 3K: A Twitch nos baniu sem nenhuma explicação, nenhum aviso e nenhum contato. Claro, da nossa parte houve esforço para entender mas tudo que conseguimos deles foi um pedido pra mandar email no canal padrão de comunicação com criadores.

Por email jamais veio resposta. Fico chateado porque éramos o maior canal do segmento no mundo em número de seguidores e aparentemente não merecemos sequer uma resposta negativa.

DCM: Muitos anunciantes se desligaram do Flow na crise com o Monark. Recentemente eu vi o retorno da Philip Mead, de hidromel. Como está a relação de vocês com patrocinadores?

Igor 3K: Tivemos a saída de todos os patrocinadores, mas, após as medidas que tomamos pós-crise, como o desligamento do Monark, alguns já estão voltando e novos patrocinadores estão surgindo. Estamos com negociações em andamento neste momento.

Existem marcas nos procurando, tanto parceiros novos quanto parceiros que perceberam e respeitam as atitudes que tomamos e enxergam que fizemos o que uma empresa séria deveria ter feito. Claro, ainda enfrentamos resistências. Mas tenho plena confiança que pelo menos nesse sentido as coisas em breve voltarão ao normal.

DCM: Com a atual crise, você teria feito algo de diferente no Flow? Se arrepende de algo nessa trajetória?

Igor 3K: Falando como Igor “empresário”, eu não me arrependo do modo como reagimos à crise atual. Não faria diferente e acreditamos que foi o caminho certo. Optamos por um caminho apaziguador e de assumir responsabilidades. Entendo a punição do Youtube, mas não concordo com ela.

Eles puniram outros canais que não tinham nada a ver com o Flow Podcast, como o Flow Sport Club. Isso eu achei desproporcional e injusto. E eles admitiram que erraram a mão nesse sentido em uma reunião que tivemos. Admitiram o erro, mas mantiveram a desmonetização.

Hoje, as reputações dos programas que produzimos estão interligadas. Quase nenhum programa tem um nome que remete ao nome do Flow justamente porque a intenção era que esses programas fossem independentes, apenas produzidos sob o mesmo guarda-chuva.

Entendo que essa associação ajudou a levantar esses programas, mas acho que ficou claro o problema que vem junto com isso.

Não me arrependo de construir como construí especialmente porque sei que iniciativas que tivemos ninguém mais teria. O pensamento natural seria de monopolizar o mercado o máximo possível. Isso foi o contrário do que fizemos.

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