“América Latina está presa em armadilha que emergência climática agrava”, diz diretora da CEPAL

Camila Gramkow confirma participação no Seminário Pós-COP30 e defende que Brasil lidere industrialização verde global

Atualizado em 4 de novembro de 2025 às 16:27
Camila Gramkow

POR CACO DE PAULA 

“A América Latina está correndo risco de entrar numa terceira década perdida. Se olharmos para os dados do crescimento médio do PIB nos últimos 10 a 15 anos, a taxa média desse período já é inferior à década perdida dos anos 80.” A constatação é de Camila Gramkow, diretora do Escritório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) no Brasil, economista formada pela USP com mestrado pela UFRJ.

Camila é mais um nome confirmado para o Seminário Pós-COP: O Brasil diante das transformações globais, que será realizado em 24 de novembro na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).

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O DCM conversou com Camila Gramkow sobre a COP30, o protagonismo brasileiro nos fóruns internacionais e a urgência de transformar a agenda climática em agenda de desenvolvimento.

A economista diagnostica que Brasil e América Latina estão presos em uma “tripla armadilha do desenvolvimento” que a emergência climática agrava, defende o conceito de Big Push para Sustentabilidade, analisa como o Brasil tem liderado estratégias industriais verdes em fóruns como G20 e BRICS, e explica por que não se fala mais em “crise climática”, mas em “emergência climática”.

Camila diagnostica três armadilhas que se auto-reforçam. A primeira é a baixa capacidade para crescer. A segunda é a alta desigualdade e baixa coesão social. “Embora o Brasil e muitos países da região tenham avançado significativamente no início do presente século, a América Latina ainda é a região que apresenta a maior disparidade de distribuição de renda do planeta.”

A terceira é a das baixas capacidades institucionais. “Os estados não contam com as capacidades necessárias – humanas, fiscais, orçamentárias – para enfrentar esses desafios.”

A emergência climática agrava essas três dimensões. “Recentemente tivemos no Rio Grande do Sul um exemplo disso, em que as inundações de proporções históricas, segundo a CEPAL, causaram danos econômicos que superam 90 bilhões de reais.”

Os efeitos climáticos são desproporcionais sobre as comunidades vulneráveis. “São as pessoas que moram nas encostas dos rios sujeitos a inundações as que vão sofrer mais. Tem todo o tema do racismo ambiental, da desigualdade de gênero.”

Big Push para sustentabilidade

Para Camila, a COP30 tem relevância estratégica, científica e absoluta.  “Há uma compreensão cada vez maior de que a agenda climática não é apenas de gestão de riscos, mas também uma agenda de oportunidades de desenvolvimento, de geração de postos de trabalho.”

É nesse sentido que a CEPAL propõe o Big Push parasustentabilidade. “A agenda climática não é espontaneamente uma agenda de desenvolvimento. Embora os investimentos verdes tracionem no curto prazo crescimento econômico, no longo prazo isso só se sustenta sob determinadas condições. Se esses investimentos forem majoritariamente importados, nós vamos estar exportando esses benefícios sociais e econômicos.”

Por essa perspectiva, a solução é integrar agenda climática com desenvolvimento produtivo. “Para que pelo menos uma parte dessas soluções verdes sejam geradas no território.”

Essas agendas já estão se traduzindo do  discurso para a realidade. “Na Colômbia, a política de reindustrialização tem uma ênfase muito clara em transição energética. No caso do Brasil, é a  Nova Indústria Brasil, que muitas vezes é defendida como política de neoindustrialização verde.”

Camila destaca o papel do Brasil em importantes fóruns internacionais. “O Brasil esteve na presidência do G20 e na declaração de líderes foi incluído um parágrafo sobre estratégias industriais verdes. Parece pouca coisa, mas para esse tipo de declaração, o consenso internacional é muito importante.”

Essa perspectiva o Brasil leva também para a presidência do Mercosul, dos BRICS e agora para a COP30. “Está sendo negociada uma declaração ministerial sobre a industrialização verde global, por iniciativa do Brasil.” A economista enfatiza a importância simbólica de a conferencia ser hospedada no Brasil.

“É a grande janela de oportunidade para um país em desenvolvimento, um país do Sul Global. Colocar esse olhar – como a presidência do Brasil chama, esse olhar guiado não pela Estrela do Norte, mas pelo Cruzeiro do Sul – é um legado muito importante.”

Descarbonização completa

“Cada vez mais tem ficado evidente que a agenda climática não é uma agenda do futuro. Lamentavelmente nós temos observado o aumento da frequência e da intensidade dos eventos climáticos extremos.”

“Eu comentei as inundações do Rio Grande do Sul. Mas o ano passado também nós tivemos as queimadas da Amazônia, aquela nuvem de fumaça tóxica que cobriu boa parte do território brasileiro. Por isso que nós não chamamos mais de crise, mas sim de emergência climática. Não é um problema lá da frente. É um problema do aqui e agora.”

Sobre a escala da transformação necessária, Camila é clara: “A evidência científica nos aponta que teremos de alcançar a descarbonização total da economia mundial. Isso significa que todos os setores terão de passar por um processo de descarbonização completa.”

Essas transformações trazem co-benefícios sociais. “Isso significa transformar como locomovemos pessoas e mercadorias, como produzimos, distribuímos e consumimos energia. Fica evidente que esse cenário passa por um aumento do transporte público – do metrô, dos ônibus elétricos – com benefícios: acessibilidade, mobilidade, qualidade do ar e redução de doenças. Nós passamos agora para um momento em que essas agendas tocam mais diretamente em cada um de nós”, conclui Camila Gramkow.

Seminário Pós-COP:  O Brasil diante das transformações globais 

24 de novembro de 2025  (segunda-feira) — 10:00-12:30 e 19:00-21:30 

FESPSP – Rua General Jardim, 522 – Vila Buarque, São Paulo/SP 

Formato: Presencial | Inscrições gratuitas | Vagas limitadas – Inscrições abertas! Garanta sua vaga: https://poscop.org/ 

Sessão da Manhã (10:00-12:30) 

Abertura

Aldo Fornazieri (Professor da FESPSP, Cientista Político) – abertura da sessão 

Painelistas confirmados: 

Alexandre Ramos Coelho (Coordenador do MBA em Geopolítica da Transição Energética, FESPSP) 

Camila Gramkow (Diretora do Escritório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, CEPAL, no Brasil)

Ricardo Abramovay (Professor Sênior, Instituto de Energia e Ambiente, USP)

Gabriel Ferraz Aidar (Superintendente de Planejamento e Pesquisa Econômica, BNDES) 

Sessão da Noite 19:00-21:30

Abertura

Aldo Fornazieri (Professor da FESPSP, Cientista Político) – abertura da sessão 

Painelistas confirmados: 

Luciana Aparecida da Costa (Diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática, BNDES)

Paulo Teixeira (Ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar) 

Juliano Medeiros (Historiador e Professor Convidado da FESPSP) 

Uma parceria DCM + FESPSP para debater o futuro climático do Brasil com rigor acadêmico e compromisso social.
Inscrições: https://poscop.org/