Ao combater juiz de garantia com argumento vulgar, Moro demonstra que é quase analfabeto funcional. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 27 de dezembro de 2019 às 17:57
Moro: quase analfabeto funcional

Se alguém ainda tinha alguma dúvida sobre incapacidade técnica de Sergio Moro para assumir uma cadeira do Supremo Tribunal Federal (STF), agora não tem mais. O ex-juiz postou no Twitter um texto que revela não só a falta de conhecimento jurídico como a dificuldade que ele tem de interpretar textos e de racionar abstratamente.

Sem exagero, Moro é quase um analfabeto funcional.

Segue o texto que ele postou, a propósito da lei que instituiu o juiz de garantias:

“Leio na lei de criação do juiz de garantias que, nas comarcas com um juiz apenas (40 por cento do total), será feito um ‘rodízio de magistrados’ para resolver a necessidade de outro juiz. Para mim, é um mistério o que esse ‘rodízio’ significa.Tenho dúvidas se alguém sabe a resposta.”

O advogado Augusto de Arruda Botelho, que atuou na Lava Jato, deu uma resposta, cruel. “Vou desenhar: comarca X tem apenas um juiz. Comarca Y, vizinha da X, tem também apenas um juiz. Nos processos do Juiz da X, o da Y será o juiz das garantias e, nos processos do juiz da Y, o das garantias será o da X”, disse.

O criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, em entrevista ao DCM, afirmou que Moro demonstrou não ter saber jurídico para ocupar uma vaga no STF.

“Esta opinião do Moro é uma opinião atrasada, de quem não quer viabilizar um grande avanço processual, uma mudança no processo penal brasileiro. O argumento dele é vulgar, o argumento da falta de condições do Estado. Em primeiro lugar, é verdade que 40% das comarcas brasileiras só têm um juiz. Agora são comarcas pequenas, que representam um percentual muito pequeno dos processos no Brasil. Mas, ainda assim, o Estado tem a obrigação de viabilizar. Você não pode impedir um avanço processual, uma modernização processual. Nós estamos fazendo um tipo de estrutura jurídica que existe em todos os países do mundo pelo simples fato do Estado alegar sua inapetência econômica”, afirmou.

Diante da alegação da falta de condições orçamentárias para implantar o novo sistema, que evita que o juiz de instrução se contamine com a investigação, Kakay lembra que, recentemente, se gastou muito mais com a manutenção de um privilégio aos magistrados.

“O ministro Luiz Fux deu uma liminar para garantir o auxílio moradia a todos os juízes do Brasil, inclusive para aqueles que têm casa própria na comarca, e não levou a liminar para o pleno porque sabia que a liminar seria derrotada. Essa liminar vigeu durante cinco anos, e o Estado gastou 5 bilhões com juízes. Esses 5 bilhões viabilizariam as hipóteses das comarcas que não têm dois juízes”, observou.

Além disso, lembrou Kakay, muitas delas nem precisariam mesmo de dois juízes. “O advogado Augusto de Arruda Botelho tem toda razão. Em comarcas vizinhas, o juiz de garantia de um pode servir para juiz de instrução do outro”, afirmou.

Kakay teve participação direta na elaboração da nova lei, ao promover reuniões em sua casa, em Brasília, com a maior parte dos deputados da comissão da Câmara que aprimorou os projetos de lei anticrime apresentados por Sergio Moro e pelo hoje ministro Alexandre de Moraes, do STF — na época em que apresentou o projeto, era ministro da Justiça.

Dos 16 membros da comissão, pelo menos nove se encontraram mais de uma vez na casa do criminalista em Brasília, juntamente com outros advogados, que ajudaram na construção jurídica das mudanças introduzidas.

“O projeto foi uma grande vitória do grupo de trabalho da Câmara, que teve um grande apoio do presidente, Rodrigo Maia, que teve a coragem, a ousadia, de levar adiante a proposta”, afirmou.

Para Kakay, Moro está irritado porque seu projeto foi “desidratado”. “Moro está desesperado”, afirmou. “Ele esperava ter pelo menos o poder junto ao presidente da república de vetar esse que era, claramente, o ponto que mais o derrotava. Mas o presidente da república fez uma opção. O Moro é opositor a ele na candidatura a presidente da república. É óbvio que o Moro não será ministro do Supremo. Recentemente, o presidente da república disse que ele teria dificuldade de ter seu nome aprovado no Supremo. Mas não é só isso, não. O Moro sabe que não tem conhecimento jurídico para ser ministro do Supremo. Ele sabe que não tem notório saber jurídico”, analisou.

Então, o que Moro quer?

“Ele tem o direito de querer ser presidente da república. Nisso, faz um jogo legítimo. O que não é legítimo foi ter usado o Judiciário. Não é legítimo ter sido parcial enquanto juiz e, naquele momento em que julgava e mandava prender o principal opositor do Bolsonaro, estava conversando para ser ministro. Isso é um tapa na cara do Judiciário, isso é um escândalo”, comentou.

O deputado Paulo Teixeira, que é advogado e foi um dos membros da comissão que analisou o projeto de lei anticrime, acha que Moro quer criar dificuldades. Na opinião dele, não é difícil assegurar que os brasileiros tenham um julgamento justo com a exigência de um juiz que atue sem se deixar contaminar pela investigação. É assim que funciona, por exemplo, na Itália, que realizou a Operação Mãos Limpas, supostamente a inspiração de Moro para realizar a Lava Jato.

“Os crimes acontecem nas grandes comarcas onde já tem mais de um juiz”, afirmou Paulo Teixeira.

“Nas comarcas menores, o juiz da comarca vizinha pode ser o juiz de garantias. E com o processo eletrônico, acabou esse drama”, finalizou.

Moro quer vender caro a derrota e posar de vítima, tanto dos que estão na oposição a Bolsonaro quanto do próprio Bolsonaro.

O Brasil que pensa não cai nessa falácia, já um ato preparatório de sua campanha. Mas ele tem um aliado forte, o grupo Globo, que publica editoriais que poderiam ter sido escritos pelo próprio Moro, isto é, na hipótese em que ele soubesse escrever.