POR FERNANDO HIDEO LACERDA, advogado criminalista e professor de Direito Processual Penal da Escola Paulista de Direito, mestre e doutorando em Direito Processual Penal pela PUC de SP
A fala do procurador Maurício Gerum no julgamento de Lula no TRF 4 partiu de uma visão maniqueísta, que enxerga o mundo a partir de uma guerra entre os heróis do sistema de justiça aliado à mídia, contra os vilões representados pela defesa e todas as manifestações críticas do mundo acadêmico nacional e internacional.
Não há um jurista sério que defenda os fundamentos jurídicos da sentença. Bem por isso, todas as falas da acusação desviaram o foco para a questão ideológica.
No mundo da pós-verdade patrocinada pelo interesse econômico, importam menos os fatos do que as crenças, preconceitos e convicções.
Diante da inexistência de provas, sustenta-se a hipótese acusatória apenas em contratos rasurados irrelevantes, notícia do jornal O Globo e a palavra de um delator informal.
Aliás, a verdadeira corrupção é extrair declarações de um corréu que negocia delação premissa, mediante o oferecimento de benefícios ilegais referentes à sua liberdade.
Por sua vez, a defesa foi clara ao demonstrar a incompetência do juízo de primeira instância, a suspeição do magistrado (que ficou clara pelo incômodo demonstrado na própria sentença pelo juiz), a falta de correlação entre a hipótese acusatória e a versão apresentada na condenação, o cerceamento de defesa diante da proibição de oitiva de Tacla Duran e a absoluta ausência de provas em um processo que começou com uma apresentação de powerpoint.
Diz-se que “quando Pedro me fala sobre Paulo, sei mais de Pedro que de Paulo”.
É somente nesse sentido que podemos compreender o desfecho da intervenção do procurador da república, ao citar Fiódor Dostoiévski sobre a existência de “homens de bronze”.
Se existe alguém que na contemporaneidade deve se lembrar de que todos os homens são de carne, essa classe é composta pelos membros do sistema de justiça.