Ao noticiar o encontro de Lula com o papa, Globo revogou o artigo 5o. da Constituição. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 13 de fevereiro de 2020 às 22:18

Ao noticiar a visita de Lula ao papa Francisco, o Jornal Nacional, da Rede Globo, revogou o artigo 5o da Constituição, inciso 57. “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, diz o texto constitucional.

Já o  texto que William Bonner leu no noticiário da Globo tem outro sentido: Lula está condenado e só viajou porque “o Supremo Tribunal Federal entendeu que os condenados podem permanecer em liberdade até o esgotamento dos recursos judiciais”. Ou seja, Lula está solto e viajou porque o STF decidiu que no Brasil ainda é necessário cumprir a Constituição.

O texto do Jornal Nacional é puro veneno, a começar pelo tempo dedicado à notícia da visita de Lula ao Vaticano, realizada a convite do Sumo Pontífice: 16 segundos. Já  o texto lido em seguida, para atacar Lula, tem o dobro do tempo. Ou seja, mais importante do que noticiar o encontro do ex-presidente com o líder da Igreja Católica é dizer que Lula deveria estar atrás das grades. Quanto ódio!

“O papa recebeu o ex-presidente Lula hoje em agenda reservada. A Santa Sé não divulgou informações sobre o encontro. Numa rede social, Lula disse que conversou sobre um mundo mais justo e fraterno com o papa Francisco”, noticiou Bonner.

Em seguida, o editorial de Bonner e da Globo:

“Lula não sofre restrições para sair do Brasil. Ele foi condenado à prisão em segunda instância, e está solto porque o Supremo Tribunal Federal entendeu que os condenados podem permanecer em liberdade até o esgotamento dos recursos judiciais. A defesa do ex-presidente conseguiu adiar o depoimento que ele prestaria nesta semana como réu na Operação Zelotes. Lula responde pela suposta venda de uma medida provisória para beneficiar empresas do setor automobilístico. O depoimento foi remarcado para quarta-feira que vem.”

É muita desonestidade jornalística. A Globo poderia informar que a condenação em segunda instância de Lula está sub-júdice, já que o STF ainda não concluiu o julgamento do HC sobre a parcialidade de Sergio Moro, iniciado um ano e dois meses atrás.

Em qualquer lugar civilizado do mundo, um juiz que condena o principal adversário do político para o qual vai trabalhar em seguida é considerado parcial, imprestável como autoridade judiciária.

Para a Globo, no entanto, Lula tinha que estar na cadeia e não sendo recebido pelo papa. O que a emissora fez foi tentar desvalorizar o encontro, tirar a sua importância. Parece despeito, dor de cotovelo. Como pode Lula se encontrar com o papa? “Ele deveria estar preso” é o subtexto, mas o STF insiste em fazer cumprir a Constituição de 1988. E se Lula for absolvido no STF? Ele será um condenado?

A Globo materializou hoje uma preocupação que o papa Francisco externou em junho do ano passado, quando se encontrou com cerca de 100 juízes da América do Sul para discutir direitos sociais. Na ocasião, ele disse que, para “garantir a qualidade institucional dos Estados, é fundamental detectar e neutralizar este tipo de prática [lawfare] que resulta de uma atividade judicial imprópria em combinação com ações de multimídia”. Só faltou citar Sergio Moro e Globo como protagonistas dessa aliança nefasta.

William Bonner e a Globo vão para o inferno.