Ao querer participar de todas as reuniões de Bolsonaro, Mourão na verdade diz outra coisa. Por Carlos Fernandes

Atualizado em 26 de outubro de 2018 às 11:55
Eles

Alguém já disse que está nas entrelinhas a grande verdade de nossos pensamentos.

Assim ocorre com a declaração do general Mourão ao querer afirmar-se como, se eleito, um vice-presidente atuante.

No palco, a cena é para distanciar-se do personagem folclórico de “vice decorativo” eternizado pelo atual presidente decorativo, Michel Temer.

A narrativa busca desesperadamente minimizar a condição humilhante de um general linha-dura que se submete ao comando de um capitão arregão.

Numa retórica autopromocional, afirma como que a se justificar:

Eu me vejo como um assessor qualificado do presidente, um homem próximo ali, junto dele, dentro do Planalto, ali do lado dele, nossas salas serão juntas. Não seremos duas figuras distantes, como já aconteceu, um para o lado e o outro para o outro lado. Aquelas reuniões que ocorrem ali, eu estarei presente

Mourão não fala – por razões óbvias – o que de fato se passa nos seus mais íntimos devaneios.

Mas ao afirmar que naquelas “reuniões que ocorrem ali”, ele se fará presente em todas, o que está se manifestando em última análise é o seu instinto de autopreservação para não ser passado para trás.

No meio militar, não é de hoje que se conhece a fama de desonesto, desequilibrado e incompetente que Jair Bolsonaro construiu com tanto afinco.

Nos diversos relatórios militares elaborados por seus superiores desabonando o capitão, um deles é particularmente enfático.

Trata-se de um processo em que foi condenado por unanimidade por três coronéis (cuja decisão foi posteriormente revertida no STM) em que é declarado taxativamente como um homem com “excessiva ambição em realizar-se financeira e economicamente”.

Mourão, que não se faz de rogado, sabe muito bem o que Bolsonaro aprontou nos verões passados.

Querer se fazer presente em tudo que é reunião que o eventual presidente participe é, na melhor e mais remota das hipóteses, garantir que a sua “excessiva ambição” não descambe para processos criminais futuros.

Fora disso, qualquer outra hipótese coloca o general em pé de igualdade com o seu superior de ocasião em matéria de desonestidade.

Entre uma coisa e todas as outras, o que de fato fica claro é que Mourão tem todos os motivos para não confiar em Bolsonaro um segundo que seja.

Desajustes mútuos à parte, justiça seja feita, nesse ponto o general está certíssimo.