Após o fim da aposentadoria, o que vem pela frente é a redução da salário mínimo. Por José Cássio

Atualizado em 28 de maio de 2019 às 14:30
General Heleno na Globo News: visão de curto prazo em comum acordo com a imprensa amiga (Imagem: reprodução YouTube)

Na semana passada foi o ministro da Economia, Paulo Guedes.

Com a cumplicidade da imprensa amiga, blefou que iria embora do país caso a privatização da Previdência não passasse nos termos propostos por ele, com o fim do modelo de captação “solidária” contido no capítulo da seguridade social da Constituição para o de “capitalização” como querem os bancos.

Nesta terça, quem aparece tocando o terror é o ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, Augusto Heleno.

Em entrevista ao Valor, ele anuncia o caos caso o país não consiga acabar com a aposentadoria do trabalhador.

E usa a Venezuela na figura do espantalho.

“Teremos subida violenta do dólar, queda abrupta das ações das empresas brasileiras, desabastecimento”, diz o velho general. “Vamos disputar arroz no tapa, vamos disputar feijão no tapa”.

Não senti na pele o horror da repressão militar, mas até onde a memória alcança nenhum período da história brasileira foi tão escabroso quanto o atual.

Acumpliciados com uma mídia sem projeto a médio e longo prazos, preocupada apenas em abocanhar recursos públicos para retardar uma inevitável morte anunciada, autoridades vão a público justificar um massacre contra a parcela mais sensível da população e nem se dão ao trabalho de usar argumentos menos esdrúxulos.

Foi assim no impeachment de Dilma, quando se dizia que bastava tirar a petista do Planalto para o país nadar no mar da prosperidade, foi assim no corte dos direitos trabalhistas durante o período Temer, quando se argumentava que os empregos iriam surgir como num passe de mágica, e está sendo assim agora, no momento em que o povo faz fila para pegar o seu passaporte para a miséria.

Há quem defenda que Jair Bolsonaro, por ser um desclassificado de má índole, violento e ligado a milicianos, não pode continuar no comando do país.

Por essa tese, conspiratória ou não, após a aprovação do fim da aposentadoria, o Brasil mergulharia numa espécie de parlamentarismo branco ou simplesmente iria buscar num novo processo de impedimento a solução para que a continuidade do processo passe para o comando de Hamilton Mourão.

Não vejo vantagem nisso, com a diferença de que o vice é um tanto mais polido que o capitão nas suas declarações.

O que está em jogo no país, independentemente do mandatário de plantão, é uma agenda de retirada de direitos e de entrega dos interesses nacionais ao setor privado.

Portanto, seja quem for, após a quebra do conceito de solidariedade contido no capítulo da seguridade social da aposentadoria, e já tendo iniciado o desmonte das leis trabalhistas, o próximo passo é reduzir o valor do salário mínimo, considerado abusivo pelo setor produtivo.

Como disse, não vivi o horror da ditadura, mas já dava duro no batente durante os dois mandatos do tucano Fernando Henrique.

Entre outras coisas, ele sempre dizia que seu objetivo era que o país pudesse alcançar um salário mínimo na casa dos 100 dólares, ou R$ 410 no dinheiro de hoje.

Não conseguiu entregar a promessa e jamais perdoou Lula por ter tido a ousadia de levar o valor a um patamar, nos melhores tempos, de até 360 dólares.

Lula pagou o preço do enfrentamento e agora quem vai levar no lombo é novamente a população.

O grande poder se reencontrou e se fortaleceu no entorno de uma agenda sócio-política e o resultado inevitável será o empobrecimento gradativo do país, com cada vez mais concentração de renda na mão de pequenos grupos.

De certo modo, o general Heleno está correto ao relacionar o futuro do país com a Venezuela.

Ele só erra no período da comparação: estamos mais próximos da Venezuela opressiva e elitista dos tempos em que a população era mais castigada pela pobreza e, especialmente, pela desigualdade.