“Armas não matam pessoas — americanos matam”: Michael Moore e o novo assassinato em massa nos EUA

Atualizado em 26 de maio de 2014 às 10:30
Elliot Rodger
Elliot Rodger

 

 

O dia de fúria de Elliot Rodger é mais uma cena típica de uma tragédia americana. Aos 22 anos, ele matou seis pessoas perto do campus da Universidade da California, na bonita Santa Barbara, e feriu mais sete. Morreu em seguida, perseguido pela polícia, com um tiro na cabeça, aparentemente suicídio.

Elliot planejou o massacre. As três primeiras vítimas foram esqueadas. Horas antes, postou um vídeo horripilante no YouTube chamado “Retribution”, em que detalha seu plano. Fala em “punir as mulheres” pelo que elas lhe fizeram.

“A faculdade é o momento em que todos experimentam coisas como sexo, diversão e prazer”, diz. “Mas naqueles anos eu tive que apodrecer na solidão. Não é justo. Vocês, garotas, nunca se sentiram atraídas por mim.”

Elliot estava sendo tratado por vários terapeutas. Deixou muitas pegadas na web. Fazia parte de um fórum chamado PuaHate.com, que se dedica a detectar fraudes em “técnicas utilizadas por gurus de sedução”. Um mês antes do ocorrido, a polícia o procurou, por insistência de sua família. Oficiais conversaram com ele e não viram nada errado. Elliot teria dito a amigos que, se os policiais tivessem realizado uma busca em seu quarto, encontrariam suas armas.

Escreveu um manifesto de 141 páginas, uma espécie de nota de suicida transformada em autobiografia, explicitamente misógino. O nome era “Meu Mundo Distorcido”. Seu pai era o diretor de cinema Peter Rodger, assistente do blockbuster “Jogos Vorazes”. Foi quem primeiro o identificou para as autoridades.

Esse horror já está se tornando tão comum nos Estados Unidos que até a cobertura da mídia passou a ser menos intensa. Segundo o site especializado shootingtracker.com, houve 365 assassinatos em massa em 2013 — um para cada dia do ano.

O depoimento mais preciso sobre a loucura de Elliot Rodger foi dado pelo cineasta Michael Moore, autor de “Tiros em Columbine”, o documentário ganhador do Oscar que aborda a chacina em uma escola acontecida em 1999.

Moore é um ativista do desarmamento da sociedade americana. “Eu não tenho mais nada a dizer sobre o que é agora parte da vida normal”, escreveu. “Tudo o que eu tinha a falar eu falei há 12 anos”.

Para Moore, enquanto os EUA não admitirem seu problema com a violência e o governo não aprovar leis de porte de armas mais rigorosas, a história está condenada a se repetir indefinidamente.

Eis seu testemunho:

Com o devido respeito àqueles que estão me pedindo para comentar sobre o tiroteio de ontem à noite na UCSB em Isla Vista – Eu não tenho mais nada a dizer sobre o que agora faz parte da vida americana normal. Tudo o que tenho a falar sobre isso eu falei há 12 anos: somos um povo facilmente manipulado pelo medo, que nos leva a colecionar um quarto de bilhão de armas em nossas casas, muitas vezes facilmente acessíveis para jovens, assaltantes, doentes mentais ou qualquer um que se encaixe no momento.

Somos uma nação fundada na violência, aumentamos nossas fronteiras por meio da violência e permitimos que os homens no poder usassem a violência em todo o mundo para promover nossos chamados “interesses (corporativos)”.

A arma, não a águia, é o nosso verdadeiro símbolo nacional. Enquanto alguns países têm um passado mais violento (Alemanha, Japão), mais armas per capita em casa (Canadá), e as crianças na maioria de outros países assistam aos mesmos filmes violentos e joguem os mesmos videogames, ninguém chega perto de matar o número de seus próprios cidadãos em uma base diária como fazemos – e ainda assim nós não nos fazemos essa pergunta simples: “Por que nós?  Por que os EUA??”

Quase todos os nossos fuzilamentos em massa são cometidos por homens brancos com raiva ou perturbados. Nenhum deles é cometido por mulheres. Hmmm, por que isso? Mesmo quando 90% do público americano pede leis de armas mais fortes, o Congresso se recusa – e, então, as pessoas se recusam a removê-los do cargo.

Assim, a responsabilidade recai sobre nós, todos nós. Não vamos aprovar as leis necessárias, mas o mais importante é que não vamos considerar por que isso acontece aqui o tempo todo. Quando a Associação Nacional do Rifle diz: “As armas não matam pessoas – pessoas matam pessoas”, ela está certa até a metade.

Só que eu iria alterar isso para o seguinte: “As armas não matam pessoas – americanos matam pessoas”. Aproveite o resto do seu dia e tenha a certeza de que tudo isso vai acontecer de novo muito em breve.