Artistas exploram o Rio e gravam clipe no estilo ‘We Are The World’ para se promover. Por Donato

Atualizado em 11 de abril de 2018 às 14:07
Artistas gravam versão de “We are the World” pelo Rio (FOTO: FABIO MOTTA/ESTADÃO)

Angariados pelo empresário Roberto Medina, trinta artistas se reuniram na Cidade das Artes para gravar um clipe com a música “Valsa de uma cidade” (de Antônio Maria e Ismael Neto, uma exaltação ao Rio de Janeiro composta em 1954).

Lá estiveram Dinho Ouro Preto, Evandro Mesquita, Fernanda Abreu, Anitta, Andreas Kisser, Toni Belloto, Rogério Flausino, Elba Ramalho, Samuel Rosa, entre outros.

Sentiu o cheiro da brilhantina, leitor?

O propósito é o de ‘resgatar a imagem do Rio’ e foi batizada por Medina como “Rio, Desistir Jamais”. Muitos dos artistas ali já estão confirmados para o próximo Rock in Rio, que é um produto do mesmo empresário.

Anitta é uma delas e disse o seguinte:

“Vocês sabem, nasci na Zona Norte e vivi em bairros mais pobres do Rio. Vi muita coisa por lá, era uma realidade muito próxima. E não é porque minha vida mudou que deixei de manter minha visão sobre a cidade. Mas acredito, de coração, que o Rio pode se recuperar. Depende, mais do que qualquer outra coisa, da vontade dos cariocas (…) Acho que o carioca nesse momento está precisando de esperança, de força e acreditar que as coisas podem ser possíveis, que pode dar certo, acreditar na mudança.”

Qual mudança, Anitta? O fato ‘novo’ foi a intervenção militar que nada mudou até agora, se é que não piorou a situação ao colocar as polícias, as milícias e os bandidos todos em guerra.

A vereadora Marielle Franco (PSOL) foi executada, um colaborador do vereador Marcello Siciliano (PHS) que havia sido ouvido no inquérito que apura o assassinato de Marielle também foi assassinado e o coordenador Especial da Diversidade Sexual da prefeitura carioca foi alvo de um ataque a tiros, só para ficarmos em casos bem recentes.

Depende apenas ‘da vontade dos cariocas’ mudar isso?

Ainda que a situação do Rio não esteja mil maravilhas, aproveitar-se da ‘vitrine’ é a verdadeira intenção. Roberto Medina sabe bem.

“O Rio de Janeiro não está nem entre as cidades mais violentas. Mesmo assim, a imagem que passamos para o restante do Brasil e para o exterior é a pior possível. É claro, vivemos um momento delicado no Rio de Janeiro, mas temos que ter a consciência de que isso vai passar. E é para ajudarmos nesse processo que pensamos nesta iniciativa”, disse ele, demonstrando estar bem informado (no quesito mortes por 100 mil habitantes, o Rio ocupa a vigésima primeira colocação, ou seja, há vinte cidades em pior situação).

E foram nessa linha as declarações dadas pelos artistas caridosos. Todos reconheceram a importância da vitrine.

“O Rio é quase um resumo do Brasil, só que os problemas aqui são amplificados. Os obstáculos são os mesmos: desigualdade, pobreza, violência. A cidade está perto do colapso. Mas acho que o Brasil inteiro consegue se solidarizar. É o nosso cartão postal”, disse Dinho Ouro Preto.

“Viajamos o mundo inteiro com o Sepultura e em todos os lugares onde nos apresentamos as pessoas perguntam sobre o Rio de Janeiro. Não tem jeito, é a cidade mais conhecida do Brasil. Por isso a imagem dela é fundamental para todos que vivem aqui”, declarou Andreas Kisser.

O guitarrista nos últimos dias demonstrou indignação nas redes sociais pela ação de ativistas que jogaram tinta vermelha no prédio da ministra Cármen Lúcia (“Mais um absurdo, como são maus perdedores! É assim que se faz Democracia? Que circo, que atraso pro país, que triste”, postou ele no Twitter), mas nada disse sobre os tiros disparados na caravana de Lula.

Esses artistas estão realmente preocupados com o Rio de Janeiro e seus habitantes ou estão unindo o útil ao agradável?

Já sei o que lerei entre os comentários deste artigo, que toda e qualquer iniciativa é louvável. Concordo.

Mas responda seriamente: alguma chance de um evento como o Rock in Rio rolar nas comunidades e com preços populares para ‘ajudar o Rio’?