As cinco pedradas (erradas) em Felipe Neto. Por Moisés Mendes

Atualizado em 20 de maio de 2020 às 7:34

Publicado originalmente no blog do autor

É bom o debate provocado pela participação de Felipe Neto no Roda Viva. O que aquele cara estava fazendo ali, falando de antifascismo, se não tem expressão política? Não tem?

Tento listar cinco pedradas que se repetem desde ontem e já antecipo que não concordo com nenhuma delas.

NÃO É DA TURMA – As esquerdas, mais do que a direita, gostam de pedir credenciais habilitadoras aos chegados. Porque é bem assim, no grito e de repente, que alguém se diz de esquerda ou adota posturas progressistas. A esquerda gosta de bater nos que considera inautênticos, os que não são da turma. Quem ainda se agarra a esse argumento infantil deve ler o que Tarso Genro já andou escrevendo e que passa, por exemplo, pela crítica das chamadas instâncias de um partido, muitas vezes restritivas a quem olha e chega de fora, ou – como observa Tarso – estaria no “mundo externo inautêntico”. Felipe Neto seria desse mundo, mesmo que não tenha a pretensão de se ligar a partidos. Tarso defende que os partidos sejam espaços acolhedores da inteligência universal. Vamos acolher Felipe.

É UM ARREPENDIDO – A Geni da política hoje é o golpista arrependido. Pode ser o oportunista, claramente identificável (uma Janaína Paschoal), como pode ser o que confessa que se equivocou por ter feito parte de uma turma errada. Felipe Neto admite que era ingênuo e prepotente (e também machista e homófobo na juventude) e que se envergonha de ter apoiado, por imaturidade, o golpe contra Dilma. Na ditadura, alguns nomes disseram coisas parecidas depois do apoio ao 31 de março de 64, entre os quais uns caras chamados Teotônio Vilela, Severo Gomes e Magalhães Pinto. Eram da direita. Hoje, eles seriam acolhidos, como foram nos anos 70 e 80, em qualquer frente pela democracia.

NÃO TEM REPRESENTATIVIDADE – Aqui a acusação é de não ser voz da política institucional, porque não é líder, não foi eleito e não tem nem ligação orgânica com partidos. Não tem história, não tem nada que o sustente como voz orientadora de posturas. Um cientista político escreveu que o Brasil deveria estar ouvindo os partidos e os políticos, como fazem nos Estados Unidos e na Europa, porque esses organizam e expressam sentimentos, demandas e anseios, e não um rapaz avulso como Felipe Neto. Os jovens, disse ele, deveriam ligar-se a partidos, para só então se manifestarem, porque os partidos ainda teriam a hegemonia dessa representação. É exatamente o que não vem funcionando no Brasil.

É UM GURI SEM LIDERANÇA – O que ele estava fazendo lá no Roda Viva, se é apenas um influenciador de internet de 32 anos? Exatamente porque é um dos fenômenos de comunicação do século 21. E por ter construído uma trajetória que, de guri bobo e piadista, como ele mesmo admite, acabou por politizar sua fala. Por ser um influenciador que vira militante, Felipe Neto é uma voz muito mais potente do que a dos líderes estudantis hoje. Ele é quem se comunica com os jovens, agora como pregador antifascista. Não é pouca coisa. É assim no mundo todo. A política tradicional, analógica e envelhecida, deve se render a Felipe Neto, e não o contrário.

É DA TURMA DE LUCIANO HUCK – Não é. Nem da turma de Tabata Amaral, de nenhum desses grupos de jovens financiados por interesses dos ricos liberais. Huck é alguém que tenta levar para a política a ideia de que quase tudo se resolve com altruísmo, com a benemerência dos milionários e com empreendedorismo. Conquistas sociais seriam concessões de gente bondosa como ele. Felipe Neto não se apresenta como pretendente a uma carreira política (e seria legítimo se pretendesse). Ele deixou claro no Roda Viva que não fala de suas ações ditas benemerentes. Sua crítica da meritocracia como ilusão liberal é um bom resumo do que ele pensa. Não vamos pôr Felipe Neto a correr.