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Atenção, eleitor progressista: a hora é de luta, não de choro ou buscar explicação. Por Joaquim de Carvalho

Lula, 72 anos, na luta, preso ou solto: a democracia tem seu custo.

Não faz nem dois dias que deixei o Brasil para uma série de reportagens com Rodrigo Tacla Durán em Madri, e parece uma eternidade.

Quando deixei o Brasil, segunda-feira à tarde, Fernando Haddad era o favorito para vencer as eleições e, do dia para a noite, parece que tudo mudou.

O que se vê na internet é a expressão de medo, receio, cautela, sei lá que nome mais se pode dar a isso, pela parcela já civilizada da sociedade diante do desempenho de Bolsonaro nas pesquisas.

Multiplicam-se os textos em que as os formadores de opinião tentam explicar por que chegamos a este ponto.

É um grave equívoco.

Não é hora de explicações, mas de luta. Não chegamos ainda nem ao primeiro round da disputa, e já tem gente buscando explicações para uma eventual (e difícil) vitória de Bolsonaro.

É perda de tempo.

Bandeiras e tarefas não faltam a quem quer tirar  Brasil do atoleiro e recolocá-lo na trilha do desenvolvimento.

Recuperar o que se perdeu entre 2013 e 2014, quando a oposição (hoje situação, graças ao golpe, repetindo: golpe) decidiu desestabilizar o governo.

É hora de arregaçar as mangas, não de buscar explicações para o desastre que não se consumou.

Não é hora lágrimas, mas do suor da labuta.

Em 1933, quando o nazismo despontava na Alemanha e os Estados Unidos choravam as perdas da crise de 1929, Franklin Rossevelt disse em sua posse:

“A única coisa que devemos temer é o próprio medo”.

A frase é conhecida, mas ela é mais complexa e cabe como uma luva no momento em que vivemos. Disse ele:

“Então, em primeiro lugar, deixem-me declarar minha firme convicção de que a única coisa que temos a temer é o próprio medo – sem nome, sem razão, o terror injustificado que paralisa os esforços necessários para converter a intenção de fugir em vontade de avançar”.

Esta eleição é plebiscitária, já foi dito. No centro da consulta está Lula, mas não apenas ele.

A população está sendo convidada a dizer sim ou não também para uma pauta que, em essência, representa a retirada de direitos como caminho para solucionar a crise.

Quem está fazendo esta proposta?

São os ricos, e é isso que tem de ficar muito claro. Denunciar que patrões estão ameaçando demitir funcionários em caso de derrota de Bolsonaro.

Como se vê, não é apenas uma eleição, mas uma guerra de classes.

Quando mulheres, cheias de razão, gritaram contra o fascismo, no sábado passado, deram um bonito espetáculo.

Escreveram uma bela página na crônica da democracia.

Mas é difícil fazer uma associação do fascismo com comida na mesa, e é exatamente disso que se trata esta e qualquer outra eleição: comida na mesa.

Quando Dilma Rousseff disputava a eleição com Aécio Neves, em 2014, ouvi de um ex-funcionário da fazenda de Roberto Irineu Marinho, em Botelhos, Minas Gerais, a razão de seu voto na candidata do PT:

“Vou votar na Dilma, porque antes só comia arroz e feijão, de vez em quando carne. Agora a gente come carne e tem um refrigerante na mesa. Acho que, se esse moço ganhar, vão tirar o refrigerante da mesa”.

É disso que se trata: o refrigerante e a carne foram retirados da mesa a partir de 2016, e agora querem tirar também o feijão.

Quem são os apoiadores de Bolsonaro? Que carro usam? Que lugares frequentam? Como é o estilo de vida deles?

São pessoas que têm refrigerante de sobra em casa.

É hora de mostrar os dois projetos na sua essência.

É hora de dialogar com o eleitor, não de teorizar sobre projetos. E mostrar ao pobre que vota em Bolsonaro que ele é como o cão de guarda do bacana.

Late muito, mas nunca vai dormir dentro da casa. Ficará sempre no quintal.

As dificuldades de quem luta ao lado dos mais pobre são sempre maiores, é verdade.

Além dos adversários, tem que enfrentar a imprensa corporativa e também setores do Judiciário e do Ministério Público.

Mas e daí? Não foi sempre assim?

Haddad é Lula, Lula é Haddad.

Querem esconder essa realidade, embaralhar os fatos, impedindo que Lula dê entrevista e embaçando a biografia dele com ações judiciais de boca de urna — leia-se a divulgação da delação de Palocci.

Já que o Supremo Tribunal Federal não permite que Lula dê entrevista, então que cada um faça a defesa de Lula, mostre que, no processo em que foi condenado, não existe prova de crime, sequer a descrição de uma conduta criminosa.

E quem disso? Mais de 100 juristas em dois livros, “Comentários a uma sentença anunciada”, e “Comentários a um acórdão anunciado”.

Cabe aos democratas dizer também que o alvo não é apenas Lula, é o Brasil, entendido o Brasil como uma nação em que cabem todos, não apenas os mais ricos.

É uma guerra de classes que está em pleno curso e cabe a cada um assumir o seu lado, e ir à luta, na busca de votos. Pela democracia. Pelo Brasil.

.x.x.x.

PS: A tropa de Bolsonaro está tão ativa na internet que a transmissão que fiz ao vivo da manifestação das mulheres em São Paulo, no sábado, foi intensamente acompanhada pelos bolsominions, e pela primeira vez, desde que faço transmissão pelo canal do DCM, houve mais deslikes do que likes. Talvez a maioria seja robô, não é possível saber, mas havia muitos comentários agressivos, outros favoráveis a Bolsonaro, possivelmente de pessoas de carne e osso mobilizadas. Isso mostra que estão agindo com estratégia.

É hora do campo progressista se posicionar. E lutar. A busca de explicação fica para depois, se necessário, porque o mais provável é que haja razões para festejar.

Escolher o caminho da barbárie é o mesmo que se atirar num precipício, e não acredito que o brasileiro, majoritariamente, escolherá esse caminho.

Joaquim de Carvalho

Jornalista, com passagem pela Veja, Jornal Nacional, entre outros. joaquimgilfilho@gmail.com

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Joaquim de Carvalho

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