Aumento da repressão policial mostra que PM já encara Era Bolsonaro como salvo conduto. Por Donato

Atualizado em 9 de março de 2019 às 12:13

POR MAURO DONATO

Se 2019 teve um carnaval pleno de vaias e xingamentos contra o (por enquanto) atual presidente, o recrudescimento da repressão policial contra blocos de rua foi sensível.

Piorou tanto que a Defensoria Pública se reuniu ontem para tratar do assunto e pedir apuração dos fatos junto à corregedoria da PM. Há pelo menos dez denúncias protocoladas.

Desde o primeiro dia de desfile dos blocos (no final de semana antecessor ao do carnaval ‘oficial’), a polícia esteve atuando com uma agressividade assustadora.

Foto: Reprodução/ TV Globo

Sob qualquer pretexto, ou mesmo pretexto nenhum, as tropas já chegavam lançando bombas, atirando com balas de borracha, descendo o cassetete e espargindo spray de pimenta, quebrando os instrumentos musicais.

Tudo isso para dispersar, para “restauração da ordem pública”. Nem que termine em morte.

Em São Luiz do Paraitinga uma dessas operações resultou na morte de um adolescente de 16 anos que levou um golpe de cassetete, caiu e bateu a cabeça no chão.

Aliás, só um milagre explica que não tenha ocorrido uma tragédia no bloco Fervo da Lud, no Rio de Janeiro.

Sem uma justificativa menos abstrata até agora que ‘ocorrência de uma briga’, a polícia atacou uma multidão que continha a presença de crianças e idosos.

O pânico poderia ter causado pisoteamento e mortes. O número de feridos foi elevado.

“A polícia deveria promover o diálogo, proteger o folião. Mas parece que somos inimigos”, falou Lira Alli, uma das organizadoras de bloco que esteve presente ontem na reunião da Defensoria que irá solicitar à PM que use megafones primeiramente, antes de chegar atirando feito pelotões de soldados em guerra, além de identificação na farda dos policiais.

Essa reivindicação é recorrente e qualquer ativista sabe o quanto essa determinação é desrespeitada. Foi um policial sem identificação que atirou na atriz Thaís Campos e depois a ameaçou dentro da delegacia.

“Não se aproxima senão você vai tomar um atropelo. Toma distância, mulher. Eu não tenho cerimônia em quebrar a cara de mulher não”, falou o valentão.

Ela estava na calçada e a rua já liberada para o trânsito de carros após o Bloco Agora Vai ter dispersado. O ataque foi gratuito e covarde.

O caso repercutiu e, mesmo sem ver as imagens, o governador João Doria afirmou que a polícia agiu de forma correta.

“A polícia agiu de forma correta e preventiva, sem violência, usando os instrumentos que o protocolo estabelece. Os foliões promoveram arruaças, não queriam sair do local e ameaçaram os policiais. Diante disso, o protocolo indica: dispersão (…) Ninguém se feriu, não houve ninguém machucado. Bala de borracha é pronta resposta em caso de ameaça ou risco (…) Não vi as imagens mas ouvi o que me reportaram pelo Coronel Sales, uma pessoa correta, a informação dele para mim tem valor”.

Após ver as imagens e ser confrontado com a dura realidade de pessoas indefesas, que nada tinham em mãos que pudesse representar ameaça a policial nenhum, após ver que todos estavam na calçada e que outras cinco pessoas ficaram feridas, Doria voltou atrás e seis policiais já foram afastados pelo excesso de violência em ocorrências distintas.

Mas até aí, ele já tinha demonstrado que subverte o ‘in dubio pro reu’.

Impulsionados por um salvo conduto nascido do bolsonarismo (e fomentado por Doria), policiais têm agido de forma violenta sob o rótulo ‘dispersão’.

Há um viés, entretanto. Alguns grupos foram ‘dispersados’ quando entoavam marchinhas críticas a Bolsonaro.

Para não dizer de Geovani Doratiotto, que teve seu braço quebrado quando já dentro das dependências de uma delegacia. Ele trajava uma camiseta com a inscrição ‘Lula Livre’ e, ao que tudo indica, foi esse o crime.

Fatos detestáveis – e simbólicos – do primeiro Carnaval na era BolsoDoria fizeram com que os blocos tenham agendado para o próximo dia 16 um desfile-protesto contra a repressão e truculência policial.