A colunista foi corajosa ao assumir sua homossexualidade sem proselitismo.

Na semana passada, a colunista da Folha Barbara Gancia saiu do armário. Foi num artigo sobre a renúncia do papa. “Do jeito que esses senhores colocam, ou bem se é católico ou se é humano”, escreveu. “Bem, pessoalmente, opto por ser fiel a mim, da forma mais digna e transparente possível, caminhando no sentido contrário das farsas, da impostura e das trevas que me foram impostas pela herança de uma educação católica. O que significa impedir que esses malucos de batina queiram me afastar de Cristo sentenciando que minha homossexualidade não se encaixa no conceito que eles fazem de amor”.
Você pode dizer: eu já sabia. Ok. Mas o fato de Barbara se abrir desta maneira é um avanço. E o fato de isso não virar uma revolução é outro. Barbara comentou sobre sua sexualidade de uma maneira clara e sensível, sem se martirizar ou transformar essa revelação num factoide. Fez diferença na argumentação? Sim. Ela tinha a obrigação moral, como figura conhecida, de assumir? Não. Embora hoje não exista mais privacidade, o que ela faz em casa continua não sendo da conta de ninguém, a menos que você acredite no capítulo 487, versículo 7463 do Livro de Miguelito, que diz que toda pessoa que gosta de cupcake arderá no inferno.
Barbara dá um recado importante ao comentar o tema com naturalidade. Como no caso de Jodie Foster, que saiu do armário de maneira elegante no Globo de Ouro, ela deve ser julgada por sua obra. Nada além disso interessa (a não ser no submundo da fofoca, que é onde se arrastam as almas penadas de subjornalistas como a que “insinuou” que Rafinha Bastos é gay).
O Brasil ainda tem poucos exemplos de gente famosa que saiu do armário. Cauby Peixoto morrerá dizendo que gosta de mulheres. É direito dele. Só é bobo e inútil porque ninguém leva a sério. Ao embutir a confissão sobre sua sexualidade num texto sobre religião, Barbara não está fazendo proselitismo. Ela mesma disse para a ombudsman da Folha, Suzana Singer, que não quer ter apenas essa dimensão. “Tenho outros defeitos”, afirmou.
Recentemente, um amigo me contou que a filha, recém-saída da adolescência, é homossexual. Ele estava tendo algumas conversas com ela. Não para convencê-la a mudar de ideia — o que, de resto, não daria em nada –, mas que ficasse tranquila porque ele estava tranquilo. Ajudaria a menina se uma das 97 cantoras gays de MPB assumissem? Talvez. Mas a maior preocupação de pai e filha, na verdade, era outra: que ela passasse na faculdade e pudesse seguir com o plano de virar veterinária. Enfim, como todo pai, que ela fosse feliz e que ele a apoiaria diante das forças do mal, se elas aparecerem. E vida que segue.