
O Comando Vermelho se espalhou por quase todo o país, mas não conseguiu penetrar no Rio Grande do Sul. Especialistas explicam que o estado desenvolveu um “ecossistema criminal próprio” antes da expansão nacional da facção. Nos anos 1990 e 2000, grupos locais já controlavam comunidades e prisões, especialmente o antigo Presídio Central de Porto Alegre, o que fechou espaço para a entrada de organizações externas.
Segundo o professor Rodrigo Azevedo, ouvido pelo g1, esses grupos surgiram e se estruturaram antes do avanço nacional do CV, ocupando de forma autônoma territórios e redes de financiamento do crime. O enraizamento precoce garantiu às facções gaúchas a capacidade de dominar seus mercados ilegais sem depender de poder paralelo vindo de outros estados.
O juiz Sidinei Brzuska observa que, nos últimos anos, ocorreu um processo de interiorização: facções gaúchas deixaram de disputar só pontos de tráfico em Porto Alegre e avançaram para cidades médias, ampliando sua base territorial. Essa expansão consolidou o domínio local e eliminou qualquer “vácuo de poder” que pudesse ser ocupado por grupos como o Comando Vermelho.
Outro fator determinante é o grande número de facções ativas no estado. O RS já chegou a ter mais de dez grupos criminosos locais, criando um ambiente extremamente competitivo. Para Azevedo, essa multiplicidade impede que uma organização nacional consiga impor hegemonia, já que cada facção atua em nichos próprios e com redes independentes de proteção.

A identidade cultural também pesa. O jornalista Renato Dornelles afirma que existe uma espécie de pacto informal entre as facções gaúchas para não ceder terreno a grupos de fora, algo reforçado por uma forte tradição regional. Brzuska concorda que traços culturais do estado influenciam até mesmo a lógica interna do crime organizado, fortalecendo a resistência a comandos externos.
Isso não impede, porém, que haja relações comerciais pontuais. O especialista Alberto Kopittke aponta que há parcerias no fornecimento de drogas e interações em rotas de distribuição, mas sem subordinação. Ele reforça que são acordos comerciais, não alianças estruturais, e que o RS não reproduz o modelo de estados onde CV ou PCC se tornam “matrizes” de dinâmicas locais.
Enquanto o Comando Vermelho busca expansão interestadual, as facções gaúchas seguem o caminho oposto: consolidam-se no interior, controlam rotas regionais e evitam visibilidade que atraia confrontos externos.
A Secretaria de Segurança Pública do RS cita ainda características socioculturais, distância das grandes rotas logísticas e ação policial constante como fatores que ajudam a manter o estado sem presença formal do CV.