Bolsa Família ajuda a reduzir em até 55% mortes por Aids em mulheres pobres

Atualizado em 21 de setembro de 2025 às 7:55
Mulher segura o cartão do Bolsa Família. Foto: reprodução

Um estudo realizado pela Fiocruz em parceria com o Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, publicado na revista Nature Human Behaviour, concluiu que o Bolsa Família contribuiu para reduzir a incidência e a mortalidade por Aids entre mulheres pobres no Brasil. Com informações da Folha de S.Paulo.

A pesquisa cruzou informações do Cadastro Único com registros do Ministério da Saúde e analisou dados de 12,3 milhões de mulheres ao longo de nove anos. Entre as beneficiárias, observou-se queda significativa tanto nos novos casos quanto nas mortes relacionadas à doença.

Segundo os resultados, entre as filhas de beneficiárias houve redução de 47% na incidência e de 55% na mortalidade. No caso das mães, a queda foi de 42% nos novos diagnósticos e 43% nos óbitos.

O estudo excluiu da análise situações de transmissão vertical do HIV, ou seja, da mãe para o bebê durante a gestação ou parto, para medir de forma mais precisa o efeito do programa. A diferença em relação às mulheres em situação semelhante, mas que não recebiam o benefício, mostrou que o impacto positivo está diretamente ligado ao Bolsa Família.

Os dados revelam ainda que os efeitos foram ainda mais expressivos entre mulheres em situação de pobreza extrema, pretas ou pardas. Nesse grupo, a redução na incidência da doença foi de 53% e na mortalidade, de 51%.

Para Andrea Ferreira Silva, pesquisadora de políticas públicas e autora do estudo, isso mostra a importância de considerar a “interseccionalidade das vulnerabilidades”. “Essas mulheres são as mais expostas ao Bolsa Família e também as mais vulneráveis ao adoecimento. O programa funcionou como uma proteção adicional para elas”, explicou.

Casos individuais ilustram esse impacto. Um moradora de Camaçari (BA), de 40 anos, descobriu ser portadora do HIV em 2024 e recebe o Bolsa Família desde 2021. Beneficiária e trabalhadora informal, ela enfrenta dificuldades para manter o tratamento sem perder renda. “Estou indo a pé, para economizar no transporte”, contou.

Após a infecção, transmitida pelo ex-marido, precisou se separar e passou a sustentar sozinha três filhos. Para organizações como o Projeto Criança Aids, que acompanha famílias vulneráveis, o benefício é um suporte essencial. “Entendemos que o programa impacta diretamente as pessoas que têm essas condições”, afirmou Adriana Galvão Ferrazini, presidente da ONG.

Ato em São Paulo no Dia Mundial de Luta contra a Aids. Foto: Karime Xavier/Folhapress

O estudo também indica que a escolaridade amplia os efeitos do programa. Entre mães de baixa renda, pretas ou pardas e com maior nível educacional, a incidência caiu 56% e a mortalidade, 55%. Para os pesquisadores, a educação potencializa o uso dos recursos e fortalece a autonomia.

“Quando uma mulher entende que HIV é diferente de Aids e terapia antirretroviral garante qualidade de vida, ela terá mais chance de manter a carga viral indetectável e evitar a progressão da doença”, reforçou Ferrazini.

Segundo o coautor Laio Magno, doutor em Saúde Pública, a queda nos índices pode ser explicada não apenas pela transferência de renda, mas também pelas condicionalidades do programa, como vacinação, pré-natal e acompanhamento em saúde. “O Bolsa Família não é só dinheiro. Ele aproxima as mulheres dos serviços de saúde e isso contribui para o diagnóstico e tratamento precoce”.

Os pesquisadores destacam que, entre mulheres de renda mais alta inscritas no CadÚnico, que em geral não recebiam o benefício, não houve redução significativa dos casos ou mortes por Aids, o que reforça a relação direta entre o programa e os resultados.

A pesquisa também lembra que o Bolsa Família já demonstrou impacto positivo em outras áreas da saúde, como tuberculose, mortalidade infantil e saúde mental. Para Ferrazini, além da função de transferência de renda, o benefício atua como rede de proteção diante da informalidade.

“Quando essas mulheres ou seus filhos adoecem, elas podem passar meses sem conseguir trabalhar. Nesses momentos, é o Bolsa Família que garante a sobrevivência da família”, concluiu.

Augusto de Sousa
Augusto de Sousa, 31 anos. É formado em jornalismo e atua como repórter do DCM desde de 2023. Andreense, apaixonado por futebol, frequentador assíduo de estádios e tem sempre um trocadilho de qualidade duvidosa na ponta da língua.