Bolsonaristas na Paulista acham que a Globo é comunista e Moro é onisciente e onipotente como Olavo. Por José Cássio

Atualizado em 2 de julho de 2019 às 0:29
Sérgio Moro é um herói mítico para aqueles foram às ruas neste domingo

Esse texto só é digno de ser publicado se antes dermos uma informação fundamental para que você possa melhor compreendê-lo: 100 por cento das 31 pessoas com quem conversamos na tarde deste domingo, na avenida Paulista, durante a manifestação, morna, em defesa de Sergio Moro, Jair Bolsonaro, reforma da Previdência, pacote anticrime, etc, entende que a mídia tradicional, Globo acima de todos, é comunista e estava envolvida no projeto do Foro de São Paulo com objetivo de transformar a região do cone Sul da América Latina em um regime semelhante ao da ex-União Soviética.

É o caso, por exemplo, de Luiz Antônio, que foi com a mulher Cristina Vanessa e ficou atento a tudo que se dizia no carro de som do Movimento Brasil Conservador, que tem Olavo de Carvalho entre seus gurus.

Luiz Antônio e Cristina Vanessa são muito convictos sobre o que acreditam

“Foi ele quem nos alertou sobre essa ameaça”, diz Luiz, que garante ter lido um livro de Olavo mas não se lembra mais do título. “Graças a ele o povo abriu os olhos”.

Funcionário de uma firma de segurança, Luiz também defende a reforma da Previdência, acreditando – olha aí a contradição – no discurso da velha mídia, Globo à frente de novo – de que o modelo atual fracassou e que, sem o arrocho, não vai sobrar dinheiro para honrar as aposentadorias em pouco tempo.

Segundo o segurança, a chiadeira de quem é contra o fim da aposentadoria está alicerçada num fato interessante: o brasileiro não sabe poupar.

Perguntei se, juntando o salário dele com a esposa, seria possível separar um pequeno valor que fosse para a velhice.

Diante do olhar estranho de Cristina Vanessa, Luiz desbaratinou. “A reforma é o ideal? Óbvio que não, mas do jeito que está não dá pra ficar”.

Vamos para a próxima.

Comemorando neste domingo 41 anos de casamento com Maria do Carmo, o empresário João Barreto também entende que e reforma é fundamental para que o país retome o caminho do crescimento. Ele é proprietário de duas empresas, uma com seis e outra com algumas dezenas de funcionários.

O casal de empresários Maria do Carmo e Joao Barreto

Diz que só ele sabe o quanto a folha de pagamento pesa nas costas e conta que tem diversos projetos parados justamente pela desconfiança em relação à capacidade de honrar os compromissos se vier a aumentar a despesa com funcionários.

Acredita em Bolsonaro, diz que conheceu Lula pessoalmente e que o grande erro do petista foi se juntar a José Dirceu.

“Fui da UNE”, disse em tom de orgulho. “Conheço o Zé Dirceu desde que ele traiu seus companheiros na ditadura”.

Moro? Um herói para o empresário e a esposa. Vazamentos que revelam a fraude da Lava Jato? Coisa de hacker bandido.

“Ainda que os diálogos sejam reais, não há nada de errado ali. É óbvio que o juiz vai orientar os procuradores, assim como orienta os advogados de defesa. Esse é o papel dele. Lido com isso há 40 anos”.

Então, tá.

Hoje foi dia de almoçar com as crianças no Brazeiro da rua Luís Gois.

Assim que me despedi de Alice e Mateus encostei em Robson Vasconcelos, 37 anos, casado, pai de dois filhos e que trabalha como cabeleireiro em Guarulhos. Seguimos a pé até o metrô. Ele conta que antes de tudo apoia o Brasil.

O cabeleireiro Robson Vasconcelos

Também repete que os vazamentos são criminosos e que é preciso encontrar e punir o hacker que invadiu o celular de Moro, dos procuradores da Lava Jato e outras autoridades.

Conta que votou no Lula, em Dilma, mas a partir do segundo turno de 2014, quando foi de Aécio, decidiu por outro caminho. “Cansei de tanta corrupção. Bolsonaro e as mídias sociais nos libertaram da Globo e da imprensa comunista”.

Reforma da Previdência? Robson está com Paulo Guedes e não abre. “Do jeito que está não dá pra ficar”.

Para não dizer que entoei o samba de uma nota só da estação Brigadeiro, onde desci com o cabeleireiro Robson, até a Consolação, vale destacar a conversa com Carla Cristina, ambulante que estava com o carrinho abarrotado de catuaba, cerveja, vodka barata etc.

Ela conta que as vendas foram fraquíssimas.

“Esse pessoal não gosta de ambulantes”, diz. “Passam e me dizem que o que estou fazendo é proibido. Em dois lugares é assim. Nas manifestações pró-Moro e Bolsonaro e nas proximidades do estádio do Palmeiras”.

– E nas manifestações da CUT?, eu quis saber.

Carla Cristina então abriu o sorriso que, por motivos óbvios, não fotografei.

– Aí é top, hein!

Camisas da seleção e bandeiras não saíram como os vendedores esperavam, talvez pela expectativa de público não ter alcançado o que se esperava.

Bandeiras do Brasil não estavam saindo a R$ 20, segundo Cayman Alonso. Segundo ele, as da comunidade LGBT esgotaram – uma centena – a R$ 40 na semana passada.

“Hoje não foi bom, mas vida que segue”, disse o vendedor.

Vida que segue

Já próximo de mandar esse texto e abrir uma latinha de Skol que ninguém é de ferro, perguntei a João Marins, contador, o que fazia com a camisa do Santos e não da seleção.

“Luto pelo Brasil e honro o país que é meu”, falou, antes de ajoelhar tão logo o carro de som do MBL anunciou o fim da brincadeira e mandou ver o hino nacional.

De fato Globo e seus similares estão fazendo um grande trabalho pelo Brasil: os bolsominons estão com o noticiário na ponta da língua.