Bolsonaristas “passam pano” para golpismo visando 2024, dizem especialistas

Atualizado em 5 de setembro de 2023 às 12:58
Bolsonaro e Ricardo Nunes sorrindo e sentados lado a lado
O ex-presidente Jair Bolsonaro e o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB)

Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) têm sido alvo de críticas por homenageá-lo com títulos honorários e apoiar publicamente em meio a investigações relacionadas aos ataques golpistas e possíveis desvios de joias. Cientistas sociais argumentam que essas atitudes representam uma “passada de pano” para Bolsonaro, minimizando a gravidade dos crimes contra o Estado democrático de Direito.

Nas últimas semanas, Bolsonaro recebeu três títulos de cidadão honorário, concedidos pelas Assembleias Legislativas de Goiás e Minas Gerais, além da Câmara Municipal de Barretos, em São Paulo. Além disso, ele recebeu elogios públicos do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), que agradeceu a atuação do ex-presidente em relação à capital e expressou o desejo de contar com o apoio de Bolsonaro na eleição municipal de 2024.

Cientistas sociais entrevistados pela Folha de S.Paulo explicaram que a reação do eleitorado a essas demonstrações de apoio será crucial, especialmente em uma eleição. Os analistas observaram que, enquanto deputados e vereadores podem conquistar votos apenas de bolsonaristas, os candidatos ao Executivo precisam do apoio da maioria dos eleitores.

“A postura desses políticos que posam ao lado de Bolsonaro, que o homenageiam e que fazem elogios é, para usar o popular, uma passada de pano para golpista”, disse Gustavo Couto, cientista político na entrevista.

Segundo a pesquisa Datafolha mais recente, 68% dos entrevistados afirmam não ter intenção de votar em um candidato indicado por Bolsonaro na eleição paulistana. Portanto, a estratégia de se aproximar do ex-presidente é vista como arriscada.

Para Gabriel Ávila Casalecchi, cientista político da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), políticos do campo bolsonarista tentarão se beneficiar do capital político de Bolsonaro, sobretudo em questões conservadoras, ao mesmo tempo, evitarão abraçar o discurso golpista.

Bolsonaro em Barretos. Foto: Reprodução/Twitter/Planalto

Ele destacou que “a nossa sociedade é majoritariamente conservadora. Só que nem todos os conservadores são autoritários”. Portanto, políticos que buscarem o apoio de Bolsonaro provavelmente rejeitarão o discurso do golpe e negarão que o ex-presidente tenha sido golpista.

Os cientistas sociais alertam que normalizar o golpismo é perigoso, já que ele pode minar as instituições democráticas por meio de um discurso revestido de linguagem democrática. “Se perguntar para o próprio Bolsonaro, analisar as entrevistas que ele deu, ele jamais se coloca como alguém que pretendeu dar um golpe”, disse na Casalecchi.

Já Camila Rocha, cientista política do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), destacou que é importante não confundir conservadorismo com autoritarismo. “Uma coisa é alguém se dizer conservador e defender determinados valores morais; outra é defender golpe de Estado”.

No entanto, a antropóloga Isabela Kalil ressaltou que nenhum político está disposto a dispensar o apoio de Bolsonaro antes de saber o que acontecerá com ele. Ela cita o exemplo do ex-governador de São Paulo, João Doria, que enfrentou consequências negativas após se distanciar de Bolsonaro.

“Foi ruim para ele não só do ponto de vista do cálculo eleitoral em si, pensando que aquele eleitor que votava no Doria deixou de votar porque ele passou a ser visto como um traidor, mas também pela variável dos ataques bolsonaristas, o que não é pouca coisa”, afirmou.

Kalil também argumentou que, internacionalmente, políticos têm adotado uma postura ambígua para equilibrar suas estratégias eleitorais, especialmente considerando os cenários políticos nos Estados Unidos, onde figuras como Donald Trump ainda têm relevância.