Publicado originalmente em Jornalistas pela Democracia:
Por Helena Chagas
Aconteceu do jeitinho que Jair Bolsonaro queria quando, há pouco mais de três meses, demitiu o ministro da Defesa, Fernando Azevedo, e forçou a troca dos comandantes das três Forças. “Bolsonarizada”, agora a cúpula das Forças Armadas atua politicamente a favor do governo, o que seus antecessores, defendendo-as como instituição a serviço do Estado – e não de governos – recusavam-se a fazer. O outro lado da moeda é que os militares passaram a ser vidraça e entraram no alvo de investigações de corrupção.
É essa, mais do que o desejo de defender o presidente, a origem da nota ameaçadora contra o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz, na semana passada. Foi uma reação do ministro Braga Netto, à maré das investigações. As águas já alcançaram as orelhas do ex-secretário executivo da Saúde, coronel Élcio Franco, o pescoço do ex-ministro Eduardo Pazuello e, ao que parece, começam a molhar as canelas do ministro da Defesa – que, como chefe da Casa Civil, coordenou do Planalto as ações relativas à pandemia e à compra de vacinas.
Braga Netto, antes de tudo, está tentando se defender e evitar um desmoralizante depoimento na CPI. Há dúvidas se realmente ele constrangeu os comandantes do Exército, Paulo Sergio, da Aeronáutica, brigadeiro Carlos de Almeida Batista, e da Marinha, almirante Almir Garnier, como se propaga por aqui. Ao menos os dois últimos deram sinais, em entrevistas e posts nas redes, de que apoiam as duras palavras ali colocadas.
Mas é o caso de se indagar como essa “bolsonarização” da cúpula militar, e o consequente estrago na imagem da instituição, estão sendo recebidos pelos demais oficiais da ativa, inclusive do Alto Comando do Exército, que sempre manteve a defesa de posturas profissionais. Há indicações de muita insatisfação e efervescência, que não transparece porque, diferentemente dos outros, estes prezam a disciplina militar de não se manifestar politicamente.
A declaração matinal do vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, de que haverá sim, eleições em 2022, contrariando a ameaça de Bolsonaro na semana passada, foi interpretada por políticos como um bom sinal. Com mais liderança no Exército do que Braga Netto, Mourão teria falado também para dentro – além, obviamente, de fazer o contraponto político previsível que qualquer vice de um presidente tão enfraquecido quanto Bolsonaro faria. Na véspera, pesquisa Datafolha mostrou inversão das preferências populares sobre o impeachment: agora, 54% o apóiam.