Bolsonaro “atira” em Moro, mas não é para matar: quer mutilá-lo. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 23 de janeiro de 2020 às 16:24
Bolsonaro “atira” em Moro, durante uma solenidade. Foto de Gabriela Biló/Agência Estado

A resposta de Jair Bolsonaro ao desempenho de Sergio Moro na entrevista ao Roda Viva da última segunda-feira foi dada hoje.

Ele disse que, caso o governo recrie o Ministério da Segurança Pública, Sergio Moro ficará com a pasta da Justiça.

Ou seja, não terá mais controle da Polícia Federal nem da Polícia Rodoviária Federal. Também não poderá mais falar da redução de índices de criminalidade como se fossem resultados de seu trabalho.

Moro ficará menor.

“Se for criado [o Ministério da Segurança], daí ele [Moro] fica na Justiça. O que era inicialmente. Tanto é que, quando ele foi convidado, não existia ainda essa modulação de fundir com o Ministério da Segurança”, disse Bolsonaro.

“Isso é estudado, estudado com Moro, lógico que o Moro deve ser contra. Estudado com os demais ministros. O Rodrigo Maia [presidente da Câmara] é favorável à criação da Segurança, acredito que a Comissão de Segurança Publica, como trabalhou no passado, também seja favorável. Temos que ver como se comportam esses setores da sociedade para poder melhor decidir”, acrescentou.

O sinal de desprestígio de Moro foi dado ontem, quando Bolsonaro recebeu dezoito secretários estaduais de segurança pública, e o ministro que responde pela área no governo não estava presente.

A desculpa dada pela assessoria do Planalto foi que Moro estava num encontro sobre crimes cibernéticos com representantes do governo dos Estados Unidos.

É o tipo de reunião que poderia ter sido adiada.

A declaração de Bolsonaro hoje confirma a notícia de que Bolsonaro ficou incomodado com algumas das respostas que o ministro da Justiça deu no programa Roda Viva.

Segundo o jornalista Ricardo Noblat,  Bolsonaro “não gostou dos comentários de Moro em relação a três assuntos, pelo menos: juiz de garantias, a demissão do filonazista Roberto Alvim da Secretaria de Cultura e o combate à corrupção.”

Moro criticou a criação da figura do juiz de garantias, destinado a conceder medidas no curso de uma investigação, como quebra de sigilos e até prisões.

O objetivo da lei, sancionada por Bolsonaro, é evitar que o juiz da sentença se deixe contaminar pela investigação. É o que acontece em todos os países civilizados.

No Roda Viva, Moro teria se colocado como o elemento central do combate à corrupção, o que diminui o papel do governo e do próprio Bolsonaro.

Claro que não é só isso.

As manifestações de Moro indicam que ele se apresenta como um elemento à parte do governo.

Como ministro da Justiça, uma das tarefas de Moro é orientar o presidente quanto a sanções e vetos de projetos de lei aprovados pelo Congresso.

No caso do juiz de garantias, se opinou, Moro não foi levado em consideração.

No Instagram, ontem à noite, Rosângela Moro reafirmou a posição do marido, ao comemorar a decisão do plantonista Luiz Fux, que cassou decisão do colega Dias Toffoli, que havia adiado a implantação do juiz de garantias por seis meses.

“WE trust em Fux”, disse ela, repetindo, com erro, a frase do marido que se tornou pública com o escândalo Vaza Jato.

Tudo isso pode ter pesado na nova fritura do ministro da Justiça, é verdade, mas Bolsonaro tem motivo mais forte para desgastá-lo.

Deve saber que essas manifestações do casal Moro indicam mais do que discordância pontual em ações do governo.

Até as emas do Palácio do Alvorada estão cientes de que o ministro da Justiça quer o lugar de Bolsonaro e que trabalha pela candidatura a presidente em 2022.

Como fez com João Doria e Wilson Witzel, Bolsonaro foi para o ataque. Como quer continuar no cargo, não vai deixar florescer candidatura na extrema direita.

Com Moro, no entanto, o ataque não pode ser direto. Demiti-lo pode representar o fim do seu governo, como advertiu o general Agosto Heleno, do GSI, de acordo com o relato de Thaís Oyama no livro “Tormenta”.

Vai esvaziá-lo para que peça demissão ou não tenha nenhuma obra para mostrar.

Moro aceitará a humilhação?