Bolsonaro é a mais grave consequência do golpe contra Dilma, diz Gleisi Hoffmann

Atualizado em 1 de setembro de 2020 às 7:51
Gleisi Hoffmann. Foto: Agência Senado

PUBLICADO NA REDE BRASIL ATUAL

Em debate promovido pela Associação Brasileira de Juízes pela Democracia (ABJD) para marcar os quatro anos do golpe do impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, nesta segunda-feira (31), a deputada federal do Paraná Gleisi Hoffmann, presidenta do PT, destacou a “escalada autoritária” do governo Bolsonaro.

Para a parlamentar, esta é a mais grave consequência da deposição de Dilma. Ela lembrou que Bolsonaro “tem como seu grande ídolo um homem que praticou a tortura, inclusive contra Dilma”. Ela se referia a Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos mais notórios torturadores da ditadura instaurada em 1964 no país.

O impeachment de Dilma, disse Gleisi, foi “uma das coisas mais vergonhosas pelas quais o Brasil passou no período democrático”. “Não foi impeachment, foi golpe mesmo. As pedaladas fiscais (“crime” que motivou o processo) nada mais eram do que a administração corriqueira do caixa da União.” Ela reafirmou que os direitos civis e sociais previstos na Constituição foram “jogados na lata de lixo” a partir do golpe parlamentar cometido em 2016.

Mais cedo, o aniversário do impeachment foi debatido em live promovida pelo Comitê Volta Dilma-RJ, no contexto do #DiaDilma, que contou com programação durante toda esta segunda-feira.

Lutar e resistir

“O momento é de luta e de resistência. Falar de tudo o que aconteceu é importante não só porque não podemos deixar a história ser contada como uma mentira, mas também porque o mandato de Dilma tem muitas questões inspiradoras para o mundo todo”, comentou a ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (2011/2016) Tereza Campello.

Em 31 de agosto de 2016, a então chefe de Estado foi definitivamente afastada do cargo, após votação pelo plenário do Senado, que terminou em 61 votos a favor do impeachment e 20 contrários. O vice-presidente Michel Temer assumiu interinamente o cargo de presidente, em que permaneceu até a posse de Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019. Meses antes, em 17 de abril, o plenário da Câmara aprovou o relatório dando andamento ao processo, por 367 votos favoráveis e 137 contra.

“O Brasil tinha um projeto de desenvolvimento com inclusão”, continuou Tereza. Ela mencionou  o discurso de Dilma dois dias antes da derrota política na Câmara, o qual a primeira presidente mulher da história brasileira denunciou que, por trás da sua derrubada, havia um projeto de país conservador, “a misoginia, o racismo, a homofobia e a perspectiva de vender a Amazônia, o pré-sal, destruir o patrimônio público e nossas empresas”.

Segundo a ex-ministra, o clima de teoria da conspiração – da qual a esquerda era acusada – em torno dos interesses por trás do impeachment foi desmentido pelo processo que se sucedeu e culminou com a eleição de Bolsonaro para a Presidência.

Projetos sociais eliminados

Para Tereza Campello, depois da Vaza Jato e das denúncias de que o consultor político Steve Bannon, que trabalhou para eleger o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, estava por trás do método de disseminar fake news em grande escala, consolidou-se a convicção de que “houve um golpe no Brasil (vindo de) fora do Brasil”. Bannon foi preso no último dia 20.

O projeto de Dilma na área de assistência social e segurança alimentar, por exemplo, destacou a ex-ministra,  foi eliminado do processo de discussão no país.  Segundo ela, é um “escândalo” o corte de 40% da verba da assistência social, o que torna a população pobre desassistida. “Isso está sendo desconsiderado por esse governo fascista de Bolsonaro”, disse Tereza. “Os governos Bolsonaro e Temer atuam à revelia” das necessidades dos municípios, destacou.

De acordo com  a ex-ministra do Desenvolvimento de Dilma, a então presidenta da República implementou inúmeros projetos  nos quais superou em muito as metas previstas. Ela citou, por exemplo, a instalação de cisternas – o governo Lula fez 325 mil dessas cisternas.

Tereza contou que, ao assumir, Dilma propôs fazer outras 750 mil unidades, mais do que dobrar, em quatro anos, o que havia sido feito em oito anos por Lula. “Fizemos mais de 800 mil, 105% da meta.” Ela atribui projetos bem-sucedidos como esse à pressão e participação dos movimentos sociais, que na época eram ouvidos pelo governo, além da ação conjunta com os municípios. “Isso foi extinto”, lamentou.

Pontos centrais

Para o geólogo Guilherme Estrella, ex-diretor de Exploração e Produção da Petrobras, a operação Lava Jato, desencadeada em março de 2014, último ano do primeiro mandato de Dilma, atentou contra a soberania nacional e fazia parte do projeto de tornar os países da América Latina submissos aos interesses norte-americanos. A participação direta do Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ) e agências norte-americanas na construção dos objetivos da Lava Jato está comprovada, observou.

Estrella elencou uma série de pontos centrais em que a força-tarefa atentou contra princípios como a cidadania brasileira, a soberania nacional, a independência do país, a dignidade humana e outros. Contra a cidadania brasileira, porque “a Justiça deve proteger o cidadão e, para isso, existem as leis para que os brasileiros se sintam seguros no seu dia a dia”, disse. “A proteção da cidadania é fundamental em qualquer país.”

O atentado contra a dignidade humana se materializou porque a Lava Jato agiu “fora da lei”, promovendo invasão de domicílios e atos violentos, “manchando indevidamente o nome das pessoas”. Ele lembrou que, este ano, tribunais estão anulando as decisões condenatórias da operação sediada em Curitiba. O processo foi fundamente para a eleição de Jair Bolsonaro, destacou o ex-dirigente da Petrobras.

“Foi eleita uma pessoa desqualificada, como o mundo está vendo, e dá-se início à conclusão do projeto de submissão do Brasil. Começou com a “Ponte para o Futuro (com Michel Temer) e está sendo concluído rapidamente pelo governo eleito sem legitimidade”. Para ele, “o Estado está acabando e a República, sendo destruída”.

Petrobras, a joia da coroa

“A Petrobras foi muito valorizada pelo pré-sal, tinha que ser atingida e assim foi. Com o golpe, começam os ataques à companhia. Neste governo, isso se aprofunda e a Petrobras perde sua razão de ser”, disse Estrella. “A Petrobras que tem aí hoje não é a Petrobras, a da origem, com sua missão  essencial. Isso acabou, ela acabou como empresa. É um fundo de investimento transnacional que não tem nada a ver com o Brasil”, lamentou.

Para ele, a estatal “era a joia da coroa desse projeto sinistro, fantasmagórico, primitivo e anticivilizatório contra o trabalhador brasileiro”. “A morte da Petrobras coroa o projeto destruidor do Brasil. A Lava Jato foi fundamental pra que isso se realizasse”, afirmou.

Também participante do evento #DiaDilma, o geógrafo Brian Mier disse que “os únicos brasileiros beneficiados com o projeto foram os entreguistas e oportunistas que venderam o país para outros interesses”. “Os condutores da Lava Jato estavam nos Estados Unidos toda hora”, destacou.

Para ele, a parceria entre Brasil e órgãos de inteligência dos EUA contou com exercícios de capacitação, em solo norte-americano, dos quais participaram pessoas do Judiciário e da Polícia Federal brasileira. Mier citou um evento em solo americano no qual foi proposta uma parceria entre Brasil e EUA contra a corrupção. Um dos palestrantes foi o ex-juiz Sergio Moro. Segundo o geógrafo, a investigação começaria em Curitiba ou Cuiabá. “E seria o ponto zero dessa investigação conjunta de longo prazo da Lava Jato.”