Bolsonaro e Jefferson vieram da mesma lama: emprego fantasma para Dudu e dinheiro sujo de Furnas. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 22 de abril de 2020 às 12:26

 

Jefferson, Eduardo Bolsonaro e Jair Bolsonaro

Ao trazer o corrupto notório Roberto Jefferson para seu círculo mais próximo, Jair Bolsonaro resgata uma aliança antiga e que foi marcada por atitudes antirrepublicanas, para não dizer criminosas.

Entre 2003 e 2004, um dos filhos de Bolsonaro, Eduardo, ocupou cargo no gabinete da liderança do PTB em Brasília com salário equivalente hoje a 9,8 mil.

O presidente do Partido na época era Roberto Jefferson, que havia atraído o então deputado federal Jair Bolsonaro para o PTB.

Bolsonaro tinha sido filiado ao PPB, atual PP, em cuja liderança Eduardo Bolsonaro também foi lotado, sem que haja evidências de que tenha de fato trabalhado.

Aliás, antes dele, a função no gabinete da Liderança do PPB foi desempenhada por Flávio Bolsonaro, que deixou o cargo para assumir o mandato de deputado estadual no Rio de Janeiro.

O fato de Eduardo ter sido assessor da liderança do partido presidido por Jefferson não, em si, uma irregularidade. Revela a proximidade entre o pai e Roberto Jefferson.

O problema é que há fortes indícios de que Eduardo foi um funcionário fantasma. É que, na mesma época, ele cursava Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro, distante 1,1 mil quilômetros de Brasília.

A função que ocupava, a de assistente técnico de gabinete, exigia sua presença física no Congresso Nacional, conforme as regras da casa, já que tem “por finalidade a prestação de serviços de assessoramento aos órgãos da Casa, em Brasília.”

O veto é expresso: “Desse modo, (os servidores) não possuem a prerrogativa de exercerem suas atividades em outra cidade além da capital federal”.

Em julho do ano passado, a BBC Brasil procurou Eduardo Bolsonaro e ele se fez de desentendido. Dizia não se lembrar de ter ocupado um cargo com salário tão elevado.

O repórter o questionou:

Eduardo Bolsonaro – Dois mil e…?

BBC News Brasil – 2003.

Eduardo Bolsonaro – Tá.

BBC News Brasil – Como é possível isso?

Eduardo Bolsonaro – Ué, você nunca conseguiu trabalhar e estudar ao mesmo tempo na sua vida, não?

BBC News Brasil – Em cidades diferentes?

Eduardo Bolsonaro – Em cidades diferentes?

BBC News Brasil – O senhor era servidor aqui em Brasília e cursava no Rio, não?

Eduardo Bolsonaro – Assumindo alguma atividade partidária… Agora… Em 2003?

BBC News Brasil – Em 2003 e 2004, por 16 meses.

Eduardo Bolsonaro – Olha, eu teria que puxar forte pela memória aqui então… Mas eu acho que não teria problema nenhum, conseguir trabalhar, prestar um serviço partidário. Inclusive eu já tive assessor meu que eu encontrava com ele uma vez por mês no máximo, né? (O assessor) prestava a minha assessoria de maneira local no litoral de São Paulo.

Curioso é que Eduardo Bolsonaro tem dificuldade de se lembrar de um cargo público  que teve por 16 meses, com salário elevado, mas demonstrou excelente memória ao falar de uma suposta função que ocupou nos Estados Unidos, em 2005, a de “fritador de hambúrguer” no Popeye.

Reza a lenda, divulgada por ele, que entre o final de 2004 e o início de 2005, durante as férias da faculdade, fez intercâmbio.

Na imagem que construiu de si, teria custeado o curso e sua manutenção no país estrangeiro com emprego humilde.

Pelo que ganhava com o cabide na Câmara dos Deputados, poderia pagar à vista pelo o intercâmbio.

Segundo os repórteres da BBC apuraram, o curso custava na época o equivalente a pouco mais de um mês de salário.

Bolsonaro e Roberto Jefferson são a expressão do que há de mais velho e podre na política — nepotismo, cabide de emprego, fisiologismo, funcionário fantasma, corrupção —, aliada a uma dose gigantesca de hipocrisia.

Os dois também se encontraram na Lista de Furnas, o documento assinado pelo então diretor de engenharia da estatal, Dimas Toledo, que relaciona os políticos que, em 2002, receberam propina através de caixa 2.

Bolsonaro, contemplado com R$ 50 mil à época, o equivalente a hoje a R$ 260 mil sempre negou que tivesse ficado com esse dinheiro. Fazendo coro com políticos do PSDB, disse que a lista era falsa.

Perícia da Polícia Federal atestou a sua veracidade.

Mas nem precisa. O próprio Jefferson, em depoimento à Polícia Federal, confirmou a existência do caixa 2 e confessou que pegou dinheiro das mãos do próprio Dimas, no escritório de Furnas, na rua Real Grandeza em Botafogo, Rio de Janeiro.

Na época, político mais importante do que Bolsonaro, ficou com R$ 75 mil, o equivalente hoje a R$ 392 mil.

Os dois estão juntos de novo, para fazer o que sempre fizeram: negócios eticamente deploráveis.