Bolsonaro e militares do golpe serão julgados no STM e devem perder patentes; entenda

Atualizado em 26 de novembro de 2025 às 6:24
Almirante Almir Garnier e Jair Bolsonaro, condenados por golpismo. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A condenação no Supremo Tribunal Federal (STF) abriu caminho para um novo escrutínio sobre os militares envolvidos na tentativa de golpe de Estado. Agora, caberá ao Superior Tribunal Militar (STM) decidir se o capitão Jair Bolsonaro, o almirante Almir Garnier Santos e os generais Paulo Sérgio Nogueira, Augusto Heleno e Walter Braga Netto perderão posto e patente, o que seria punição inédita para crimes dessa natureza na história recente do país.

A Constituição prevê a expulsão de oficiais condenados a mais de dois anos de prisão, e por isso o STF não tratou desse ponto nas sessões de setembro, quando impôs as penas de reclusão.

A análise no STM deve ocorrer no primeiro semestre de 2026, após o envio formal da representação pelo Ministério Público Militar (MPM). O procurador-geral militar, Clauro Roberto de Bortolli, tem atuado com rapidez em casos semelhantes, mas o prazo apertado, o recesso do Judiciário começa em 19 de dezembro, pode empurrar a abertura do processo para o início do ano que vem. A presidente do STM, ministra Maria Elizabeth Rocha, será responsável por distribuir a ação entre os ministros.

No despacho de segunda-feira, o ministro Alexandre de Moraes encaminhou formalmente o caso, determinando: “Oficie-se à presidência do Superior Tribunal Militar e à Procuradoria Geral do Ministério Público Militar (…) para decidir sobre a perda do posto e da patente de Jair Messias Bolsonaro”.

Generais Walter Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira. Foto: Reprodução/CNN

A eventual decisão do STM terá peso histórico. Para o historiador Carlos Fico, professor da UFRJ, o momento simboliza uma inflexão na relação das Forças Armadas com a legalidade.

“Ser considerado indigno para o posto e a patente é algo muito grave e simbólico na carreira de um militar. Isso tudo está servindo de alerta para as Forças Armadas de que algo mudou, porque finalmente está havendo julgamento e condenação”, avaliou.

O ministro da Defesa, José Múcio, também destacou que o caso marca o encerramento de um ciclo. “Está se encerrando um ciclo, no qual os CPFs estão sendo responsabilizados e punidos, e as instituições estão sendo preservadas”, afirmou, após evento na Câmara.

Embora o STM já tenha determinado perdas de patente em outras ocasiões, a motivação sempre envolveu fraudes, corrupção ou desvios administrativos, raramente crimes políticos. Para a pesquisadora Martina Spohr, da FGV CPDOC, o impacto simbólico será profundo.

“Existe toda uma estrutura hierárquica, de prestígio, quando a pessoa chega às mais altas patentes. É algo que também será complexo para as Forças. Estamos falando de militares que foram líderes de uma série de momentos da própria instituição, e que teriam suas carreiras descredibilizadas com essa perda de patente”, afirmou, avaliando ser improvável que o STM deixe de impor o revés.

A dimensão militar da tentativa de golpe é ampla: dos 34 denunciados, 23 são integrantes da ativa ou da reserva. E, caso o Supremo mantenha as condenações já impostas ao “núcleo crucial”, os demais núcleos também serão encaminhados ao MPM para análise idêntica no STM.

Historicamente, a responsabilização militar por tentativas de ruptura institucional é exceção no Brasil. A própria condenação no STF quebrou um padrão centenário marcado por anistias, omissões e pela autopercepção das Forças Armadas como “poder moderador”.

Desde a Proclamação da República, ela mesma considerada um golpe, o país conviveu com sucessivas intervenções, insurreições e pressões militares. Da Revolta da Vacina ao tenentismo, passando por episódios envolvendo Getulio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart, culminando no golpe de 1964, a impunidade sempre foi regra.

Augusto de Sousa
Augusto de Sousa, 31 anos. É formado em jornalismo e atua como repórter do DCM desde de 2023. Andreense, apaixonado por futebol, frequentador assíduo de estádios e tem sempre um trocadilho de qualidade duvidosa na ponta da língua.