PUBLICADO NO FACEBOOK DO AUTOR
POR LUIS FELIPE MIGUEL
A lei nº 9.125/1995 determina que o reitor e seu vice “serão nomeados pelo Presidente da República e escolhidos entre professores dos dois níveis mais elevados da carreira ou que possuam título de doutor, cujos nomes figurem em listas tríplices organizadas pelo respectivo colegiado máximo”.
Ou seja: (1) a lei não obriga a escolha do preferido pela comunidade acadêmica; (2) pode haver consulta eleitoral, mas formalmente a definição da lista cabe ao conselho universitário ou órgão similar.
Fernando Henrique, quando presidente, chegou a nomear reitores que não haviam vencido as consultas internas – o caso mais rumoroso foi o da UFRJ, em 1998. Mas os governos petistas nunca abandonaram a praxe de nomear sempre o primeiro colocado, algo natural para um país que, acreditávamos, construía sua democracia e se curvava a princípios republicanos.
Mas os governos do PT não acharam necessário mudar a lei.
Depois do golpe, Temer namorou a ideia de desrespeitar as eleições universitárias. Em várias instituições, a nomeação dos novos reitores foi adiada ao limite, gerando tensões e alimentando boatos. Mas acabaram sendo sempre nomeados os mais votados.
Isso mudou com o atual governo. Há interventores em várias universidades – pessoas claramente rejeitadas pela comunidade. Ganharam o cargo exclusivamente pelo alinhamento com as teses obscurantistas ora no poder.
O nomeado para a UFC, por exemplo, mal alcançou 5% dos votos na consulta (o professor Custódio Almeida, que seria o legítimo reitor, obteve 65% dos votos).
São anti-reitores. Evidentemente terão pouca condição de administrar suas universidades, que se tornaram campo conflagrado. Teme-se que seu objetivo seja, de fato, praticar o desmonte do ensino superior proposto pelo governo e perseguir estudantes, professores e funcionários com posições democratas.
Mas é necessário atentar para o segundo item que destaquei da lei: a lista não sai diretamente da consulta, mas é elaborada pelo conselho universitário ou órgão similar
Na UFPE, isso permitiu que a lei fosse usada de maneira a garantir o respeito à vontade da comunidade universitária.
Houve a votação. Mas o conselho da universidade, responsável legal pela elaboração da lista tríplice, nela não incluiu os candidatos derrotados.
A lista foi composta pelo vencedor e por outros dois nomes que, imagino, foram sugeridos por ele.
Aquele grupinho de docentes ressentidos decidiu impugnar a lista, acusando-a de fraudada. Escolheram um coronel da PM (???) para representá-los e denunciaram a UFPE junto ao Ministério Público e ao MEC.
Pediam expressamente uma intervenção na universidade.
No entanto, a lei estava sendo cumprida.
Num regime democrático, a nomeação do mais bem votado deve ser regra de aplicação quase automática. A possibilidade de nomeação de outros nomes da lista tríplice teria que ser entendida como uma salvaguarda a ser usada em circunstâncias excepcionais – por exemplo, uma universidade controlada por milícias ou indícios fortes de abuso do poder econômico nas eleições internas.
Ao fazer uso político-partidário desta prerrogativa, o governo age formalmente dentro da lei, mas viola seu espírito. O estratagema da UFPE foi no sentido contrário: foi ao limite da letra da lei para garantir que, nas condições adversas que enfrentamos, seu objetivo, o respeito à autonomia universitária, estivesse garantido.
Na última quinta, o professor Alfredo Gomes – o legítimo vencedor da eleição – foi nomeado reitor da UFPE. Os ressentidos e seu coronel ficaram a ver navios.
Se houvesse qualquer brecha para contestar o processo, certamente Weintraub a teria usado.
Esse desfecho mostra que há aí um caminho – dentro da lei vigente – para barrar a investida autoritária nas universidades.