Bonner diz que apresentador do JN não pode opinar sobre massacre no Rio

Atualizado em 1 de novembro de 2025 às 11:24

William Bonner defendeu em entrevista ao Globo que os apresentadores do Jornal Nacional não devem emitir opinião sobre a chacina no Rio de Janeiro, que superou o Carandiru. 

A operação deixou 121 mortos, incluindo quatro policiais. Entre os 117 suspeitos assassinados, 42 estavam foragidos e ao menos 30 não tinham passagem pela polícia. Segundo Bonner, o JN é “humanista e legalista”:

Tem uma discussão antiga em telejornais sobre a diferenciação entre um apresentador neutro e um âncora que emite opiniões. Essa diferença ficou muito marcada quando Boris Casoy fazia comentários sobre as notícias no SBT, nos anos 1990. Mas hoje a gente encontra gente comentando notícias em cada esquina das redes sociais; tem muito jornalista emitindo opinião em todos os cantos. Vocês acham que o Jornal Nacional precisa mudar ou deve manter esse princípio da neutralidade?

CÉSAR TRALLI: Vamos continuar com esse perfil. O Jornal Hoje, que eu fazia até ontem, era diferente. Era um jornal muito maior, com um único apresentador, na hora do almoço, que abria espaço para você trazer assuntos, digamos assim, do cotidiano com muito mais facilidade, com uma linguagem mais coloquial, mais falada. Antes, eu fiz o SP1, que é o telejornal da Grande São Paulo. Eu fazia alguns comentários muito pela conexão com o público. Tinha um perfil de jornal local, e a gente conseguia dar uma amarrada nos assuntos, se colocava ao lado da população local. Eu levei um pouco disso para o Jornal Hoje. Mas eu entendo que o Jornal Nacional é completamente diferente. Para mim, a gente vai seguir firme nesse legado de JN do William, que é um jornal que representa a empresa, é a voz da empresa.

WILLIAM BONNER: O Jornal Nacional é uma instituição tão forte que, no exercício de quase 26 anos de chefia, eu nunca vi os acionistas da empresa agirem como donos do Jornal Nacional. O JN, pela força que tem, por aquilo que representa, é algo tão forte que eu tenho a impressão de que os próprios acionistas da Globo entendem que ele seja um patrimônio dos brasileiros, do público brasileiro. Então, nesse sentido, você não faz o que quiser com o Jornal Nacional. Ele é muito grande para isso. Você não personifica a apresentação.

O comentário é uma armadilha num jornal desse porte. Como escolher quais assuntos você vai comentar e quais não vai? Imagina se a gente fizesse no Jornal Nacional comentários sobre a operação policial desta semana. O Jornal Nacional é um jornal legalista, como eu acho que o jornalismo tem que ser: humanista e legalista. Se a gente for fazer comentários no Jornal Nacional, estaremos impondo a milhões de brasileiros uma certa opinião, e nós achamos que esse não é o nosso papel. Ao contrário, o nosso papel é municiar o espectador de opiniões de pessoas que estudam o caso, que têm visões sobre aquilo — e aí ele forma sua própria opinião. E isso não é uma teoria minha; eu herdei isso no JN. É a missão histórica do jornal.

Mas não houve exceções, como na pandemia da Covid-19?

BONNER: Sim, sim. Mas aí, nessas ocasiões, o Jornal Nacional publicou editoriais. E esses editoriais manifestavam a posição do Grupo Globo a respeito dos assuntos ali abordados — seja na condenação veemente do negacionismo à pandemia, seja na condenação à demonização de vacinas, seja na condenação à divulgação de informações que podiam ser profundamente nocivas para a sociedade brasileira. E, por fim, preciso citar também a condenação de tentativas de se romper a normalidade de uma democracia constitucional como a nossa. Eu me lembro de uma frase de um desses editoriais que afirmava o seguinte: “Quando o que está em jogo é o acesso ao direito da população à saúde e à democracia, não existem dois lados”.