
Com 32% de intenção de votos no Datafolha, o deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) lidera a corrida para a prefeitura de São Paulo. Em entrevista recente à Folha de S.Paulo, o líder do MTST chamou o atual prefeito Ricardo Nunes (MDB-SP) de “novo Celso Pitta” com “esquemas de corrupção” na capital paulistana.
Boulos concedeu uma entrevista ao programa DCM Ao Meio-Dia. Falou sobre o “vexatório” Plano Diretor de Nunes, acusações de irregularidades na operação tapa-buracos e o trabalho do padre Júlio Lancellotti com a população de rua – que ele pretende incorporar na gestão municipal se vencer as eleições.
Também respondeu sobre as especulações envolvendo a deputada Tabata Amaral (PSB-SP) e se ela pode ser sua vice.
Confira os principais trechos.
Aumento de edifícios e de carros: “Não tem como dar certo”
Em todo centro expandido de São Paulo temos visto várias torres se erguerem, aumentando a densidade populacional das regiões, aumentando o número de automóveis individuais das regiões sem condições de aumentar a estrutura viária.
E aí é louco. A gente não precisa ser engenheiro profissional ou profissional de urbanismo ou de planejamento urbano para entender qual é o resultado disso. Não tem como isso dar certo.
Você pode verticalizar até um certo limite nas regiões, compensando isso com melhora da infraestrutura e não só viária e melhoria no metrô, no transporte público.
Sem planejamento, a mudança gera saturação. Acho que é visível que a cidade de São Paulo já está atingindo esse limite em várias regiões.
Boulos comenta o novo Plano Diretor de Nunes: “vexatório”
Mudança no Plano Diretor do Ricardo Nunes é algo vexatório. É um ataque inclusive contra o futuro da cidade. Quando você amplia a área em que se pode fazer novos empreendimentos imobiliários, altamente verticalizados de 15 até 20 andares, isso afeta os miolos dos bairros.
É o que já está acontecendo em Perdizes, na Vila Mariana Quem, em Pinheiros. Quem mora em várias regiões da cidade está vendo as suas ruas se transformarem em canteiro de obra no pior sentido possível.
Pegam uma pequena rua do bairro para demolir oito casas, 10 casas, e construir dois prédios. Vamos supor que você tivesse 20 carros, dois carros por família. Vamos pensar num prédio mais alto. Estamos falando de 60 famílias morando. Cada uma com dois carros.
Isso não é distópico. Daqui a pouco as pessoas vão começar a ter trânsito para sair da vaga na garagem do prédio. É preciso enfrentar isso.
Só interessa isso a determinadas grandes construtoras. Isso não interessa à cidade. Não é colocar limitação ao desenvolvimento da cidade. E sim fazer uma regulação urbana, como o mundo inteiro faz.
E colocar limites na infraestrutura pública. O plano inicial aprovado em 2014, pelo Haddad, era para estimular os eixos estruturantes. Era para estimular o uso de transporte público.
Agora se está fazendo o contrário, ampliando vagas de garagem. Estão estimulando o uso de transporte privado, quando se faz esse tipo de imóvel numa distância maior do metrô e dos corredores de ônibus.
Está tudo errado nessa revisão do plano. Se eu tiver oportunidade, ano que vem, farei um debate sobre a cidade. Farei se for eleito prefeito de São Paulo.
Nós vamos colocar isso na mesa porque não tem cabimento. Isso é uma piora da qualidade de vida de todo mundo que mora na cidade.
E, com uma mentira que eles inventaram de que a “habitação de interesse social”, esses prédios que estão sendo erguidos no centro expandido. É mentira a categorização de habitação de interesse social.
Você não está combatendo a desigualdade. É só um setor econômico determinado que está ganhando com isso às custas do futuro da cidade de São Paulo.
As suspeitas de irregularidades de Ricardo Nunes com o asfalto
Quero parabenizar o DCM pela matéria jornalística. Acho que é importantíssimo que a população tenha a oportunidade de ver o que que está por trás desse programa de recapeamento do Ricardo Nunes.
A única coisa que o prefeito está mostrando em propaganda é que ele está fazendo o maior programa de recapeamento da cidade. Recapeamento não deveria ser motivo de propaganda. Recapeamento é obrigação de qualquer prefeito.
Nunes deixou a cidade abandonada por três anos. Há um ano, ele faz obra para todo lado, como o Maluf. Ele conta com a falta de memória das pessoas. Mas isso não cola mais.
Já faz tempo que isso não cola.
Quando Ricardo Nunes faz alguma coisa, no caso do asfalto, eu acho que é emblemático. Ele faz mal feito e de uma maneira suspeita.
Porque 75% de todo o asfaltamento está nas grandes avenidas e nas marginais. Estão nos dados oficiais.
Tenho ouvido de muitos moradores de São Paulo que uma avenida estava em boas condições, não tinha nenhum buraco, e chegou uma máquina que quebrou tudo.
Está acontecendo na cidade inteira, enquanto que, no miolo do bairro, tem buraco que está fazendo aniversário.
Além de fazer tudo de maneira suspeita, o DCM mostrou indícios de superfaturamento. É preciso chamar as coisas pelo nome. O Tribunal de Contas do Município fez um alerta para prefeitura dizendo que o asfalto está 8% mais caro. Porque a gestão Nunes tinha aumentado o preço do asfalto quando o petróleo subiu. Depois que o petróleo baixou, ninguém baixou o preço.
E aí a prefeitura estava pagando esse monte de recapeamento na cidade com preço de 8% a mais, que pode significar R$ 100 milhões a mais para essas empresas.
Está errado.
Tem que ser investigado e eu acho que isso é um retrato da gestão atual em São Paulo. Quando se faz alguma coisa pela cidade, é sempre de uma forma torta.
Faz sempre cheio de suspeitas de esquema. A matéria do DCM mostrou com clareza.
“Benevolência excessiva dos grandes jornais de SP com o prefeito”
Quando Nunes faz alguma coisa, aparece só esquema. É impressionante. E acho que existe uma benevolência excessiva de grandes órgãos de imprensa, dos grandes jornais de São Paulo, em relação ao prefeito.
Teve até esquema de cemitérios e de serviço funerário. Alguém viu uma matéria nos grandes jornais?
Para ser justo, quem fez isso foi o SPTV da Globo, a mídia televisiva, além dos blogs de esquerda.
Nada nos grandes jornais de São Paulo. Eles não têm feito. Isso é triste e desinformativo.
Acolher a população de rua e dar emprego, inspirado pelo padre Júlio
Não tenho a menor dúvida que o Padre Júlio Lancellotti faz muito mais do que a prefeitura de São Paulo hoje. É vergonhosa a atuação de Nunes com a população em situação de rua.
Nós temos o maior caixa da história da cidade: R$ 36 bilhões. O maior orçamento da história da cidade, chegando a R$ 110 bi por ano.
E temos a maior população e situação de rua: 53 mil pessoas jogadas na cidade.
Padre Júlio tem um trabalho que não é de hoje. É um trabalho profundo de humanidade e de uma solidariedade de se colocar no lugar daquelas pessoas que estão vivendo o abandono o sofrimento mais profundo.
Elas estão jogadas nas ruas. Padre faz isso não só no ponto de vista da caridade, mas do ponto de vista de pensar e de cobrar políticas públicas. Quando eu construí meu programa para moradia popular, na época que disputei a Prefeitura de São Paulo há três anos, fui dialogar com padre Júlio.
Foi daí surgiu a proposta de um atendimento para população e situação de rua, atendendo com dignidade. Não é maltratar com marmita azeda e cheia de percevejo. Precisa ter um acolhimento em espaços com assistente social, com psicólogo.
É uma demanda histórica do padre Júlio existir esse acolhimento emergencial.
Imagine você pegar as pessoas que estão na rua e avisar que a Prefeitura de São Paulo vai te pagar um salário mínimo para você atuar numa frente de trabalho para melhorar a praça que virou matagal. Assim será dada uma oportunidade para uma pessoa reconstruir a sua vida.
Ao mesmo tempo, você estará melhorando a cidade toda. Queremos levar essa discussão novamente nessa nova pré-campanha em São Paulo.
A discussão de segurança na cidade de São Paulo
Temos que ter a firmeza e a responsabilidade de dizer que segurança pública é uma responsabilidade constitucional do governo do estado. Quem deve apresentar um plano é o governo de São Paulo, que detém o controle sobre a polícia civil e a polícia militar, sobre a polícia científica.
Esse tem que ser um ponto de partida, porque senão a gente fica numa demagogia no debate municipal sobre segurança pública.
Dito isso, não quer dizer que o município não tenha iniciativas que possa tomar em relação à segurança pública. Eu te daria pelo menos três.
Primeiro você precisa equipar e reorganizar a guarda municipal. Essa guarda municipal de São Paulo contém um efetivo menor do que a do Rio de Janeiro. E esse efetivo ele tem que estar destinado para as escolas municipais. Faria isso para garantir a segurança dos adolescentes, dos jovens e das crianças. Esse efetivo tem que estar focado nas regiões mais problemáticas da cidade, que tem incidência de criminalidade.
Em segundo lugar, é necessário uma melhora da digitalização e do monitoramento na cidade, não como o atual prefeito quis fazer. Ele colocou um esquema quase racista, eugenista, de reconhecimento facial.
Precisamos ter a capacidade de monitorar os crimes violentos para poder preveni-los e combatê-los. Hoje as cidades do mundo todo estão fazendo essa discussão.
E você tem um terceiro elemento que é preventivo, que é o município atuar desde questões básicas como melhorar a iluminação pública. Porque já há dados que mostram que, onde não há iluminação pública, existe a maior incidência de crimes.
Precisamos de uma atuação mais forte em relação ao combate à violência contra a mulher. O município precisa fortalecer a Patrulha Guardiã Maria da Penha nas guardas municipais. Tem o exemplo de Diadema.
Bogotá era a cidade mais violenta da América Latina. Teve três gestões que fizeram um investimento social pesadíssimo urbanização de favela, regularização de centros para a juventude e para a melhora da cidade como um todo.
Sabe qual foi o resultado depois de 12 anos? O resultado foi que Bogotá se tornou uma das cidades menos violentas da América Latina, com redução em quatro vezes no índice de crimes violentos. Temos que olhar essas experiências também.
O abismo social que a gente tem de São Paulo. Não dá para a gente imaginar que São Paulo vai ter o ambiente civilizatório da Noruega ou da Dinamarca enquanto Cidade Tiradentes tiver a expectativa de vida de 60 anos.
E quem mora no Jardim tem expectativa de vida de 80 anos. Você anda 10 quilômetros para zona sul. No Jardim Ângela, no fundão da M’Boi Mirim tem o IDH do Congo. 10 quilômetros para cima, em Moema, temos o IDH da Suécia.
Com esse nível de abismo social, você vai ter uma sociedade mais miserável.
O combate à desigualdade junto com medidas de prevenção de segurança pública de fortalecimento de guarda é o caminho do que o município pode atuar para melhorar a segurança.
Isso tem que estar integrado e cobrando do governo do estado uma atuação com inteligência na Cracolândia.
Como é que a droga chega lá? Como é que o crack chega lá? Ele não nasce ali na estação da Luz. Chega lá de algum jeito.
Não é possível que você não tenha uma operação de inteligência da Polícia Civil para combater o crime organizado que leva o crack até lá.
“Resgatar a cidade de São Paulo para o povo”
Tenho respeito pela deputada Tabata Amaral, pela sua trajetória e atuação. Só que existe um acordo, um compromisso, de que minha chapa vai ser composta por alguém indicado pelo PT.
Esse é o acordo político. E também não estamos no debate de vice neste momento. Não é o melhor momento para discutir isso e esse é o momento para a gente dialogar com a cidade. Começar a construir um programa de governo e conversar com vários setores em São Paulo.
Acho muito engraçado. Outro dia me falaram: “o Boulos está conversando com o empresário”. “O Boulos foi conversar com a associação comercial”. Se a gente não dialoga com ninguém, essas mesmas pessoas falam que o Boulos “é muito radical”, “é muito extremista”.
“Até gosto dele, mas não vai ter condição de ganhar”. Aí a gente tenta ampliar o leque de diálogo para neutralizar a rejeição e a resistência de alguns setores para buscar construir composições, outros setores vão falar: “que feio, o Boulos”.
Política não é conversar com quem pensa igual a você. Não é seita. Na política você é levado pelas circunstâncias e pela correlação de forças para conversar com quem pensa diferente de você no ambiente democrático.
Neste momento eu estou muito focado em conversar com vários setores da sociedade. Com os movimentos sociais, com os sindicatos, com as lideranças das periferias, mas também com o comerciante, com empresários, com várias associações que representam setores do centro expandido de São Paulo.
Faço isso para que a gente construa um projeto de recuperar a nossa cidade. Isso é resgatar São Paulo para o povo.
O nível de destruição, o nível de abandono, de caos, na cidade mais rica da América Latina é crítico. É triste de se ver. É triste para nós que somos paulistanos.
Eu me lembro quando eu tinha 13, 14 anos. Ficava a semana toda esperando o sábado porque meu pai me levava para o centro, lá na [rua] Xavier de Toledo para almoçar.
Depois ia ao Sebo do Messias, lá na praça João Mendes. Quem hoje vai ao centro de São Paulo levar seus filhos e fica tranquilo?
Temos uma missão, o objetivo de devolver São Paulo para o nosso povo.
Veja a entrevista completa abaixo.
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