Brasil 2018: só os loucos e suicidas torcem contra o piloto. Mas só torcer a favor não basta. Por Ricardo Kotscho

Atualizado em 6 de novembro de 2018 às 12:30
Jair Bolsonaro. Foto: AFP

Publicado originalmente no Balaio do Kotscho

POR RICARDO KOTSCHO, jornalista

“Não se deve torcer contra o piloto do avião no qual se viaja” (Nizan Guanaes em sua coluna “União e superação”, na Folha).

“O Brasil ficou louco” (Sebastião Salgado, em entrevista à rádio francesa France Inter e na Carta Capital).

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São duas formas diferentes de ver as mesmas coisas, analisadas por dois respeitáveis e admirados brasileiros.

No que me toca, eu não torço contra, não sou nenhuma Regina Duarte, mas estou com medo do que pode acontecer.

Só os loucos e suicidas torcem contra o piloto do avião em que estão viajando.

Sempre tive medo de avião, principalmente quando o tempo está fechado e a cara da tripulação não é boa.

O medo aumenta quando vejo o currículo do comandante, que nunca pilotou nem um carrinho de pipoca, e vai assumir o controle do Sucatão, aquele velho Boeing presidencial aposentado, em que já viajei, e tão bem simboliza este louco Brasil de 2018.

E aumenta ainda mais quando vejo entrevistas deprimentes como a que o piloto Bolsonaro concedeu segunda-feira ao Datena, na TV Bandeirantes, com comentários escatológicos de conversas na cantina da caserna ou na lanchonete da emissora.

Se é isso que nos espera, não adianta a gente querer se enganar, não basta torcer para dar certo.

Pois se torcida resolvesse tudo, o Corinthians do Washington Olivetto seria eterno campeão brasileiro e, no entanto, está caindo pelas tabelas, ameaçado de rebaixamento.

Vamos todos embarcar compulsoriamente neste Sucatão no dia 1º de janeiro de 2019, sem saber a rota nem o destino, com passagem só de ida, sem ideia de quando e como voltaremos.

Tendo a concordar com o genial fotógrafo Sebastião Salgado, para quem “o Brasil já está dando sinais de insanidade mental” desde o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, e de lá para cá só vem piorando, como mostraram os resultados da última eleição.

Nem se trata de discussão ideológica, esse negócio de direita e esquerda de antigamente, e do fato do presidente eleito ser um ex-capitão do Exército, que defende torturas e assassinatos da ditadura militar, mas sinais de loucura mesmo, evidenciados nos dias seguintes à eleição, que deixaram o mundo perplexo.

Acho que não só eu, mas o mundo inteiro está amedrontado com as primeiras manifestações da nova ordem implantada aqui, com um plano de voo assustador, que vai sendo revelado no varejão de entrevistas caóticas no bunker da Barra da Tijuca.

Para quem acha que estou exagerando, recomendo procurar a entrevista do Bolsonaro a Datena na internet.

Fico com inveja do Nizan Guanaes, que conta em sua coluna ter corrido os 42 quilômetros na Maratona de Nova York, apenas 40 dias depois de ter passado por um sério problema de saúde.

O amigo é somente dez anos mais novo do que eu, mas a diferença parece muito maior, pois acordo todo dia com o esqueleto inteiro dolorido, como se tivesse jogado futebol a noite toda.

Na próxima coluna, Nizan poderia indicar as vitaminas que toma pra ter esse pique, porque as minhas já não estão fazendo efeito.

Ou então ele já desistiu de ler o noticiário sobre o Brasil publicado nos principais jornais do mundo, para não se aborrecer, nem perder seu eterno otimismo.

Bem que eu gostaria de ser assim, mas o ofício de repórter me impede de brigar com os fatos e ficar só na torcida.

Vida que segue.