Brasil registra clima de deserto oficialmente pela 1ª vez

Atualizado em 11 de novembro de 2023 às 22:09
De 2016 para cá, novos mapeamentos apontam que as mudanças climáticas já estão interferindo e acelerando no processo de desertificação. Foto: Reprodução

Pela primeira vez, estudos baseados em dados climáticos dos últimos 30 anos revelam a presença de áreas com clima árido no Brasil, semelhante ao encontrado em desertos. A causa do fenômeno é atribuída às mudanças climáticas que elevaram a temperatura do solo, associadas à degradação resultante da atividade humana. Uma nota técnica elaborada por cientistas do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) alerta que o índice de aridez atingiu níveis inéditos, ampliando áreas propensas à desertificação. O documento foi entregue ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e outros órgãos responsáveis pela elaboração do plano de mitigação.

O levantamento, baseado em dados até 2020, destaca as áreas áridas, principalmente na região norte da Bahia, como algo inédito e preocupante. Javier Tomasella, pesquisador do Inpe e coordenador do estudo, ressalta a novidade, “Nosso levantamento utilizou dados até 2020, e no novo mapa aparecem essas áreas áridas, mais precisamente na região norte da Bahia. A gente nunca tinha visto isso antes, essa é a primeira vez”, detalha ao UOL.

O cálculo de aridez, conforme classificado pela Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (UNCCD), leva em consideração a média de chuvas em um intervalo de 30 anos e a evaporação potencial. O aumento da aridez é associado às mudanças climáticas, que aceleram a evaporação da água, combinadas com práticas humanas de degradação do solo, como desmatamento e queimadas. A nota técnica alerta para o avanço do processo de aridez em todo o país, com exceção da região Sul. Além de Javier, o estudo é assinado por Ana Paula Cunha e José Marengo, do Cemaden.

Por causa da estiagem que afetou o Nordeste, nível do reservatório de Sobradinho caiu a patamares inéditos.
Foto: Beto Macário/UOL

Outro estudo, conduzido pelo pesquisador Humberto Barbosa, coordenador do Laboratório de Processamento de Imagens de Satélite da Universidade Federal de Alagoas, corrobora a problemática identificada. Utilizando dados de satélite dos últimos 18 anos, Barbosa observou uma redução na cobertura de nuvens na região, indicando uma diminuição na capacidade de chuva, particularmente no norte da Bahia, onde a aridez é mais pronunciada.

A informação desperta preocupação no Ministério do Meio Ambiente, que recentemente estabeleceu o Departamento de Combate à Desertificação. Alexandre Pires, coordenador do departamento, destaca a utilização dos dados do Inpe e Cemaden para atualizar o mapa das áreas suscetíveis à desertificação, visando a implementação de medidas de combate. “O MMA está se articulando com os governos dos estados no sentido de retomada da política, de repactuação de ações que atendam a necessidade de implementação de práticas e tecnologias concretas de combate à desertificação”, destaca Pires.

Durante um seminário promovido pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), autoridades e cientistas discutiram a necessidade de ações imediatas para evitar a desertificação. O presidente do TCE-PB, Nominando Diniz, alertou que, se não forem tomadas medidas imediatas, a desertificação poderá forçar a remoção das populações do semiárido.

A preocupação com a desertificação abrange diversos estados. Margareth Sílvia Benício, engenheira agrônoma e gerente de Estudos e Pesquisas em Meio Ambiente da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), destaca que, embora o Ceará ainda não tenha áreas com clima árido, todo o seu território é suscetível à desertificação. As mudanças climáticas já interferem e aceleram esse processo, com três núcleos de desertificação identificados no estado, exigindo ação imediata dos governos.

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