Busca por manchetes chamativas atrapalha compreensão do que é o BRICS, diz especialista

Atualizado em 7 de julho de 2025 às 9:14
Foto de família da 17ª Cúpula do Brics, no Rio de Janeiro. Foto: Isabela Castilho | BRICS Brasil

O cientista político Oliver Stuenkel, especialista em geopolítica e professor da FGV, defendeu em seu perfil no X que o BRICS não deve ser visto como uma aliança ideológica, mas sim como parte de uma estratégia pragmática de multi-alinhamento adotada por países como Brasil e Índia. Confira:

Tanto os entusiastas quanto os críticos do BRICS costumam exagerar o componente ideológico do grupo. Estar no BRICS não obriga os países a escolher um lado na geopolítica global.

A Índia, por exemplo, está hoje mais próxima dos Estados Unidos, do ponto de vista estratégico, do que de qualquer outro membro do bloco BRICS — e mesmo assim, o BRICS continua sendo útil para Nova Délhi se adaptar a um mundo multipolar.

O Brasil também integra o BRICS, mas ao mesmo tempo trabalha para implementar um acordo comercial histórico com a União Europeia, que pode transformar a relação entre o Mercosul e o bloco europeu.

Com exceção de membros como Rússia e Irã, que adotam uma retórica mais claramente antiocidental, os outros países do BRICS mantêm relações sólidas com potências ocidentais de fora do grupo.

O BRICS é apenas uma peça dentro de uma estratégia de multi-alinhamento. Brasil e Índia, por exemplo, atuam de forma consistente para retirar qualquer linguagem antiocidental das declarações finais das cúpulas.

E vale lembrar: nem mesmo Bolsonaro — provavelmente o presidente mais pró-EUA da história do Brasil — cogitou sair do BRICS. Ele também entendeu que manter um diálogo institucional com grandes parceiros é útil, e os custos de fazer parte do BRICS são baixos.

A entrada da Indonésia neste ano é um bom exemplo: é uma potência emergente sobre a qual o Brasil sabe muito pouco. Mesmo quem, no Brasil, acompanha política internacional de perto teria dificuldade em dizer quem é o chanceler da Indonésia ou qual sua maior universidade.

A Cúpula do Brics ocorre no Rio de Janeiro. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O BRICS ajuda a preencher essas lacunas — assim como ajudou muitos brasileiros a entender melhor países como China, Índia e Rússia.

Por isso, quando alguém descreve o BRICS de forma extrema — ou como algo totalmente irrelevante ou como uma ameaça à ordem global —, vale lembrar que nenhuma dessas visões reflete a realidade.

A realidade sobre o BRICS é mais técnica, ambígua e, às vezes, até entediante. Estudo o grupo há mais de dez anos e sigo fascinado pelo tema. Mas, sempre que ocorre uma cúpula, a busca por manchetes chamativas pode atrapalhar a compreensão do que realmente é o BRICS.