Candidato a prefeito de Nova York propõe supermercados públicos contra preços altos

Atualizado em 23 de agosto de 2025 às 8:38
Zohran Mamdani em deli no Queens, em Nova York

Quando Zohran Mamdani venceu de forma surpreendente, mas decisiva, as primárias democratas para prefeito de Nova York no mês passado, foi graças a uma plataforma centrada em um ponto: tornar a maior cidade dos Estados Unidos mais acessível para a classe trabalhadora.

Entre suas propostas — que incluem creche gratuita e congelamento do aluguel — a que mais chamou atenção foi a criação de uma rede de supermercados municipais, sem fins lucrativos, voltados a oferecer preços mais baixos.

Segundo Mamdani, sem despesas com aluguel ou impostos, os mercados públicos poderiam repassar economias diretamente ao consumidor. A ideia é centralizar compras e distribuição, negociar no atacado e trabalhar em parceria com os bairros para definir produtos e fornecedores.

A proposta encontrou eco: pesquisa de abril de 2025 mostrou que dois terços dos novaiorquinos apoiam a criação de supermercados municipais. O dado reflete o aumento da insatisfação com a inflação — 85% afirmaram pagar mais por alimentos em 2025 do que em 2024, e 91% se disseram preocupados com o impacto do custo da comida no orçamento.

Embora soe ousada, a ideia tem precedentes históricos. No Reino Unido, durante a Segunda Guerra, havia os “British restaurants”, que ofereciam refeições com preços tabelados. A Polônia criou os “bares de leite”, cafeterias subsidiadas. Modelos semelhantes existem hoje em países como Índia, México, Turquia e até no Brasil.

Nos Estados Unidos, o exemplo mais próximo são os mercados em bases das Forças Armadas onde famílias de militares compram alimentos de 30% a 40% mais baratos. Em 2023, esse sistema poupou US$ 1,58 bilhão às famílias.

Especialistas apontam que o sucesso depende da escala e do engajamento comunitário. Em Atlanta, por exemplo, após anos sem atrair supermercados privados, a prefeitura decidiu intervir em parceria com organizações locais para abrir um mercado no distrito mais carente.

Casos semelhantes ocorreram em pequenas cidades do Kansas e da Flórida. Outro desafio é evitar o estigma de ser um serviço “para pobres”: experiências anteriores mostram que o modelo funciona melhor quando é universal, como escolas e bibliotecas públicas.

Mamdani propôs abrir inicialmente cinco supermercados — um em cada distrito da cidade. Analistas lembram que Nova York já compra grandes volumes de alimentos para escolas e hospitais, o que poderia ser usado para negociar preços mais baixos também para as lojas.

Adotar formatos que imitem redes bem-sucedidas, como Aldi (poucos itens, baixo custo) ou Costco (modelo de atacado), pode ser parte da solução.

Se dará certo ou não, ainda é cedo para dizer. Mas os exemplos internacionais, as tentativas em outras cidades americanas e o modelo militar indicam que supermercados públicos não são uma utopia. Como resume Margaret Mullins, pesquisadora da Universidade Vanderbilt: “O correio, as bibliotecas e as escolas públicas mostram que serviços assim podem ser parte fundamental da comunidade. Com comida, não precisa ser diferente”.

Davi Nogueira
Davi tem 25 anos, é editor e repórter do DCM, pesquisador do Datafolha e bacharel em sociologia pela FESPSP, além de guitarrista nas horas vagas.