Carta obscena de Trump para Epstein levanta novas dúvidas sobre relação entre os dois

Atualizado em 17 de julho de 2025 às 21:36
Jeffrey Epstein e Donald Trump

No aniversário de 50 anos de Jeffrey Epstein, Ghislaine Maxwell preparou um presente especial para a ocasião. Recorreu a familiares e amigos próximos de Epstein. Entre eles, Donald Trump.

Segundo documentos obtidos pelo Wall Street Journal, Ghislaine reuniu cartas de Trump e de dezenas de outros amigos e clientes de Epstein para montar um álbum comemorativo em 2003. As páginas desse álbum de capa de couro — criado antes da primeira prisão de Epstein, em 2006 — foram analisadas por investigadores do Departamento de Justiça anos atrás. Não se sabe se elas estão incluídas na revisão recente conduzida sob o governo Trump.

A relação entre Trump e Epstein voltou ao centro das atenções em meio ao debate sobre os chamados “arquivos Epstein”. Na quarta-feira, depois de afirmar que esses arquivos seriam uma invenção de adversários políticos, Trump atacou até seus próprios aliados por insistirem no assunto.

Uma das cartas, assinada por Trump e examinada pelo WSJ, tem conteúdo obsceno, semelhante a outras presentes no álbum. O texto, digitado à máquina, aparece dentro do contorno de uma mulher nua desenhada à mão. A assinatura “Donald”, feita com traço ondulado abaixo da cintura da figura, simula pelos pubianos.

A mensagem termina com: “Feliz aniversário — e que cada dia seja outro maravilhoso segredo.”

Trump negou ter escrito a carta ou feito o desenho. “Isso não é meu. É tudo falso. Uma história inventada pelo Wall Street Journal “, disse. “Nunca fiz desenho nenhum na vida. Não desenho mulheres. Essa linguagem não é minha. Essas palavras não são minhas”.

“Vou processar o Wall Street Journal, como já processei outros”, afirmou.

As acusações de abuso sexual contra Epstein vieram a público em 2006, quando ele foi preso pela primeira vez. Em 2019, após nova prisão, morreu em uma cela, sob custódia federal, acusado de tráfico sexual.

O Departamento de Justiça e o FBI se recusaram a comentar se a carta de Trump e outras do álbum de aniversário estão na análise atual. A existência desse álbum e o conteúdo das cartas nunca tinham sido divulgados.

O álbum trazia poemas, fotos e mensagens de empresários, acadêmicos, ex-namoradas e colegas de infância de Epstein. Entre os que enviaram cartas estavam o bilionário Leslie Wexner e o advogado Alan Dershowitz.

Dershowitz, que defendeu Epstein em 2006, enviou uma carta com uma paródia da revista Vanity Fair, renomeada como Vanity Unfair, com chamadas falsas como: “Quem foi Jack, o Estripador? Teria sido Jeffrey Epstein?” Ele alegou ter convencido a revista a trocar o foco de uma reportagem — de Epstein para Bill Clinton. Questionado, alegou não se lembrar do conteúdo da carta.

O álbum foi produzido por um encadernador de Nova York, Herbert Weitz, que morreu em 2020. Em 2003, Weitz listava Epstein como cliente no próprio site.

Não está claro como foi feita a carta com a assinatura de Trump. Dentro do contorno da mulher nua, aparece um texto em forma de diálogo imaginário entre “Donald” e “Jeffrey”, na terceira pessoa:

Voz: Deve haver mais na vida do que ter tudo.

Donald: Sim, há, mas não vou te contar o que é.

Jeffrey: Nem eu, já que também sei.

Donald: Temos certas coisas em comum, Jeffrey.

Jeffrey: Sim, pensando bem.

Donald: Enigmas não envelhecem, percebeu?

Jeffrey: Na verdade, percebi da última vez que nos vimos.

Trump: Um amigo é algo maravilhoso. Feliz aniversário — e que cada dia seja outro maravilhoso segredo.

Quando fez 50 anos, Epstein já era rico, gerenciando a fortuna de Wexner e convivendo com nomes como Trump e Clinton em Nova York, Palm Beach e nas ilhas do Caribe. Clinton, por meio de seu porta-voz, reafirmou que cortou relações com Epstein mais de dez anos antes da prisão de 2019.

Trump e Epstein apareceram juntos em festas nos anos 1990 e 2000. Um vídeo de 1992, dos arquivos da NBC, mostra os dois em Mar-a-Lago. Trump aparece puxando uma mulher e tocando nas nádegas dela.

Ambos também constam de registros de voos no jato particular de Epstein. Em 2002, à New York Magazine, Trump disse:
“Conheço Jeff há 15 anos. Gente boa. Ele gosta de mulheres bonitas tanto quanto eu, e muitas são bem jovens. Sem dúvida, Jeffrey gosta da vida social”.

Depois, os dois se afastaram. Trump afirmou que rompeu com Epstein antes da condenação de 2008, quando o financista cumpriu pena por exploração de menores. Em 2019, Trump declarou: “Conhecia ele como todo mundo em Palm Beach conhecia. Nunca fui fã dele”.

Em 2023, a equipe de Trump informou que ele havia banido Epstein de Mar-a-Lago em algum momento do passado, sem dar detalhes.

Ghislaine Maxwell foi condenada em 2021 por envolvimento no esquema de tráfico sexual. Está presa e recorre à Suprema Corte dos EUA. Seu advogado, Arthur Aidala, disse que ela está focada no processo judicial.

A relação de Epstein com Trump e outras figuras poderosas já é conhecida. A dúvida agora é o que o FBI ainda possui. Em 2019, o órgão apreendeu provas nas propriedades de Epstein em Nova York e nas Ilhas Virgens.

Na terça-feira, ao ser questionado sobre a carta, Trump disse acreditar que parte dos “arquivos Epstein” foi criada por Obama, Biden e o ex-diretor do FBI, James Comey. Disse que caberia à procuradora-geral, Pam Bondi, decidir o que seria divulgado.

Bondi divulgou em fevereiro os primeiros arquivos, mas o conteúdo frustrou apoiadores. Ela culpou o FBI de Nova York por reter informações e prometeu divulgar o restante, com os nomes das vítimas ocultados. O diretor do FBI, Kash Patel, e seu vice, Dan Bongino, afirmaram que “nenhum documento será omitido”.

Em junho, Elon Musk entrou no debate. Durante uma briga pública com Trump, afirmou que o ex-presidente aparecia nos arquivos, e por isso o FBI estaria retendo documentos. Depois apagou a postagem e disse ter se arrependido.

Em 7 de julho, o Departamento de Justiça recuou e disse que não havia encontrado “lista de clientes incriminadora” nem novos documentos que justificassem mais revelações. Democratas da Câmara exigiram que o presidente do comitê Judiciário, Jim Jordan, convoque uma audiência sobre a conduta do governo Trump nesse caso.