Caso Mari Ferrer: Rodrigo Constantino, Gabriela Prioli e o endosso público à barbárie. Por Nathalí

Atualizado em 4 de novembro de 2020 às 19:57
Gabriela Prioli e Rodrigo Constantino

O quão inútil e asqueroso você precisa ser pra ser demitido da Jovem Pan?

Rodrigo Constantino tem a resposta.

Depois de defecar pela boca – só pra variar – sobre o caso Mari Ferrer, o comentarista foi dispensado do cemitério da coxinhada, a velha-Jovem Pan que insiste em abrigar o que há de pior no mundo – mas apologia ao estupro é demais até pra eles.

Se tem uma coisa em que Constantino é especialista é em não perder a oportunidade de ficar calado.

Durante uma live em seu canal no YouTube, abordou a absolvição do empresário André Aranha e afirmou que “não faria a denúncia se sua filha fosse estuprada enquanto estivesse bêbada.”

No Twitter, postou:

Não entrei na polêmica do “estupro culposo” pois estava atento às eleições americanas. Mas vamos lá: se alguém ESCOLHE beber e ESCOLHE, bêbado, pegar um carro e dirigir, e mata alguém, é crime DOLOSO, certo? Então por que essa desculpa de que a mulher bêbada não é responsável?

Primeiro: que polêmica? Polêmicos são fatos que dividem opiniões.

O caso Mari Ferrer é uma unanimidade: a absolvição, diante de todas as provas, é uma vergonha para o judiciário brasileiro e uma humilhação para cada mulher no dia de hoje (só pra se ter uma noção, até a Joice Hasselmann se disse enojada com a fala do coleguinha).

Segundo, essa fala não faz nenhum sentido lógico: falou pouco, mas falou bosta.

O estado de embriaguez não é considerado uma excludente de culpabilidade pelo sistema jurídico brasileiro, mas configura redução ou impossibilidade de defesa da vítima, que, fora de seu estado de completa lucidez, torna-se vulnerável.

Isso é muito fácil de entender – até pro Constantino, acaso tivesse feito o menor esforço (se assim tivesse sido, ele ainda teria um emprego).

Dirigir sob estado de embriaguez é crime, queridão. Beber em uma festinha, não. Matar alguém nesse estando embriagado configura dolo eventual – quando você assume o risco de matar.

Quando uma mulher sai pra tomar uma biritas, ela não conta com o fato de existirem estupradores prontos para colocarem boa noite cinderela em sua bebida e estuprarem-na.

Não é justo que ela tenha que contar com isso. Não é humano, não é aceitável, não se ampara na lógica.

Então, não, não há a menor simetria entre os dois exemplos citados por uma razão simples: quem escolhe dirigir bêbado é réu. Quem é violado enquanto está bêbado é vítima.

E isso se ampara na impossibilidade de responsabilizarmos as vítimas pelos crimes praticados contra elas (como bem lembrou a Jovem Pan ao anunciar a demissão do comentarista).

Terceiro, ainda bem que eu não sou a filha de Rodrigo Constantino.

Se ela tomou uns drinks, isso é suficiente para retirá-la do lugar de vítima e colocá-la no lugar de ré (se até postar fotos sensuais na internet foi suficiente pra essa inversão, culpá-la por ter bebido é fichinha).

É impressionante o esforço argumentativo que essa gente faz só pra ser escrota, quando poderia – santo Deus – apenas calar a boca.

Assumir que uma mulher bêbada possa ser estuprada sem nenhuma consequência – e que, por estar bêbada, a culpa pelo estupro é dela – é compactuar com a barbárie, é dizer que nós não temos o direito ao lazer como qualquer ser humano, porque isso significa assumir o risco de ser estuprada. É equivalente a cuspir na cara de cada mulher.

Mais do que isso, é dar carta branca para que estupradores se aproveitem de nós enquanto tentamos apenas nos divertir.

Não, Constantino: a culpa do estupro é sempre do estuprador. E eventualmente daqueles que apoiam o estuprador, tipo você.

O vídeo divulgado ontem pelo Intercept é tão absurdo que eu tive a pachorra de acreditar que ninguém ousaria defender aquele julgamento ou acusar a vítima de nenhuma forma, mas o Brasil sempre pode nos surpreender.

Além de Constantino, Gabriela Prioli – a fada sensata dos centristas – comparou o caso de Mariana Ferrer ao processo de Lula (mas e o Lula, hein? E o PT?), gerando revolta nas redes sociais.

Nenhuma surpresa por aqui: o que esperar de uma centrista branca, não é mesmo? Sobretudo se ela for namorada de um DJ catarinense amiguinho do estuprador dono do Café de La Musique.

Sororidade pra quem?

Homem ou mulher, direitista, esquerdista, centrista, anarcocapitalista e o escambau: qualquer um que ouse tratar o caso Mari Ferrer com relativismos, poréns e porquês, endossa o estupro, endossa o machismo sistêmico e não merece um segundo da sua audiência, caro leitor.

Quando cruzar com gente assim, aconselho que você se afaste lentamente sem jamais virar as costas, sob o risco de ser apunhalado.