
O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou em entrevista à Folha de S.Paulo que o uso intensivo de tecnologia foi essencial para a investigação dos atos golpistas de 8 de janeiro, que resultou na condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros sete réus em setembro.
Ele está em Lisboa, onde participa do 2º Fórum Futuro da Tributação, para tratar do tema e se reunir com autoridades portuguesas. Questionado sobre o risco de sofrer represálias como as sanções impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao ministro Alexandre de Moraes, Rodrigues disse que “esse é um momento que há de passar” e que “tresloucados brasileiros” não intimidarão a PF.
Segundo o diretor, a operação reuniu terabytes de dados coletados em celulares, notebooks e documentos digitalizados, além de provas obtidas por perícia, vestígios biológicos e reconhecimento humano. Ele ressaltou que, além da tecnologia, o trabalho exigiu a dedicação de profissionais treinados. “Usamos ciência, usamos tecnologia, mas também o essencial: a nossa alma, o nosso profissional”, afirmou.
Um dos exemplos citados foi o plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o vice Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes. O documento foi encontrado em versão impressa, mas a PF rastreou sua origem pela impressora, cruzando dados de login, arquivos e localização de aparelhos.
“Em análises de geolocalização, identificamos que a pessoa cujo login estava na impressora também estava com o celular dentro do Palácio do Planalto”, disse.

Rodrigues respondeu também às críticas de que a investigação teria se baseado de forma excessiva na delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Ele explicou que as delações foram apenas uma parte do conjunto probatório. “Antes da delação vêm as câmeras de segurança, os registros de rádio-base e depois se soma a colaboração. Os ministros do STF falaram com veemência da qualidade das provas”, declarou.
Ao falar sobre crimes financeiros, o diretor destacou que a tecnologia mudou radicalmente esse cenário, sobretudo com a ascensão das fintechs e criptomoedas. Comparou o assalto ao Banco Central em 2005, realizado com um túnel, com os crimes digitais atuais.
“Hoje, com um computador e uma boa rede, se desvia R$ 1 bilhão com dois ou três cliques”, afirmou. Em 2024, a PF apreendeu R$ 6,5 bilhões, valor muito superior aos R$ 600 milhões confiscados em décadas anteriores.
Rodrigues também mencionou a Operação Carbono Oculto, realizada em cooperação com a Receita Federal. Segundo ele, o trabalho permitiu identificar um esquema de lavagem de dinheiro que usava camadas de fundos e offshores para ocultar valores. “Conseguimos destrinchar essas camadas e identificar as pessoas por trás do esquema”, afirmou.
Outro ponto abordado foi a transformação digital da PF. Hoje, todos os cerca de 49 mil inquéritos policiais tramitam sem papel, formando uma base de dados acessível aos investigadores: “Você pode imaginar a quantidade de depoimentos, apreensões e extrações de equipamentos. Tudo isso está à disposição do nosso investigador”.
Rodrigues concluiu que a tecnologia é hoje uma das principais ferramentas da polícia, mas que deve sempre caminhar junto com a qualificação profissional e a cooperação institucional: “É um trabalho técnico, científico e coletivo que garante a qualidade das investigações”.