China investe em ferrovias que podem salvar indústria metalúrgica brasileira

Atualizado em 29 de julho de 2025 às 20:14
Trem levando minério na Ferrovia Vitória Minas. Reprodução

Por Luiz Gonzaga Belluzzo, Consultor Editorial da Carta Capital e

J. Carlos de Assis, Editor-Chefe da Tribuna da Imprensa

A China já anunciou formalmente sua disposição de ajudar países afetados pelo tarifaço de Trump a escapar de suas chantagens. O Brasil, que recentemente assinou com Pequim um acordo para construir a ferrovia bioceânica, ligando o Atlântico ao Pacífico e passando pelo interior do seu território, pode expandir esse acordo até o ponto de modernizar completamente a logística de transporte do País, indevidamente concentrada em rodovias.

A construção de ferrovias é um dos maiores sorvedouros de insumos siderúrgicos e de alumínio na área industrial. Essas indústrias, cujas exportações para os Estados Unidos foram antes taxadas por Donald Trump em 25%, já insuportáveis, no início do próximo mês passarão a pagar tarifas de 50%, o que torna inviável a exportação de aço e alumínio para os Estados Unidos. Isso significa que teremos de buscar alternativas.

A melhor é, justamente, substituir o mercado de importações norte-americano desses metais pelo mercado interno brasileiro, com a construção de uma ampla rede ferroviária no País, aproveitando a oferta de cooperação chinesa. Salvaremos nossas indústrias e, com elas, centenas de milhares de empregos de alta qualidade, o que fortalece o mercado interno também em outras áreas, como a construção civil.

O poderio econômico chinês está por trás também da oferta de cooperação com outros países sul americanos. Se isso significa investir neles em mais infraestrutura e mais logística, como é o caso da Rota da Seda, o mercado para o aço e o alumínio brasileiro poderá ampliar-se ainda mais, pois a maioria de nossos vizinhos não tem produção industrial suficiente pra atender à demanda desses metais e, muitas vezes, sequer base econômica para a construção civil em grande escala.

A nova rota da seda. Reprodução

Às favas, portanto, com os preconceitos ideológicos estúpidos que tentam impedir o Brasil de ampliar suas relações internacionais para além do círculo de Washington. Já era tempo de se reconhecer, de forma definitiva, que o comunismo acabou. O que está em seu lugar, com pleno sucesso, é o social capitalismo chinês, que mostra para o mundo a grande vantagem de superar os modelos superados do capitalismo selvagem e do socialismo utópico.

Em outras áreas, como na exportação de laranja e café em que o Brasil também foi fortemente atingido, há soluções práticas importantes mediante a substituição das vendas para os Estados Unidos por ampla distribuição de suco de laranja para alunos da rede primária no País. As vendas de suco de laranja poderão ser financiadas pelas secretarias de educação a preços baixos, mas justos, a partir de negociações com os produtores e os exportadores que perderam seu mercado externo.

No caso do café, a solução para a perda do mercado norte-americano implicaria um processo indireto. O Brasil, primeiro produtor e exportador do mundo, teria que fazer com a Colômbia, o segundo produtor, um acordo de alinhamento de preços a fim de que a disputa de mercados internacionais decorrente do tarifaço de Trump não implicasse uma guerra comercial. Os dois países, atraindo os exportadores menores que também estarão buscando mercados alternativos ao norte americano, se espelhariam na forma como a OPEP regula os preços do petróleo, para impedir concorrências predatórias de preços.

Portanto, para cada produto ou serviço exportado ou importado, há algum tipo de solução mediante negociações bilaterais ou mesmo envolvendo mais de dois países, desde que haja boa fé entre eles, e que não sejam perturbados por injunções políticas. Por exemplo, quando um país exportador perde o mercado norte-americano por causa do tarifaço, ele pode exportar seu produto para um terceiro, que por sua vez pode vendê-lo para um quarto sem consumi-lo internamente, dependendo da situação específica de seu comércio exterior.

Ao final de todo esse processo, quem acabará saindo perdendo são os próprios Estados Unidos, pelo enfraquecimento de suas empresas por causa dos insumos mais caros, e por causa do desconforto de suas classes baixas e médias pela falta em suas mesas de derivados de produtos que costumavam consumir secularmente, como suco de laranja e café. Com isso, Trump terá dado enorme contribuição à transferência de renda real no planeta. A laranja tradicionalmente consumida por suas classes médias acabará na mesa dos alunos pobres das escolas brasileiras, com maior acesso a ela em quantidade e qualidade, e menor preço em função da maior concorrência regulada pelos estados.

J. Carlos de Assis
Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)[2] e autor de mais de 20 livros.