“Cinegrafista preto” usado por defensores de Waack como prova de que âncora não é racista é branco

Atualizado em 13 de novembro de 2017 às 18:37
“É coisa de preto”

Os defensores de William Waack estão se apoiando em um depoimento publicado no Facebook como “prova” de que ele não é racista.

O cinegrafista Gil Moura conta o seguinte: “Eu sou preto. Já trabalhei com ele na França, em Portugal, na Espanha, na Índia e em São Paulo”.

“Ele faz parte dos pouquíssimos globais que carregam o tripé para o repórter cinematográfico preto ou branco”.

O relato foi reproduzido por Reinaldo Azevedo em sua coluna. “William Waack não é racista. Não o é de várias maneiras”, afirma.

“Uma das coisas erradas que se disseram sobre William é que ele é de trato difícil, ríspido, com chefes e subordinados”, prossegue, antes de reproduzir a declaração de Moura.

O detalhe é que Gil Moura não é exatamente preto. Nas fotos de seu perfil na rede social, aliás, ele é branco.

Confira:


Uma hipótese é a de que Gil se defina como preto. Direito dele. Ele pode também estar usando uma classificação do IBGE.

Como reza aquela velha formulação: uma imagem vale por mil palavras.

A seguir, o testemunho de Gil Moura sobre William Waack:

Eu sou preto. Já trabalhei com ele na França, em Portugal, na Espanha, na Índia e em São Paulo.
Nesta caminhada de 30 anos, fazendo imagens e contando histórias, poucos colegas foram tão solidários quanto o velho Waack. Ele faz parte dos pouquíssimos globais que carregam o tripé para o repórter cinematográfico preto ou branco. Na verdade, não me lembro de ninguém na Globo que o faça. O velho sabe para que serve cada botão da câmera e o peso do tripé. Quando um preto sugere um restaurante mais simples, ele não dá atenção, porque paga a conta dos colegas que ganham menos, no restaurante melhor. Como ele fez piada infeliz de preto, ele faz dele próprio, suas olheiras, velhice, etc.
O que a Globo mais tem são mocinhos e mocinhas de cabelos arrumadinhos, vindos da PUC ou da USP, que são moldados ao jeito da casa.
Posso dar o exemplo de quando estávamos gravando uma passagem no meio da rua, onde havia um acidente, e sugeri a uma patricinha repórter que prendesse o cabelo devido ao vento. Ela o fez. Gravamos na correria, porque estávamos a duas horas do RJ. No dia seguinte, na redação, que aparece no cenário do JN, ela comenta.
– Você viu a matéria ontem?
– Não
– Sobrou uma ponta do cabelo, fiquei parecendo uma empregada doméstica.
Ao que respondi.
– Eu sou repórter cinematográfico, cabeleireiro não havia na equipe.
Posso lembrar-me de muitas coisas como, quando fazíamos uma matéria para o Fantástico, uma mesa de discussão, e ao ouvido, ouço o repórter falar.
– Põe aquela pretinha mais para trás.
Isto faz parte do cotidiano. Os verdadeiros racistas, estão por todas as partes, mas são discretos. Também tem a famosa, que chegou ao prédio onde vive, e uma moradora (namorada de um amigo) segurou o elevador.
A famosa negra não agradeceu, e ficou de braços cruzados. O elevador começou a subir.
Jornalista Famosa
– Você não sabe qual é o meu andar?
– Sei, mas não sou sua empregada.
No vídeo, ela é uma “querida”, jamais trata mal o entrevistado, se estiver gravando…
Voltando ao racista William Waack. Quando íamos para a Índia – eu vivia em Lisboa – fui 3 dias antes para Londres, de onde partiríamos para Dheli.
Eu ia ficar em um hotel, mas o racista que havia trabalhado comigo até então somente uma vez em Cannes, convidou-me para ficar em sua casa, onde vivia com esposa e dois filhos, esposa essa a quem ele, preconceituosamente, chamava de “flaca” devido à sua magreza. Eu via como uma forma de carinho.
Comemos, bebemos bom vinho e, em nem um momento, alguém quis se mostrar mais erudito que eu, nem mais racista.

Kiko Nogueira
Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.