Ciro vai ter que decidir entre a lata de lixo da história ou a reciclagem. Por Luis Felipe Miguel

Atualizado em 31 de outubro de 2018 às 13:24
Ciro Gomes. (foto: Mauro Pimentel/ AFP )

Publicado originalmente no perfil de Facebook do autor

POR LUIS FELIPE MIGUEL, professor de ciência política da UnB

Em entrevista na Folha de hoje, Ciro Gomes se mostra em toda sua grandeza. Não basta uma lupa para vê-lo, é preciso um microscópio eletrônico. O governo eleito e a ameaça que ele encarna não o ocupam; sua energia está toda voltada contra o PT. Não está minimamente preocupado com a resistência democrática; seu projeto para o Brasil começa e termina na sua candidatura. O destempero verbal é tamanho que um homem da dignidade de Leonardo Boff é chamado de “um bosta”, porque ousou criticá-lo.

Não consigo entender qual sinal dos céus deu ao Ciro a certeza de que ele tinha o direito divino de ser o candidato da esquerda das eleições deste ano. Ele foi candidato, legitimamente, mas a vaga no segundo turno foi dada – pelas urnas! – a Fernando Haddad. Felizmente, eu diria. Haddad cresceu enormemente na campanha. E Ciro, como mostrou seu comportamento após a derrota no primeiro turno, realmente não tinha estofo para assumir esse papel.

É possível fazer a crítica – legítima e mesmo necessária – ao PT sem abrir mão da unidade necessária na resistência. É claro também que ninguém espera que essa unidade seja perfeita e sem atritos, mas há um abismo entre trabalhar para que as diferenças sejam respeitadas sem sabotar o trabalho comum ou usá-las para tentar marginalizar parceiros e obter uma liderança de proveta.

Como falei antes, a linha divisória principal é entre aqueles que criticam o PT a partir de um ponto de vista programático, como é o caso do PSOL, e aqueles que estão preocupados apenas com suas ambições pessoais. O PSOL vai ter que lutar para manter sua independência num momento de luta conjunta em que o PT é, de longe, a força mais forte. Tenho certeza de que conseguirá, pela qualidade política de seus quadros. Já Ciro vai ter que decidir se passa à lata de lixo da história ou se tem chance de reciclagem.