Coalizão com bloco de Lira rebaixa horizonte programático do governo. Por Jeferson Miola

Atualizado em 20 de julho de 2023 às 6:24
Presidente da Câmara Arthur Lira e presidente Lula. (Foto: Reprodução)

Para Caio Megale, economista-chefe da XP, o grande mérito do ministro Fernando Haddad no primeiro semestre foi “desfazer a percepção de uma guinada na política econômica ou a reversão de avanços conquistados nos últimos cinco ou seis anos”.

O que, afinal, o banqueiro da XP entende como os “avanços conquistados” que Haddad não reverteu? São os retrocessos trabalhistas e previdenciários, a privatização obscena da Eletrobrás e de áreas da Petrobrás, a autonomia do Banco Central, o marco do saneamento e o Teto de Gastos, que ganhou roupagem nova como “arcabouço fiscal”.

O período a que Megale se refere, “nos últimos cinco ou seis anos”, é o do ciclo iniciado pelo usurpador Temer com o impeachment fraudulento da presidente Dilma, em 2016, e continuado no governo fascista-militar só nominalmente presidido por Bolsonaro, mas comandado de fato pelo partido dos generais.

Neste período do golpe foi sedimentado o arcabouço jurídico-legal que sacralizou os direitos divinos do capital e das finanças no Brasil em prejuízo das enormes urgências sociais e nacionais.

Arthur Lira, o chefe do sistema de chantagem, achaque e extorsão da deputadocracia, foi peça-chave da preservação das “conquistas” citadas pelo banqueiro da XP.

Controlando o esquema bilionário de orçamento secreto que alimenta práticas de corrupção e demagogia nas paróquias eleitorais no varejo e no atacado, Lira maneja a pauta da Câmara, e, ainda, define o posicionamento da maioria deputadocrática em relação às matérias votadas – tanto a favor como contra o governo.

No momento de exposição política crítica devido à publicidade do aumento do seu patrimônio e dos seus esquemas de corrupção com o orçamento secreto, Lira surpreendeu com a decisão de acelerar a aprovação da reforma tributária parcial, que não altera a natureza regressiva e injusta do sistema tributário brasileiro, mas distrai a opinião pública a respeito de suas inúmeras maracutaias e denúncias, inclusive de abuso e violência contra a ex-esposa.

Lira habilmente tirou seus escândalos do noticiário e ganhou o tempo necessário para conseguir, no STF, a suspensão dos inquéritos e investigações sobre seus esquemas de corrupção em Alagoas, o que aconteceu por meio de uma providência do ministro Gilmar Mendes, em 6 de julho.

Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Foto: Bruno Spada

Com a demonstração de sua força e poder incontestável na Câmara, Lira saiu-se ainda mais fortalecido perante a Faria Lima e o governo.

Blindado e fortalecido, ele até antecipou em uma semana o recesso legislativo. E, de sobra, para escapar do radar da mídia, ainda debochou curtindo uma viagem de cruzeiro à ilha de Safadão – o cantor, claro.

A acomodação do bloco de Arthur Lira na Esplanada dos Ministérios começou com a posse do bolsonarista Celso Sabino, do União Nacional [PFL + PSL], no ministério do Turismo.

Líderes do governo Lula indicam que a montagem da coalizão com a Deputadocracia do Lira prosseguirá com a nomeação de outros políticos conservadores e de direita que, inclusive, apoiaram o governo fascista-militar com notável fervor e devoção.

A coalizão que o governo faz com a Deputadocracia, entregando ministérios em troca de respiro na Câmara, poderá trazer a estabilidade almejada pelo presidente Lula; mas, por outro lado, marcará o rebaixamento do horizonte programático do governo.

O alívio do banqueiro Caio Megale com a preservação dos “avanços conquistados”, assim como a posição de Arthur Lira, contrário à reversão dos retrocessos impostos ao povo e à soberania brasileira a partir do golpe, são fatores que limitam o campo de possibilidades do governo a um horizonte social-liberal muito limitado, que poderá impossibilitar a materialização de respostas governamentais às necessidades urgentes das imensas maiorias sociais.

Caso esta trajetória se confirme, o governo não conseguirá responder às expectativas e esperanças depositadas pelo povo na chapa Lula-Alckmin, o que poderá ter como consequência, para o próprio governo, a perda de apoio popular.

Originalmente publicado no blog do autor

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