
O colunista da Folha de S.Paulo, Joel Pinheiro da Fonseca, publicou um artigo na última segunda-feira (29) destacando que no atual cenário político do país é importante que se crie espaço para que “bolsonaristas moderados ascendam”:
(…) Quem apoia Bolsonaro até hoje não vai jamais admitir que ele fomentou um golpe de Estado. Mesmo com a PF descobrindo que organizadores do 8/1 falavam abertamente de seu objetivo, os apoiadores continuarão dizendo que era apenas “uma manifestação”, como tantas outras, no máximo culpada de vandalismo.
Essa negação cumpre o mesmo papel psicológico da negação de parte da esquerda da corrupção nos governos do PT. Aceitando o fato, ficaria muito difícil seguir com o apoio ao líder; por isso é preciso negá-lo até o fim. Viver numa democracia com liberdade de expressão inclui tolerar esse tipo de visão e aceitar que ele pode ter expressão política.
Para nós, de uma direita que nunca aceitou Bolsonaro, resta o trabalho de longo prazo de construir as bases para uma direita liberal no Brasil. O Brasil, contudo, não vai esperar, e o conflito entre petismo e bolsonarismo deve seguir a todo vapor. A direita antibolsonarista permanecerá, por enquanto, como uma minoria valorosa, imprescindível no debate público qualificado mas incapaz de conquistar as multidões.
Sendo assim, e dado que a conservação da democracia depende de as principais alternativas aceitarem as regras do jogo, é importante que se crie espaço para que bolsonaristas moderados ascendam. Por “moderado” quero dizer: que respeite as regras da democracia, como aceitação do resultado das urnas (que é plenamente compatível com fazer sugestões de como melhorá-las) e repúdio público ao uso da violência mesmo quando ele parte de seu próprio campo. (…)

Frente a uma política corrompida, Bolsonaro representou a aposta na antipolítica, na esperança de que o autoritarismo trouxesse a integridade perdida por uma democracia corrupta. Felizmente, fracassou. Mas seus valores podem encontrar formulações compatíveis com a ordem democrática.
Não será a primeira nem a última vez que movimentos extremistas moderam-se para entrar no jogo. Grupos diretamente envolvidos com a luta armada e o terrorismo, como o IRA e as Farc, foram capazes de ceder suas armas e aceitar a dinâmica da democracia. Ao fazê-lo, deixam um gosto azedo na boca de todos os que gostariam de extirpá-los e a tudo que representam.
Democracia é também aprender a conviver com o diferente e vencê-lo na base da persuasão, não das armas. Punindo quem cometeu crimes, é preciso deixar que seus correligionários que respeitam as regras do jogo sigam participando dele. O TSE pode tirar da corrida um concorrente infrator; não pode silenciar metade da população.