Com disputa política em vez de vacinação, covid-19 avança no Brasil

Atualizado em 7 de dezembro de 2020 às 19:57

Publicado originalmente na Rede Brasil Atual

Por Gabriel Valery

Parlamentares temem que Bolsonaro e os bolsonaristas, que enxergam Doria (antigo aliado de Bolsonaro) como inimigo político, tentem impedir, através do aparelhamento na Anvisa, que a população seja imunizada pela Coronavac

A covid-19 avança no Brasil. O número de casos e mortes segue em crescimento desde o dia 10 de novembro, após leve recuo e estabilidade registrados, especialmente, em outubro. Antes disso, o Brasil foi o país a ficar mais tempo no pico epidemiológico de mortes pela doença no mundo, mais de 14 semanas.

A última semana foi a mais intensa desde a primeira de outubro. Foram registradas 4.067 mortes oficialmente, de acordo com o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass). Em relação ao número de novos casos, o cenário é de crescimento ainda maior. Foi a quinta semana com maior número de infectados desde o início da pandemia, em março. Os 286.905 contaminados foram superados apenas pelas piores semanas, entre o dia 19 de julho e 15 de agosto.

Segundo boletim do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) de hoje (7), foram registradas oficialmente mais 376 mortes nas últimas 24 horas. Com isso, o Brasil chega a 177.317 vítimas da covid-19, de março para cá. São também 6.623.911 infectados, com acréscimo de 20.371 no último período. Os números às segundas-feiras são menores do que a média do restante da semana, já que menos agentes de saúde trabalham aos domingos.

Curvas epidemiológicas da covid-19 mostram forte crescimento de casos e mortes. Patamares regressam ao pior momento da pandemia, entre julho e agosto. Fonte: Conass

Política e vacina

Enquanto países como Portugal, Reino Unido e Alemanha preparam seus cidadãos para o início da vacinação, o cenário brasileiro é nebuloso. O governo federal, que pouco fez em relação ao planejamento e combate à covid-19, segue sua conduta indigente em relação à pandemia, desprotegendo a população. Não foram ainda apresentados planos de vacinação detalhados, perspectivas ou mesmo quais imunizantes poderão ser aplicados.

Em atos de lado a lado de politização da vacinação, o governo federal se esquiva de falar da vacina CoronaVac em desenvolvimento no estado de São Paulo pelo Instituto Butantã em parceria com a empresa chinesa Sinovac. Hoje (7) o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), chegou a anunciar um calendário de vacinação no estado, a partir de 25 de janeiro. Entretanto, o prazo pode ser pouco factível, já que ainda faltam resultados científicos sobre a eficácia da vacina, bem como aprovação da Anvisa, sem os quais, seria impossível o início da imunização.

Aparelhamento

“A Anvisa hoje esta sendo aparelhada por diretores aliados com a postura negacionista e irresponsável do ponto de vista sanitário do Bolsonaro”, resume o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP). O medo de que a politização abusiva de Bolsonaro em torno da vacina atrase a medicação de todos os brasileiros é justificado. Três das cinco diretorias da Anvisa, órgão responsável por liberar vacinas no país, são dirigidos por militares aliados de bolsonaro.

Matéria publicada hoje pela agência internacional Reuters aborda o receio de governadores e parlamentares de que Bolsonaro trabalhe para minar a imunização do povo, o que pode colocar a vida de milhões de pessoas em risco. “A Reuters entrevistou mais de uma dezena de autoridades antigas e atuais, governadores e parlamentares sobre os planos de Bolsonaro para a Anvisa (…) Muitos disseram ter preocupação de que a crescente influência do presidente na Anvisa esteja politizando a agência (…) alguns têm receio de que Bolsonaro, de olho na reeleição em 2022, possa usar as aprovações da Anvisa para acelerar as vacinas a aliados e retardar a chegada aos rivais.”