
Uma planilha obtida pela Polícia Civil do Rio de Janeiro revelou que o Comando Vermelho (CV) gastou mais de R$ 5 milhões em um único mês com a compra de armas e munições. Parte do arsenal veio de fornecedores legalizados, entre eles Eduardo Bazzana, um CAC (caçador, atirador e colecionador) com registro no Exército.
Ex-presidente do Clube Americanense de Tiro, em São Paulo, Bazzana é acusado de vender munições diretamente ao tráfico. A planilha lista R$ 1,6 milhão em compras de cartuchos de vários calibres, com pagamentos rastreados para suas contas pessoais e de suas empresas.
O material foi encontrado no celular de Luiz Carlos Bandeira Rodrigues, o Da Roça, um dos principais líderes da facção, e mostra que o grupo adquiriu ao menos 44 mil cartuchos e 14 fuzis, incluindo um calibre .50, capaz de atravessar blindagens e derrubar aeronaves.
Segundo o Gaeco (Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado), as transações foram feitas por laranjas ligados ao tráfico, e os comprovantes de Pix coincidem com os valores registrados na planilha. “Eduardo Bazzana recebe dinheiro decorrente da venda direta de aparato bélico a traficantes da cúpula do Comando Vermelho”, diz o documento. Ele foi preso em maio, após meses de investigação.

Desde o aumento da flexibilização para compra e porte durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o número de registros de caçadores e atiradores cresceu mais de 400%, facilitando o desvio de armamentos para o crime organizado. A investigação aponta que munições de clubes de tiro e lojas legalizadas abastecem favelas dominadas por facções.
Da Roça, de Rondônia, ascendeu no CV após participar da tomada de territórios na Zona Oeste do Rio e passou a controlar a favela da Muzema, antes dominada por milicianos. Além do tráfico, ele administrava cobranças ilegais, venda de “gatonet” e grilagem de terrenos, tornando-se um dos principais operadores do “fundo de guerra” da facção, usado para financiar o armamento pesado.
Com influência crescente, ele passou a atuar como importador e distribuidor de drogas e armas para o CV, comprando lotes em outros estados e revendendo para líderes de favelas do Rio. O modelo transformou o grupo em uma rede estruturada de suprimentos bélicos com vínculos diretos com CACs e empresários do setor de armas.
Bazzana, de 68 anos, era figura conhecida em Americana (SP), dono de duas lojas registradas e de um clube de tiro com sete mil associados. O local chegou a sediar competições sul-americanas e era frequentado por políticos, advogados e policiais. Em sua defesa, o empresário afirmou ser vítima de “uma caça às bruxas” contra caçadores e atiradores esportivos.