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Começou. Vai ter Copa. E vai ser sensacional.

Finalmente começamos a ouvir buzinas e cornetas. Estamos nos dando conta, ao que parece: hoje começou uma Copa do Mundo, o Brasil entrou em campo e essa Copa vai acontecer aqui dentro de casa. Antes tarde do que nunca.

É muito bacana ver o tanto de estrangeiros pelas ruas das grandes cidades brasileiras, se divertindo. Normalmente, nós lhes mostraríamos o que é um clima de Copa e como torcer. Ao que parece, eles é que estão trazendo esse espírito para o Brasil e nos contagiando. Escreve uma amiga no Facebook: “os pessimistas que nos perdoem, mas o clima está de muita festa aqui em São Paulo. Apesar de tudo. Passei a manhã toda em peregrinação por estações de metrô, pela Paulista, Vila Madalena, só para sentir essa vibe. Fui parada inúmeras vezes com pedidos para fotografar torcedores, conheci um croata que falou que o Rio é muito melhor que São Paulo, vi gringos andarem sem medo pelas ruas (muitos deles com a camisa do Brasil mesmo), motoristas de ônibus com vuvuzelas, vovozinha dizendo ‘nunca mais vou ver a cidade desse jeito’. É, vai ter Copa. E no gerúndio também. Estamos ‘tendo’ Copa.” Outro amigo conta dos croatas tomando café com ele na padoca no bairro. Outro publica uma foto da Vila Madalena transformada numa Babel. Isso é Copa do Mundo. E é maravilhoso. E pode acontecer aqui, sim, não apenas em Paris ou em Munique. Basta querermos. Acharmos que é bom. E curtirmos.

Que coisa linda os treinos das seleções visitantes com estádios lotados. Aparentemente esse é mesmo o país do futebol… Trata-se de uma afirmação de que representamos, de fato, o templo máximo do futebol. Argentinos se sentindo em casa em Belo Horizonte. Assim como Portugal em Campinas ou a Espanha em Curitiba. Lindo. Isso é inesquecível. Para jogadores e torcedores. Isso é Copa do Mundo.

O nosso beiço com a Dilma e com a administração doméstica da Copa é o mesmo beiço do mundo inteiro com a FIFA e Blatter. Esses já são os dois maiores perdedores da Copa. Vale o coro antiDilma no estádio. Só não vale o quebra-quebra que rolou em Porto Alegre, por exemplo. A Copa das Copas não é uma propriedade da Dilma nem do PT. A Copa das Copas é uma decisão nossa. Só depende de nós que seja assim.

The Economist, numa matéria recente, fala sobre as dificuldades que alguns jornalistas tiveram na chegada em São Paulo – alguns deles ficaram mais de duas horas na fila para conseguir um táxi em Cumbica. A ineficiência dos táxis em Guarulhos, que é similar em Congonhas, vem de um monopólio. E garantias de mercado como essa, tão típicas do Brasil, nunca apontam para o lado da razão e da produtividade. Nem da excelência dos serviços e dos produtos ou da satisfação dos clientes. Bingo. Trata-se de cartório, privilégio, protecionismo. Precisa um inglês vir aqui para nos dizer isso? É o chamado óbvio ululante.

Apesar disso, nenhuma ineficiência no Brasil será mais sentida pelos estrangeiros do que a ausência da alegria e da festa. Eles nos perdoarão tudo – menos isso. Ainda bem que, ao que parece, isso não está acontecendo. Ou, ao menos, ainda não é hegemônico.

Ainda do meu feed no Facebook. Concordo com tudo que li sobre a cerimônia de abertura: achei chocha, plenamente esquecível. Achei que com Paulo Barros no Brasil e nosso expertise carnavalesco com grandes espetáculos populares, não precisávamos da coreógrafa belga Daphné Cornez. O ponto alto, o pontapé inicial do menino paraplégico, Juliano Alves, de 29 anos, um compromisso pessoal do pesquisador brasileiro Miguel Nicolelis, líder do projeto “Andar de novo”, virou também um anticlímax, um momento que esconderam em vez de mostrar. Uma pena.

E quanto ao futebol: o gol da Croácia, no contraataque, foi nas costas de Daniel Alves. Tiago Silva teve que sair para a lateral e fez falta na grande área, no cruzamento que embaralhou Marcelo e que terminou em gol contra. Essa avenida nas costas de Dani já tinha ocorrido no amistoso contra a Sérvia. Precisa ver isso aí, Felipão.

Oscar fez um bom jogo. No Inter, tinha a grande virtude de roubar bolas e também de não perdê-las. Hoje ele se aproximou mais disso – roubou mais e perdeu menos. Mas ainda tem muitos metros a caminhar até sua melhor forma. Claro que, independente disso, aquele gol no contrapé do goleiro, de bico, de gênio, encheu a nação colorada de saudade.

Jogos da Seleção Brasileira são diferentes de jogos de clubes. Quando seu time está jogando, só boleiro e torcedor de fé vai ao estádio. A vibe é outra, o barulho e o jeito de torcer também. Em jogos da Seleção, há muita gente que não está acostumada a torcer. Os timings e os códigos são outros. E essa torcida, embora mais apaixonada, é mais ingênua. Falta um pouco de contundência, de intensidade. Espero que os jogadores tenham essa noção lá dentro do campo. As arquibancadas estarão, de modo geral, cheias de amadores inexperientes – e não exatamente de torcedores “profissionais”. Isso é mais verdade em jogos amistosos da Seleção do que em jogos de Copa. Mas certamente não poderemos contar com o calor de uma galera como a do Flamengo ou do Corinthians empurrando o time para cima.

Por fim. Vamos ter de nos acostumar com esses feriadões de um dia só, no meio da semana. Amanhã é uma sexta que já nasce com um baita gosto de segunda feira. Ainda bem que logo depois já é sábado.

Adriano Silva

O jornalista Adriano Silva é consultor digital, escritor e mantêm o blog Manual de Ingenuidades (www.manualdeingenuidades.com.br). Ele ocupou cargos como o de diretor de redação da revista Superinteressante e Redator Chefe do Fantástico,

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