
A ascensão de figuras como Giorgia Meloni na Itália, Marine Le Pen na França e Michelle Bolsonaro (PL) no Brasil está redefinindo o perfil tradicionalmente masculino dos movimentos de extrema-direita. A abertura de espaços para líderes mulheres contribui para mudar como os eleitores percebem a política radical, segundo análises de especialistas, que identificam três eixos principais de atuação: a suavização da imagem partidária, a conquista do eleitorado feminino e a reconfiguração dos debates sobre gênero.
Michelle, atual presidente do PL Mulher e possível candidata em 2026, juntamente com a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), são exemplos de como as mulheres da extrema-direita utilizam referências à maternidade e à espiritualidade para moderar o discurso político.
A primeira-ministra italiana Giorgia Meloni sintetiza essa abordagem em seu emblemático lema: “Eu sou Giorgia, eu sou uma mulher, eu sou uma mãe, eu sou italiana, eu sou cristã!”. De forma semelhante, a ex-primeira-dama do Brasil constrói sua imagem pública destacando seus papéis familiares e religiosos em sua biografia no Instagram.

Uma pesquisa abrangente, conduzida pela professora Diana Z. O’Brien, da Universidade Washington, analisando 269 partidos políticos em 35 países, revelou que organizações lideradas por mulheres são consistentemente percebidas como mais moderadas pelo eleitorado, independentemente de suas posições programáticas reais. Esse fenômeno tem sido fundamental para a estratégia de renovação de imagem da extrema direita.
No cenário eleitoral brasileiro, Michelle desempenhou papel crucial na redução da rejeição ao então presidente Jair Bolsonaro (PL) entre o eleitorado feminino durante as eleições de 2022.
Paralelamente, na França, a Reunião Nacional de Marine Le Pen registrou crescimento significativo no apoio entre mulheres, saltando de 20% para 30% do eleitorado feminino entre 2019 e 2024, segundo dados do instituto Ipsos.
A socióloga Sara Farris, da Universidade Goldsmiths, introduziu o conceito de “femonacionalismo” para descrever o fenômeno pelo qual partidos nacionalistas apropriam-se de pautas feministas para promover agendas anti-imigração. “É a exploração de ideias feministas por partidos nacionalistas de direita em campanhas islamofóbicas”, explicou Farris à revista Salvage.

No contexto brasileiro, a dinâmica assume contornos distintos, como observou a socióloga Esther Solano, coautora do livro “Feminismo em Disputa”. “A extrema-direita brasileira se apresenta como a verdadeira guardiã dos valores femininos tradicionais, enraizados na família e na religião”, analisou em entrevista à Folha.
Essa estratégia se manifesta em posicionamentos como o de Damares, que frequentemente questiona o silêncio de feministas diante de casos envolvendo figuras da esquerda, ou nas propostas do PL que defendem o armamento feminino como política de segurança.
O fenômeno do femonacionalismo na Europa, onde lideranças como Meloni e Le Pen associam sistematicamente a imigração muçulmana a riscos para as mulheres, contrasta com a abordagem brasileira, que se concentra na defesa da família tradicional e nos valores religiosos.
“No Brasil, a extrema direita constrói sua narrativa a partir do ecossistema religioso profundamente enraizado na sociedade”, explicou Solano.
Olhando para o futuro político, especialistas projetam que Michelle poderá mobilizar de forma eficaz a base evangélica conservadora em uma eventual candidatura em 2026. Solano antevê que essa candidatura provavelmente encarnará o arquétipo da “mulher empoderada financeiramente, mas profundamente comprometida com os valores familiares e a fé”.
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