Por que o impacto de greves e manifestações seria muito menor se tivéssemos ciclovias

Atualizado em 6 de junho de 2014 às 12:13

ciclovia

 

São Paulo tem vivido um caos generalizado por conta de greves de ônibus e metrôs. A população como um todo sofre e muito. Em especial passageiros do transporte público e motoristas.

Neste ano de Copa do Mundo e eleições, protestos ainda irão pipocar em várias cidades brasileiras, trazendo todos os problemas de mobilidade previstos. Daí, uma pergunta fica latejando na cabeça: se uma cidade como São Paulo contasse com uma rede razoável de ciclovias muita gente não teria ficado à deriva durante esses dias agitados nas ruas.

“Se tivéssemos uma boa malha cicloviária que permitisse, inclusive, deslocamentos da periferia ao centro, muito mais gente teria usado a bicicleta em dias de manifestações. O congestionamento seria menor e o prejuízo para os cidadãos, as empresas e a cidade também”, diz Willian Cruz, cicloativista paulistano e criador do site Vá de bike (vadebike.org). 

A magrela cada vez mais cai no gosto dos brasileiros como opção de meio de transporte – e não só como lazer ou esporte – para circular pelas cidades. Mesmo sem as benditas ciclovias. Dados da Pesquisa Origem Destino feita pelo Metrô de São Paulo dá conta de que, em 2007, a população fazia 310 mil viagens de bicicleta diariamente na região metropolitana da capital. Nos finais de semana esse número crescia vertiginosamente.

Já em 2012 as viagens de bike em Sampa cresceram para 333 mil/dia, um acréscimo de 7,4%. Willian Cruz acredita que essa porcentagem é, de longe, muito maior. “Para ter uma ideia, entre 1997 e 2007 o uso da bicicleta aumentou mais de 100%. Então, é pouco provável que o crescimento tenha reduzido dessa forma. A estimativa com que trabalhamos é de 500 mil viagens/dia, hoje”. Sim, a cultura dos cidadãos em favor das bicicletas está se moldando solidamente no Brasil e só tem feito crescer, embora, óbvio, ainda estejamos a engatinhar se nos compararmos a metrópoles como Nova York, Paris, Barcelona, Buenos Aires… Em nossas cidades mais problemáticas já é possível ver bicicletários nas estações de trens e metrôs, nas garagens das empresas, nos estacionamentos privados, nos hospitais e escolas.

Então, com raríssimas exceções no Rio de Janeiro e em Curitiba, Rio Branco (AC) e Sorocaba (SP), por que as ciclovias não deslancham em São Paulo e na maioria das metrópoles brasileiras? Aqui em Sampa há quem diga que é por causa das dificuldades técnicas de implantação. Quando era secretário do Verde e Meio Ambiente da capital paulista, Eduardo Jorge (ele mesmo um ciclista atuante) certa vez me disse, em uma entrevista, que havia projetos de implantação de ciclovias em andamento sendo tocados por técnicos da Universidade de São Paulo. Me explicou como era complicado resolver como traçar passagens para ciclistas das marginais para os inúmeros viadutos que desembocam em grandes avenidas, sem colocar em risco a vida de ninguém.

A declaração de Eduardo Jorge foi feita em 2011 e parece que, de lá para cá, as soluções para tais dificuldades não foram encontradas. Pelos mais recentes números da Companhia de Engenharia de Trânsito (CET), São Paulo tem 259,11 quilômetros de infraestrutura cicloviária. Parece muito, mas metade desse caminho é constituído por ciclofaixas de lazer, acionadas apenas nos finais de semana e feriados interligando alguns parques da cidade. Ou seja, se prestam apenas aos passeios ciclísticos. A outra metade são ciclovias (faixas exclusivas para bikes) e ciclorrotas (faixas compartilhadas por carros e bikes, com sinalização específica) permanentes para uso da bicicleta como meio alternativo de transporte, além de calçadas especificamente compartilhadas entre pedestres e pedalantes.

É muito pouco para uma cidade com o tamanho e os problemas de mobilidade como São Paulo. “As ciclofaixas de lazer não podem ser consideradas infraestrutura cicloviária, pois não estão disponíveis para circulação diária. É como considerar o Elevado Costa e Silva (Minhocão) um calçadão, já que aos domingos ele é de exclusividade dos pedestres”, diz Willian Cruz. Para o cicloativista, a dificuldade em abrir novas ciclovias é mais política do que técnica.

“Soluções existem, mas não são convenientes, pois para garantir a segurança das pessoas muitas vezes é preciso restringir ou disciplinar a circulação dos carros. E a fluidez dos automóveis é sagrada na cidade”. Cruz cita como exemplo as reclamações dos motoristas paulistanos com as faixas exclusivas de ônibus, recentemente implantadas pela prefeitura paulistana. “É preciso ter culhões para enfrentar uma opinião pública formada, em grande parte, por pessoas que dirigem automóveis e avaliam o trânsito por detrás do para-brisa”, diz.